Capítulo 12 - Erudição

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Naquela noite depois da invasão, eu não queria dormir sozinha, e nem nas outras que a seguiram onde a mansão parecia desprotegida e exposta. No entanto, não havia mais uma desculpa plausível para fazer Tamlin permanecer ao meu lado.

        De repente, a insegurança havia voltado a me assombrar, assim como fez na Corte Noturna. Nos primeiros meses, eu acordava chorando por sonhos em que revivia tudo o que aconteceu naquela floresta: as flechas penetrando na minha pele, meu sangue criando um rastro pela terra, os corpos caindo ao meu redor, e o medo constante de acordar de volta naquele quarto, amarrada ao pé da cama, sem saber meu próprio nome, pronta para ser arrastada de volta à forja. Os curandeiros da Corte Noturna precisaram refazer meus pontos tantas vezes por me debater durante a noite, que os ferimentos da minha coxa e costelas deixaram cicatrizes deformadas como raizes.

Eu me contorcia na cama com pesadelos terríveis sobre o passado que preferia esquecer, mas que Rhysand me forçava a relembrar todos os finais de semana.

        Quando fui morar no apartamento e conheci Vlatka, ela passou a ir dormir comigo todas as noites até que os pesadelos cessassem. Me conduzindo de volta para a cama sempre que eu levantava durante o sono, permanecendo ao meu lado até o nascer do sol, me assegurando que aquilo não era real quando eu acordava angustiada na madrugada. Sua presença era reconfortante, agindo como uma âncora que me trazia de volta ao meu quarto aconchegante quando me perdia nos pesadelos. No entanto, na Corte Primaveril, eu não tinha ninguém além do Tamlin, um homem em quem mal confiava, mas permiti que dormisse ao meu lado para ser minha âncora por uma madrugada.

Eu tive pesadelos naquele dia, imagens do mármore da mansão sujo de sangue e da ameaça das flechas no hall, que se transformaram na fuga pela floresta e em tudo o que aconteceu depois. Contudo, se dissiparam tão rapidamente que, quando me dei conta, não restava nada além da certeza de que eu não estava mais sozinha. E se fosse para ser totalmente sincera, eu admitiria que a presença de Tamlin ao meu lado transmitia mais cuidado e mansidão do que jamais senti em toda vida.

         Três dias se passaram depois disso. Três dias em que eu mal o vi e noites em que mal dormi. E, para piorar, foram três dias do meu curto prazo de dois meses e uma semana pra convencê-lo a realizar o Calanmai.

        Tamlin não parava na mansão; saía cedo ao amanhecer e retornava tarde, quando o céu já estava escuro. E eu não tinha coragem de abrir a boca para falar com ele sobre mais trabalho, pois sabia que ele estava ocupado, era compreensível que estivesse depois de tudo o que aconteceu. As questões relacionadas ao forte e os possíveis interrogatórios aos rebeldes capturados deviam estar consumindo todo o seu dia, e eu não queria ser egoísta e fazê-lo falar comigo sobre isso também, quando chegava a noite estralando as costas e com olheiras profundas.

        Eu tinha um trabalho para fazer ali, mas isso não significava que precisava forçar Tamlin até o seu limite para fazê-lo. Porém, após três dias, tudo o que desejava era ter uma conversa com ele, receber notícias da rebelião e detalhes do que estava acontecendo. Queria saber se poderia ajudá-lo de alguma forma, se algum rebelde havia aberto a boca, mas Tamlin deixava a sua fechada, e minha curiosidade aumentava mais a cada jantar sem respostas. Por isso, naquela manhã, acordei mais cedo com a intenção de encontrá-lo antes que saísse, já que estava pulando o café da manhã todos os dias.

        Ao chegar no hall, a situação estava deplorável, como vinha sendo desde a invasão. Tudo estava limpo e perfeitamente organizado pela família da Zaya, exceto pela pequena cratera onde fiz o lustre despencar, marcando o chão com a constante lembrança de duas coisas terríveis: a invasão e o quanto eu queria defender o Tamlin da maneira mais intensa possível. Os restos do lustre desapareçam na manhã seguinte, antes que eu tivesse tempo de tentar consertá-lo, e não havia nenhuma gota de sangue, nem mesmo nos tapetes que deveriam estar manchados. A mansão, na verdade, parecia estar exatamente como antes, exceto pelo mármore quebrado e o buraco no teto de onde a chuva entrava desde a manhã anterior, criando uma cascata de água que alagava quase todo o hall, escoando pra fora pela porta dos fundos escancarada.

𝐂𝐨𝐫𝐭𝐞 𝐝𝐞 𝐏𝐫𝐢𝐦𝐚𝐯𝐞𝐫𝐚 𝐞 𝐋𝐮𝐚𝐫Onde histórias criam vida. Descubra agora