Capítulo 10

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- Calma meu amor, vai ficar tudo bem - Ane segurava um coelho no colo, enquanto o acalmava e acariciava seus pelos brancos e macios. Ela o cheirou, pois sempre adorou o cheiro que os coelhos têm, deu um beijo e o colocou no chão, permitindo que partisse. Ficou observando um tempo enquanto ele pulava aqui e ali, parando para encara-la um pouco antes de sumir floresta adentro. Respirou fundo em busca de coragem e por um segundo sentiu as pernas exitarem. Ela esteve naquele lugar tantas vezes nos últimos anos que podia distinguir cada arvore dali pelo cheiro, e se sentiu alegre quando teve as narinas tomadas pelo aroma do orvalho da manhã se misturando com o cheiro da terra e das folhas caídas. Era outono,  e essa era sua estação favorita desde que se lembrava de observar as estações. Ela adorava como o chão ficava coberto de folhas e como a paisagem tomava tons de laranja e vermelho. Amava como os dias ficavam mais frescos e as brisas sopravam com mais frequencia. O outono era também a estação das frutas e ela amava frutas frescas. Pensou que se fosse supersticiosa consideraria a aparição do coelho como um ato de sorte e naquele dia ela iria precisar.

Retirou suas adagas do cinto e as girou na mão algumas vezes. Ela as amava. Ebony era o nome da adaga que carregava na mão direita e era branca como leite. Ivory era o nome da adaga que sempre empunhava na mão esquerda e era negra como a noite. Ambas igualmente letais, com suas lâminas que faziam uma curva que contornava os dedos e se esticavam em uma ponta fina e afiada, como se fossem dentes de leão marinho. Ane as afiava todas as noites antes de dormir e sempre que se sentia insegura, as retirava da bainha e girava algumas vezes apenas para sentir seu peso nas mãos. Isso a acalmava e dava uma sensação de paz e segurança.

Fechou os olhos e sentiu o vento passando por ela, quase que acariciando seu rosto, enquanto o sol nascia e dava ao horizonte laranja, tons azulados. Ela vestia calças pretas e justas, presas pelo cinto com a bainha das adagas nas costas. Calçava botas de cano alto preso por sete travas acobreadas e um blusa de cetim branco, de mangas longas e um decote generoso. Por cima da blusa vestia um corselet preto, com detalhes em vermelho, que iam como riscos do centro para a parte externa do corpo, marcando sua cintura. Seu cabelo longo e castanho estava preso em uma trança com coque, deixando o pescoço e o rosto o mais visíveis possível. Naquele dia Ane precisava que todos os olhos estivessem nela. 

Após um tempo olhando pro horizonte, ela guardou as laminas na bainha e se sentou na ponta do penhasco onde estava, balançando as pernas no imenso vazio como se fosse uma menina. La embaixo, na Fortaleza de Pedra, a movimentação ainda era pequena, com as pessoas começando a se levantar. Pensou em como os humanos pareciam insignificantes olhando lá de cima, como se fosse pequenas formigas preguiçosas. Tochas ainda iluminavam as estreitas e apertadas ruas da cidade e pequenos grupos começavam a se formar na arena onde mais tarde, ela sabia que haveria uma multidão. Ao fundo, crescendo acima dos céus, estava a gigantesca e reluzente Fortaleza de Pedra, com suas imponentes torres pontiagudas. Era toda feita em mármore branco e polido até brilhar, e durante a tarde era quase impossível encará-la devido ao reflexo da luz do sol. 

Cada uma das torres representava um dos Deuses que a Igreja adorava e sobre os quais sua fé fora construída. Eram seus deuses, heróis de uma era que nem os vampiros mais velhos se lembravam de ter existido. 

Viperax é o Deus representado na torre mais alta, e mesmo do topo da colina onde Ane estava nao era possível enchergar até onde ela se estendia, rasgandos os céus de forma imponente. Ele era o senhor da guerra e o criador do mundo, e fora aquele que se sacrificou abdicando de sua imortalidade para lutar contra a escuridão ao lado dos humanos na guerra dos caídos. É a ele que os humanos diregem suas orações no campo de batalha, pedindo força, proteção e coragem.

Ao seu lado e quase na mesma altura se encontra a torre que representava a santa Morfydd, mulher de Viperax, cujos cabelos dourados brilhavam como o sol, e deusa do fogo e do amor. As lendas sobre ela dizem que foi a ultima dos Deuses a se corromper na guerra dos caídos e o próprio Viperax havia tirado sua vida. No inverno, quando o frio é capaz de congelar até mesmo os oceanos, é ela quem aquece o coração dos humanos, e no verão quando os dias são quentes e longos, é a ela que os jovens oram pedindo por amor.

As Crônicas de Luz e Sombra - AneOnde histórias criam vida. Descubra agora