𝐂𝐨𝐫𝐭𝐞 𝐝𝐞 𝐏𝐫𝐢𝐦𝐚𝐯𝐞𝐫𝐚 𝐞 𝐋𝐮𝐚𝐫

𝑪𝒂𝒑𝒊́𝒕𝒖𝒍𝒐 𝟑 - 𝑨𝒃𝒖𝒏𝒅𝒂̂𝒏𝒄𝒊𝒂

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𝐄m menos de uma semana após minha intromissão, partimos para a Corte Outonal em uma viajem que durou dois dias. Não porque era necessário para o tal Duelo de Sangue fazer todo aquele trajeto viajando, mas sim por conta do número de pessoas que nos acompanhavam. Illyrianos não atravessavam, e tínhamos dois com a gente. A maioria das sacerdotisas também não, e um grupo delas parecia ser essencial para a validação do duelo.

Sendo assim, estávamos atrasados. Pelo pouco que me falaram, deveríamos ter chegado durante a manhã, quando o céu estava claro e as chances de chuva eram baixas. No entanto, chegamos no meio da tarde, e o vento piorava a cada instante, anunciando uma tempestade que também podia ser vista se aproximando pelas nuvens escuras tingindo o céu claro.

Aquele clima não era o mais propício para um duelo, já que os passos escorregadios e a lama poderiam acabar estendendo a luta por horas.

Cassian me explicou um pouco sobre o Duelo de Sangue assim que saímos de Velaris. Aconteceria em um lugar entre as fronteiras da Corte Primaveril e Outonal, onde o solo era marcado por uma magia antiga, combinada com o sangue de machos que duelaram até a morte por suas honras séculos atrás. Era uma tradição Outonal, ele acrescentou, que não ocorria há muito tempo, uma luta que se estenderia até um dos oponentes estar morto, ou até que o solo estivesse satisfeito com o derramamento de sangue.

O fato de ser uma tradição explicava o número de feéricos curiosos que nos seguia desde que pisamos na Corte Outonal. A história do derramamento de sangue e morte por honra, não. Para mim, era irracional querer assistir esse tipo de coisa, mas para a caravana que nos seguia parecia um evento.

A culpa que antes pesava em meus ombros passou a me torturar depois das palavras de Cassian. E meu tormento foi tão grande que, durante os dois dias de viagem, nada além de água chegou ao meu estômago. Eu me envergonhava das palavras que saíram da minha boca sem que eu as notasse, e de como fugi da Casa do Rio naquele dia sem falar com mais ninguém, ou me desculpar com Azriel. Porém, acima de tudo, eu me envergonhava de não ter sido capaz de dizer uma palavra ao Cassian, o único da comitiva noturna que falava comigo desde aquele dia.

A floresta se abriu à nossa frente, com árvores mesclando os tons de verde Primaveril e laranja avermelhado Outonal. No meio da clareira, o solo se aprofundava em uma arena metros abaixo do nível em que caminhávamos. Arquibancadas de pedra desciam em círculos da floresta até o centro, onde a terra era cheia de uma vegetação seca criando um contraste marcante com o seu exuberante entorno colorido.

A arena parecia mais um anfiteatro natural, perfeitamente moldado pela terra para a morte.

As sacerdotisas desceram primeiro, passando as mãos pela vegetação de cor amarela adoecida que brotava entre as pedras. Em seguida, os membros da comitiva noturna seguiram fazendo o mesmo gesto, como se estivessem acariciando aquelas plantas murchas. Eu os imitei cegamente, tocando as folhas amareladas enquanto seguia o grupo sem questionar.

Um lampejo de cabelos flamejantes do outro lado da arena me fez parar entre um degrau e outro. Lucien. Ele também estava acompanhado, e sua comitiva era o dobro da nossa, irradiando uma animação perturbadora. Vestidos de maneira exageradamente refinada para espectadores de um duelo mortal, eles pareciam estar em plena celebração. As bandeiras outonais ondulavam no ar, sendo cravadas em pequenos mastros ao longo das arquibancadas, enquanto risadas e murmúrios entusiasmados escapavam da comitiva. Aquelas pessoas estavam ali apenas para assistir — mas era como se aguardassem um espetáculo ao invés de uma batalha sangrenta.

Nossos olhares se cruzaram à distância, e senti a hesitação pesar em cada movimento enquanto descia mais alguns degraus. O azul profundo do meu vestido contrastava brutalmente com o vermelho vibrante da corte de Lucien. Parecia que as cores gritavam que éramos inimigos — como se eu torcesse contra ele.