UFRN, Rio Grande do Norte
8 de fevereiro
15h10min
Alex estava animado quando destrancou a porta do Laboratório de Botânica da Universidade Federal, após ter deixado Catarina aos cuidados médicos de um hospital particular. Ligou luzes e aparelhos, então falou para Éder:
– Não sou especialista na área de microbiologia e nem botânica, mas detenho um conhecimento bastante razoável sobre o assunto. Estive pensando muito sobre o caso em Noronha. Enluve as mãos. Vamos usar a lupa. Quero descobrir que diabo é isso.
Os dois vestiram as luvas de silicone. Alex foi cauteloso. Abriu a tampa do vidro e depositou o espécime numa das mãos de Éder, que, por sua vez, posicionou abaixo da lente. Uma pequena câmera ligada a ela projetou a imagem no monitor de trinta polegadas. O professor ligou a luz do aparelho. Aumentou o foco da lente. Puderam ver com detalhes o espécime. Alex relembrou as aulas de microbiologia.
− Maravilha!
− O que foi? – Éder perguntou, curioso.
− Dê uma olhada! Isto não é uma semente – apontou para o monitor.
− Eu tinha suspeitado. Mas como tem tanta certeza?
Alex ampliou o foco da lente e manteve os olhos no monitor.
− A morfologia de uma semente, em qualquer tamanho, apresenta três componentes integrados: a cobertura, o tecido de reserva e o eixo embrionário. Mas nada disso é evidente nesta espécie. Não tem traços de um pseudofruto, nem de uma flor. Na verdade − ele titubeou ao dizer −, talvez você tenha razão. É esporo de fungo. Pelo menos, tem a anatomia celular de um. Mesmo assim, seria possível uma coisa deste tamanho? – Alex não se convenceu de sua própria conclusão.
Éder, intrigado, buscou o notebook e pesquisou fotos na Enciclopédia Digital de Micetologia, disponível na Biblioteca Virtual da Universidade.
− Há muitos tipos deles. Que espécie suspeita que seja essa? – indagou, mostrando as fotos no computador.
− Não tenho certeza.
− Devíamos chamar um micetologista, um perito em anatomia de fungos, para opinar – Éder sugeriu, enquanto comparava fotos que pudessem se assemelhar ao espécime. – Que tal o professor Martino? Ele é um especialista.
Alex não gostava dele.
− Tem o ego inflado demais – comentou, observando o monitor. – Vai querer saber onde encontramos.
Sempre foi cuidadoso com os colegas pesquisadores. Muitos se apropriavam de descobertas científicas alheias. Lembrou-se do caso de um professor lesado por outro que roubou sua descoberta, publicando-a em artigos de revistas científicas. Apropriavam-se das pesquisas de outros a fim de serem reconhecidos. As Universidades sempre eram palcos de guerras políticas e muitos professores se permitiam qualquer coisa para chegar a importantes cargos de gestão.
− Acho que é um ascósporo – Éder proferiu. – Observe a foto.
Alex virou o rosto para o notebook. Em seguida, comparou com a imagem do monitor. Controlou a perplexidade.
Um esporo gigante!
Era inconfundível, por mais que a imagem fosse computadorizada nas fotos de microscopia eletrônica. Alex retirou as luvas e, atencioso, comparou as duas imagens nos respectivos monitores.
− Note as estruturas internas, os ascos. Você está vendo? – Éder bateu o dedo na tela do notebook.
− Sim. Três ascos envoltos por uma fina membrana azulada – Alex disse, atônito. – Aquilo são filamentos? – apontou para o notebook.
− Centenas deles, como no nosso espécime – Éder franziu o cenho.
− São gelatinosos afixados ao corpo esférico – Alex constatou.
Os dois fizeram silêncio.
− Pode ser mesmo possível? – Éder o questionou, encarando-o.
Alex hesitou antes de confirmar, ainda assombrado. Um fungo gigante encontrado há anos em forma de fóssil no período dos dinossauros era uma coisa muito diferente. Não era uma anomalia nas células, mas sua estrutura genética lhe permitia ser enorme.
Aquele esporo era só a pequena parte de um todo. Se alcançou volume, aquilo que o originou tinha dimensões assombrosas. O fungo que o produziu devia ser bem maior. Imaginou que fosse tão alto quanto uma árvore frondosa, mas, em vez de galhos, um ramo de hifas delgadas.
Inacreditável. Mas como se desenvolveu tanto?
− Morfologicamente é o esporo de um fungo! – Éder disse, eufórico. − É claro que uma análise profunda poderá revelar outros elementos. Se for realmente um esporo gigante, temos uma descoberta e tanto nas mãos. A Nature ou Scientific publicariam uma matéria sobre o assunto. Já pensou, nossos nomes citados?
− Seria um desastre alguns desses esporos soltos no ar − Alex conjecturou, o olhar distante. Estremeceu ao pensar nas consequências daquela possibilidade.
− Se é um ascósporo de fato, então produz uma micotoxina; a substância que pode ter causado a convulsão em Catarina − Éder concluiu. − Que tal tentarmos descobrir?
− Não temos equipamento para isso – Alex foi taxativo ao dizer.
− Talvez o pessoal da Bioquímica possa nos ajudar.
− Eles têm pouco maquinário. Quando queremos resultados precisos, enviamos as amostras para o Instituto Butantan ou Fiocruz.
− Veja! – Éder apontou para o esporo, que de repente murchou, degradando-se até chegar a um tom ferrugem.
− O que você fez?
− Nada. Juro por Deus! Talvez só consiga viver em um ambiente controlado.
Alex suspeitou de que ele estivesse certo. Supunha isso desde o começo. A natureza não podia provocar tal "acidente". Não havia precedentes nos anais científicos. O professor se voltou para Éder:
− Use a prensa para retirar os fluidos desta coisa, então deposite numa ampola de plástico. Não precisamos de mais do que 2 ml. Vamos enviar uma amostra por correio, o mais depressa possível, para o Laboratório de Toxicologia da Fiocruz. Vou tentar conseguir um tubo criogênico de aço para conservar a amostra.
– Onde vai arrumar um tubo criogênico?
− Minha irmã é zootecnista. Trabalha com criogenia de embriões bovinos em um laboratório particular. Talvez consiga um.
− Não estou certo do que isto realmente é. Parece inconcebível – Éder disse, inserindo o esporo entre as duas lâminas da prensa.
− Lembro-me das palavras de um teórico chamado Louis Kahn, que disse: "Quando um cientista está observando um fenômeno, não está levando em conta o que pode ser inacreditável" – Alex citou e foi em direção à porta. – Quando a amostra estiver pronta, me diga. Vou ao departamento de Geografia. Será rápido.
− Fazer o quê?
– Investigar o acervo de mapas.
− Mapas?
− Quero detalhes do arquipélago de Noronha.
− Você não precisa de mapas. Use o software Geo com o pessoal do Autocad. Eles têm acesso a estradas, construções em 3D e rotas marítimas. Tudo que precisar. Está vinculado a um pacote de informações do Google Earth. Mas acho que, se não correr, vai dar de cara com a porta fechada.
Éder escutou a trava bater.
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UNICELULAR
Science FictionDisponível nas grandes livrarias! ROSA ViLLAR, agente da ABIN, é chamada às pressas para investigar o envenenamento do filho de uma influente jornalista americana que estava de férias, numa das belas praia do Brasil. O que Rosa não imaginava é que...