Capítulo 37

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Cassandra não mentiu quando disse que a subida era estreita. O caminho não comportava mais que uma pessoa por vez,  e Ane se sentiu com sorte ao pensar que ela foi feita para comportar kahn e seus lobos, e como ela não chegava a metade do tamanho deles, conseguia se mover com certa tranquilidade ali. Kahn havia escavado longos degraus nas rochas, e era uma subida difícil, lenta e escorregadia devido a umidade causada pelo rio la em cima. As pedras não haviam sido polidas ou bem acabadas então Ane acabou por se cortar diversas vezes enquanto buscava apoio para as mãos e os pés.

Após algum tempo, que para Ane pareceram horas, subindo em silêncio com Baradur os guiando, chegaram a um lugar aberto e mais fresco, onde puderam se acomodar e descansar um pouco. Coletaram água que escorria por uma pedra e partilharam um pouco de carne seca que Cassandra e Gough haviam levado em uma bolsa pequena.

- Como Kahn construiu tudo isso embaixo da Fortaleza sem ser notado? - Ane queria quebrar o silêncio constrangedor que ainda permanecia entre eles, e tentou parecer o mais despretenciosa possível com sua pergunta.

- A Igreja jamais se preocupou com ratos - Gough disse de mal humor e Ane ficou olhando sem entender.

- Escutem bem, vocês dois, se vamos fazer isso, Ane está com a gente. Eu não pedi para virem, então se não puderem tratá-la como igual sujiro que desçam e voltem pra casa - Cassandra repreendeu Gough pela forma que respondeu e Ane se sentiu mal por causar a bronca - O que ele quis dizer é que a Igreja não olha pra quem está abaixo dela Ane. Eles não vasculham os esgotos porque simplesmente não se importam com o que pode estar lá.

- Esgotos? - Ane mastigou um pedaço duro de carne e precisou tomar um gole de água para ajudar a descer.

- Conforme subirmos você vai notar que existem outros caminhos abertos por meu pai nas rochas - Baradur falava cordialmente e parecia mais relaxado que Gough, mas Ane não sabia dizer se era por vontade própria ou pela ordem da mãe - acontece que ele sabia que se cavasse para cima uma hora sairia dentro da Fortaleza, mas não sabia exatamente onde iria sair, então diversos caminhos escavados por ele acabaram não chegando a lugar nenhum, mas o caminho correto nos levará direto aos esgotos da Fortaleza de Pedra - Ane assentiu, indicando ter entendido.

- É melhor não comer muito - Gough soava mais tranquilo e agora parecia mais disposto a conversar, embora, assim como Baradur, Ane não sabia se por vontade própria ou pela bronca de Cassandra - todo o lixo da igreja vai parar naquele lugar, entao você estará atolada até a cintura de merda, mijo, sangue e corpos apodrecendo e boiando - ele se levantou indicando que o descanso havia acabado - você não vai gostar do cheiro.

Ela se lembrou do quanto Ane odiava a Fortaleza de Pedra e um dos motivos era o cheiro horrível que ela sempre reclamava do lugar. Enquanto subia ela tentou chamá-la algumas vezes mas sabia que não teria sucesso. Ane apareceu para salvá-la como sempre fazia, mas dessa vez isso havia ocorrido em um intervalo muito mais curto do que deveria, então provavelmente não teria notícias dela por um tempo.

Chegaram a mais uma câmara de descanso e pelo tempo lá dentro ela julgou que já deveria estar de tarde. As pernas latejavam em protesto pelo esforço e as mãos doíam e estavam machuvadas em tantos lugares que Ane desistiu de estancar os pequenos sangramentos.

- Posso fazer uma pergunta? - estava sentada com as pernas cruzadas e a respiração ainda estava ofegante.

- Já estamos aqui não estamos? - Gough parecia mal humorado novamente e Ane percebeu um olhar de reprovação vindo de Cassandra para ele.

- Eu tenho algumas memórias de Ane, e uma delas é exatamente o dia em que tudo aconteceu com Kahn - ela disse já se arrependendo ao ver a irritação nos olhos deles, mas era tarde demais pra voltar atrás - porque a transformação de vocês é diferentes das transformações que vi naquele dia?

As Crônicas de Luz e Sombra - AneOnde histórias criam vida. Descubra agora