22| Uma fração de segundo

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― Oi, Annie ― respondi ao atender sua ligação. ― Aconteceu algo?

― Não, está tudo bem. ― Ela parecia ocupada como se guardasse algumas coisas em um armário. ― Só queria avisar que hoje vou dormir na casa do Poncho.

Anahí sempre me telefonava para comunicar se vinha para o apartamento ou não, acho que ela tinha medo de encontrar seu irmão pelado!

― Ok, então não te esperamos para o jantar.

― Ah... Precisamos marcar outro dia para sairmos os quatro juntos. Foi divertido a última vez, né?

Eu balancei a cabeça concordando, nós fomos em um barzinho que dava para jogar sinuca, boliche e fliperama. Decidimos começar pelo boliche, enquanto a loira e o Poncho competiam igual doidos entre eles, Christopher e eu ríamos por conseguir errar a maioria das bolas, sempre caia na canaleta.

― Claro! Vamos marcar sim.

Após alguns minutos de conversa, encerrei a ligação, caminhando até a cozinha. O Ucker preparava a comida, enquanto encostei no balcão da pia para pegar a minha taça de vinho.

― Sua irmã não vem hoje. ― Espiei o rapaz ao mesmo tempo que bebia o líquido.

― Isso quer dizer que ficaremos sozinhos? ― Ele se aproximou de mim, apoiou uma mão ao lado do meu corpo no mármore.

Acenei sorrindo, passando meus braços envolta do seu pescoço para beijar seus lábios, Christopher afrouxou meu robe e suas mãos tocaram a minha pele. A carícia se intensificou quando nossas línguas se juntaram, mas o som da campainha interrompeu o momento.

― Já volto ― disse sem desgrudar de sua boca.

Ele protestou me apertando mais em seus braços.

― Ucker, deixa eu ver quem é ― retruquei com uma risadinha.

Assim que o rapaz me soltou, eu arrumei o robe firmando o laço.

― Oi, Mai! ― mencionei ao abrir a porta. ― O que houve? ― Ela possuía uma expressão tristonha no rosto.

― É o Matheus, ele não quer sair do quarto. Não me fala o que tá acontecendo. ― Seus olhos me encararam angustiados. ― Você pode ir lá em casa, um minutinho?

― Claro! ― declarei preocupada. ― Já vou.

Maitê agradeceu se retirando do meu campo de visão e eu fui até a cozinha deixar a taça de vinho na pia. Encontrei Christopher de braços cruzadas parecendo emburrado.

― O que deu? ― perguntei arqueando as sobrancelhas.

― Esse é o seu jeito de sair na rua? ― Apontou para a minha veste.

― Ah, que fofo, tá com ciúmes? ― Uma risada escapou dos meus lábios. ― É aqui do lado! Não se preocupe que os outros só podem olhar. ― Fiquei na ponta do pé para encostar a minha boca em sua bochecha. ― Até daqui a pouco, ciumentinho.

Coloquei uma sandália para seguir para o apartamento da Mai, um pouco preocupada com o Matheus, o que será que aconteceu? Abri a porta destrancada, percorrendo a sala para então chegar no quarto do menino.

― Oi querido, o que houve? ― Sentei na beirada da cama.

O garotinho estava encolhido no canto, suas costas desciam e subiam, chorando.

― O Jonathan não quis brincar comigo ― disse soluçando, meu coração apertou por ver seu sofrimento.

― Mas porque não? ― O que esse pestinha tinha contra o Mati? Pensei enfezada.

― Ele falou que quem não tem pai, não pode brincar! ― Engoli mil palavrões que gostaria de exclamar, no entanto, me aproximei dele.

― Oh, meu amor, ele deve estar morrendo de inveja de você. Tanta gente que te ama. ― Passei minhas mãos nos seus cabelos. ― Aposto que esse Jonathan não tem a tia Annie, o tio Luís, eu... ― Matheus se virou na minha direção, os olhos continham algumas lágrimas.

― Posso dormir com a senhora, hoje?

― Mati, sua mamãe acabou de voltar de viagem, morrendo de saudade de você. Ela deseja a sua companhia.

― Por favor! ― Suplicou, suas íris cor de âmbar me fitaram de uma forma conhecida.

Era impossível vencer esse tipo de pedido, então dez minutos depois, retornei para casa de mãos dadas com o garotinho.

― Oi, campeão! ― Ucker o cumprimentou. ― Veio jantar?

O menino não respondeu indo direto para o meu quarto, o rapaz me avistou confuso.

― Ele vai dormir aqui hoje ― expliquei apertando um lábio no outro. ― Não leva para o pessoal o comportamento dele, tá chateado.

― Ok, pelo visto teremos que ficar no filme essa noite. ― Ele me envolveu pela cintura. ― Não posso competir desse jeito, né. Meu concorrente é só um garotinho de cinco anos.

― Não pode, mesmo. Não saberia escolher entre os dois ― declarei sincera.

***

― Bom dia, meu amor. Tá melhor? ― Matheus veio ao meu encontro e me abraçou apertado.

― Bom dia ― sussurrou.

Ainda não, refleti logo em seguida, Christopher me olhou desconcertado, nós tomávamos o café.

― Creio que possuo uma solução para nossos problemas ― Ucker começou a falar. ― Quem já comeu panquecas americanas?

― Eu não, você já Mati? ― questionei o menino que negou.

― As crianças amam isso lá em Nova Iorque. Dá para colocar calda de chocolate, o que acha de fazermos?

O garotinho não pareceu muito empolgado no início, talvez a ideia de panquecas americanas não o convenceu. No entanto, resolvemos tentar transformar esse pequeno momento em uma aventura culinária, Christopher ficou encarregado de preparar a massa, eu e o Matheus a calda de chocolate. Resultando em uma bagunça completa na cozinha! Farinha voou por todo o cômodo quando o menino decidiu misturar os ingredientes junto do rapaz.

― Misericórdia! ― Gargalhei ao me deparar com os rostos esbranquiçados dos dois. ― Viraram fantasmas.

O riso contagiante de Mati preencheu a cozinha e logo me vi encantada pela cena, era um daqueles instantes simples, extraordinários, que a vida vale a pena. Eu me permiti experimentar esse sentimento de ter uma família, nem que fosse apenas por uma fração de segundo, como se nosso filho nunca tivesse morrido.

Na parte da tarde, a Maitê apareceu para levar o garotinho embora.

― Matheus, pegue suas coisas que você deixou aqui na tia Dul ― Aguardei ele se dirigir para o meu quarto para retrucá-la.

― Mas, por quê? Ele pode vir a hora que quiser brincar.

Mai deu um longo suspiro e me fitou, seus olhos castanhos me analisavam.

― Será que podemos conversar? ― Eu me sentei no sofá, esperando ela começar. ― Sabe, eu refleti muito sobre o assunto desde ontem. Não quero mais trabalhar tanto tempo fora, estou perdendo os momentos mais importantes da vida do meu filho.

Um aperto no meu coração quase fez falhar uma batida, imaginando para onde esse papo chegaria.

― Então, tomei uma decisão, vou voltar para a cidade dos meus pais.

Em uma fração de segundo, eu fui do céu ao inferno, fiquei completamente arrasada como se alguém me tirasse a chance de ter outra vez uma família. 

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Ai não posso com esses momentos familinha 🥺 isso pega bem no meu coração... pooxa, não Mai, não leva o menino nãão!! Tô triste agora :( alguém faça alguma coisa. 

Próxima atualização, pretendo postar na sexta-feira se tudo der certo! Beeijos amores ;* 

Coração FeridoOnde histórias criam vida. Descubra agora