Capítulo 10 - Contrição

143 14 20
                                    

Existia uma diferença entre arrependimento e culpa, e eu não sabia qual dos dois havia motivado o Grão-Senhor a enviar um vaso de flores tão grande para o meu quarto na manhã seguinte. Eram jacintos, Zaya explicou enquanto arrumava o vaso sobre a mesa de cabeceira, iguais àqueles dispostos nos aparadores daquele corredor, só que muito maiores e totalmente vibrantes. Em tons de roxo, eles eram acompanhados por pequenas flores brancas que Zaya chamou de mosquitinhos, e encheram meu quarto com seu aroma doce. Não havia bilhete junto às flores, nenhum pedido de desculpas escrito, apenas a mensagem implícita do buquê em si.

        Me perguntei se Tamlin as havia enviado para me lembrar da minha intromissão, como uma sutil punição. Enfeitando meu quarto com as mesmas flores do corredor onde eu não deveria ter estado no dia anterior, marcando o ar com o cheiro adocicado para que suas palavras jamais fossem esquecidas.

        Encarei as flores do meu lugar na penteadeira, Zaya penteava meus cabelos murmurando uma canção de amor sobre a lua e o sol poente. Se Tamlin acreditava que poderia comprar o meu perdão com um buquê, estava enganado. E se, de fato, estivesse me punindo, eu preferia não saber, pois isso seria capaz de me fazer jogar tudo para o alto, ir embora mostrando os dedos do meio e mandando-o à merda.

        Na noite anterior, ele agiu como um animal; poderia ter seus motivos, mas nada justificaria suas ações, nem as atuais, nem as antigas. Ele não precisava ser um idiota, e eu não precisava tolerar isso. Então quando chegou a hora do jantar, fui até a cozinha, coloquei um pouco de comida em uma vasilha e subi para o meu quarto, sem verificar se ele estava na sala de jantar ou se tinha retornado. Isso pouco me importava. Também não estava disposta a descer para o café da manhã, mas o buquê me instigou. Se ele fosse me pedir desculpas, eu queria estar lá para negar e assistir a decepção inundar seu rosto. 

        Seria um deleite.

        Mais deleite do que isso seria sentar à mesa com meu novo vestido azul marinho, minuciosamente bordado com símbolos da Corte Noturna, contrastando com todas as cores da paleta primaveril ao meu redor. Com um decote em U, projetando as pedras violetas do meu colar, eu seria uma mancha noturna, um lembrete vívido de seu passado e das escolhas que ele fez.

        — Senhora, posso lhe fazer uma pergunta? — Zaya perguntou enquanto prendia grampos no meu cabelo, colocando-o para cima em tranças delicadas ao redor da cabeça.

        — Vá em frente.

        — O Grão-Senhor e a senhora se desentenderam ontem? — Olhei para ela no espelho e assenti. — A senhora vai ir embora?

        A encarei. Seria totalmente possível Tamlin tê-la mandado perguntar isso; eu não ficaria surpresa se ele fosse covarde ao ponto de enviar outra pessoa para falar comigo no seu lugar.

        — Não, não vou embora por conta de uma briga. — Mesmo que eu quisesse. — Entendo o que isso pode significar para o restante da corte; não se preocupe.

        Se não tivesse sido Tamlin quem a mandou perguntar isso, talvez Zaya estivesse preocupada com a coisa mais óbvia: como a corte e sua família ficariam caso eu fosse embora de repente, e o Grão-Senhor enlouquecesse novamente. Era algo que também me assombrava desde ontem, a sua reação quando eu fosse embora após o Calanmai. Ainda precisava ponderar mais sobre isso e encontrar alguma maneira de garantir sua estabilidade na minha ausência.

𝐂𝐨𝐫𝐭𝐞 𝐝𝐞 𝐏𝐫𝐢𝐦𝐚𝐯𝐞𝐫𝐚 𝐞 𝐋𝐮𝐚𝐫Onde histórias criam vida. Descubra agora