25. | Responsabilidades

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A fumaça sai pelo meu nariz com uma lentidão anormal. O mundo ao meu redor parece lento, igual uma lesma, e minha cabeça está em outro canto muito distante. O cobertor em meus ombros é uma tentativa de conforto, mas isso me parece inútil agora. Todo e qualquer conforto; todo e qualquer sentimento ou sensações estão inalcançáveis agora; longe, muito longe.

Os primeiros raios solares ameaçam surgir, e direciono meu olhar à varanda para observar. Tão insignificante. Do que vale tanta beleza quando a sua vida está se arruinando por culpa sua? Observar algo tão bonito assim se torna tedioso. É como se eu jamais tivesse admirado e pintado o Sol em todo esse tempo.

Meu olhar vai lentamente em direção ao corredor, lá vejo Dabi ajoelhado no chão, tentando limpar com toda a sua força o sangue dali. Logo vejo Hawks passando com uma sacola marrom, onde provavelmente estavam os cacos de vidro da garrafa que quebrei dias atrás e não me importei de limpar. Yamaguchi está na sala, perto de mim, me observando e me dando mais um monte de coisa pra beber, tanto para os meus ferimentos quanto para eu me manter estabilizado emocionalmente, por enquanto. Mas tudo o que sinto agora é semelhante a estar flutuando, e leve, mas incapaz de fazer movimentos bruscos, ter pensamentos rápidos ou até mesmo ter uma leve noção de espaço e do que está acontecendo. Me sinto dopado. Em um quarto branco, sozinho.

Toga passa por Dabi e volta correndo para ajudá-lo com o sangue no chão. Deve estar difícil de tirar. 

O presente ainda não saiu do meu ateliê.

Lembrar disso faz meus dedos tremerem, e meu cigarro quase vai ao chão. Está queimando tem tanto tempo que o sinto machucar meus dedos, mas tudo bem. A dor me soa boba agora. Há algo maior acontecendo aqui.

Escuto meu celular tocar ao longe, mas não faço nada para pegá-lo. Só vejo Hitoshi sair do corredor com ele em mãos, parando na minha frente e estendendo o aparelho. Continuo olhando para o nada.

— É o seu amigo, o Bakugou. Acho que devia falar com ele. — Sugeriu, abrindo minha mão livre e colocando o aparelho que ainda tocava ali. Me encarou uma última vez e voltou ao corredor.

Encaro o celular de soslaio, pensando se serei capaz de atendê-lo. No fim, conhecendo Katsuki, eu sei que ele não irá desistir até que eu atenda. Então o faço, tão mole quanto estive desde que me sentei aqui.

— … fala. — Minha voz sai arrastada, como se eu tivesse com muito, muito sono. Escuto a respiração dele pela chamada. Parece tão… nervoso.

— Tomadinha, você sabe onde está o Eijirou? Ele saiu ontem pra ir no mercado e não voltou mais, e não atende a caralha do telefone! — Katsuki não estava gritando. Não estava alterado. Ele só estava… desesperado. Suas palavras saiam com uma velocidade anormal, quase se atropelando. Estava nervoso. Eu sabia disso. 

— Eu não sei. — Automático. Eu estou no automático. Eu não… sei…

— Porra, eu estou preocupado, Denki. O Eijirou não é de fazer isso, por Deus… — Silenciou-se por alguns segundos, como se pensasse na situação toda. Mantive-me quieto também, sentindo os restos do cigarro queimando meus dedos. — Inferno. Ok, escuta, tenta ligar pra ele. A Ashido vai chegar amanhã, eu não quero que ele suma antes de ver ela… aquele patife me encheu tanto o saco quando soube que ela voltaria… ele não pode sumir, aquele idiota. Não agora.

Isso não foi sobre a Ashido.

— Tudo bem, Katsuki. Mas se acalme, ele vai aparecer. Ele vai voltar. — Minha voz ameaça oscilar, mas eu não permito. Na verdade, abro um sorriso trêmulo, e meus olhos se enchem d'água. Um nó na minha garganta se forma. — Você sabe que o verá novamente, ele te ama tanto, não vai te deixar.

Purplish Vampire IIOnde histórias criam vida. Descubra agora