Capítulo II - Sombra Negra

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Essas ultimas semanas tem sido como andar sem uma sombra e isso me dá pânico, toda vez que olho em um espelho ou uma poça de água e sou eu que estou refletida sinto medo, se ela não voltar logo, vou acabar me perdendo em mais de um sentido.

A cidade da vez é Argo, esse lugar tem um cheiro doce de ópio, só é uma pena que as três garrafas de vinho branco que bebi tenham tirado meu apetite para o almoço, tem ótimas lojas de doces por aqui. 

De repente, começa a tocar um sino tão estridente que ressoa por meu corpo inteiro, paro e encosto na parede descascada ao lado, assim que minha cabeça para de girar percebo de onde vem o som, é de um prédio gigantesco do outro lado da rua com muitos adolescentes andando por lá, aproximo-me da grade do portão:

— Que lugar é esse?

— É um local especial onde trancam crianças, adolescentes e até alguns adultos para ensina-los como se deve viver.

Viro para esquerda, de onde veio à voz e não vejo nada, será que foi o vinho? Melhor parar de beber pela manhã. Volto a andar e escuto um barulho atrás de mim, olho novamente e nada, deve ser mais grave do que pensava, de agora em diante só água e suco de laranja, bocejo e com a vista ainda embaçada se forma uma imagem a minha frente, de um garoto branco que parecia ainda mais branco com a cor de cabelo que usava, vestido com um casaco e calças jeans segurando na mão esquerda um uniforme.

Encaramo-nos por 3 segundos antes dos seguranças aparecerem gritando algo que não entendi muito bem, porém se tem alguma coisa que aprendi depois de quase 8 anos morando nas ruas é que se você vê alguém vestindo uma farda, você corre e rápido. Escapei pela direita, o garoto uva deve ter corrido para o outro lado, acho que não vamos nos encontrar de novo, é uma pena ele era bem gatinho.

Vendo pelo lado bom não estava alucinando então posso continuar bebendo, por outro lado meu apetite abriu ferozmente, observo ao redor e miro minha próxima presa, desabotoo os dois primeiros botões do meu colete, coloco minha poker face, me aproximo e falo:

— Com licença, eu sou nova na cidade e é um pouco vergonhoso falar, mas estou morrendo de fome, será que você poderia me indicar um lugar pra...

Não demorou muito para que aquele garoto com boina e um sorriso brilhante respondesse:

— Claro!

Fomos a um restaurante familiar, cor de madeira e cheiro de verniz, onde enchi a barriga enquanto ouvia as histórias do Marlon, é esse o nome dele, ou o do cachorro, não prestei muita atenção, foi na hora que trouxeram as batatas, ah... Mas que batatas, a crocância estalava entre os dentes, ao mesmo tempo em que, derretia na boca. Depois que terminamos saímos do restaurante para o parque, disse:

— Agradeço por ter me indicado esse lugar, mas não precisava ter pago a conta. — Sorri amigavelmente e virei às costas.

Foi quando ele voltou me chamou:

— Espera, é Aina, não é?

Respondi com o sorriso ainda congelado:

— É sim.

Temeroso e evitando contato visual falou:

— Você disse que é nova na cidade, o que acha de me deixar te mostrar...

O Interrompi gentilmente colocando a mão em seu rosto:

— Eu acredito em destino e essa é uma cidade pequena, então se nos encontrarmos de novo, sem dúvida vou aceitar o convite.

Dou um beijo de despedida em sua bochecha e torno a caminhar até que o perdesse de vista. O sol se pôs antes que notasse, com preguiça de andar até o prédio que estava hospedada, isso mesmo, dessa vez escolhi gastar dinheiro e acomodar-me, deito de costas no banco próximo a algumas árvores, com um braço agarrei minha bolsa segurando-a contra o abdome o outro coloquei sobre os olhos e os fechei.

Almas Vazias Corações ContentesOnde histórias criam vida. Descubra agora