20 I Paralelos

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Narrado por Shinsou Hitoshi


Ouço batidas na porta de meus aposentos. Ergo minha cabeça de meu travesseiro, um tanto quanto surpreso pelo horário — um pouco mais do que a hora décima —, mas nada me impede de avisar que a entrada é permitida. Logo mais, tenho o desgosto em perceber que se tratava do réptil desprovido de amor à própria vida, o que me leva revirar os olhos enquanto ele entrava, preenchendo o cômodo com um cheiro de carniça desprezível, com uma pitada de nicotina.

— Antes que encha essa boca pra falar merda, foi a Toga e o Hawks que encheram meu saco para eu vir falar com você. — Ele fecha a porta, mantendo-se de pé. Não desfaço minhas expressões de escárnio, e Dabi parece estar na mesma situação que eu. — Querem saber como você está.

— Eu estou bem. — Vejo-o a bufar aquela nuvem de fumaça, andando até a ponta da minha cama e se sentando sem a minha autorização.

— Para de ser fresco, sabemos que você 'tá noiado por conta do que está acontecendo! — Ele bufa mais uma vez, mas parecia um pouco mais calmo. — Sei que a bolsinha mexe com você. Eu te odeio, mas mesmo assim...

— Eu estou bem. — Insisto.

— Você mente mal demais, rato com asas.

Me sento rapidamente, mostrando minhas presas. Dabi rosna de volta, mas não chegamos a fazer nada. Foi-se a época em que nós dois brigávamos como dois selvagens a troco de nada, apenas orgulho. Os anos passaram, ficamos mais velhos e evoluímos.

— Fale comigo. — A tranquilidade na qual isso me foi dito não me assusta; já o vi assim, apesar de conhecer o verdadeiro Dabi e saber que isso não passa de uma mentira.

São muitas coisas. Muitos pensamentos e sentimentos que vim armazenado por anos, explodindo em meu peito e me adoecendo, à medida que vejo aquele pelo qual eu ainda tento lutar para decair aos poucos, desfazendo-se em minhas mãos. A dor; a dor de ver que minhas tentativas parecem cada vez mais em vão, vazias, tentando preencher esse espaço vazio com algo, mas ir reparando aos poucos que isso só está me levando à solidão. Não saber... não reconhecer, mas ainda assim amar.

Me sinto amando um fantasma. E isso dói.

— Eu estou sustentando isso por amor. — É a única frase que consigo formular, observando meus dedos gélidos tremulando em meu colo. Nego levemente com a cabeça, os lábios se juntando e as sobrancelhas se unindo. Meus olhos ardem. — Mas às vezes sinto que não sei a quem estou amando mais. Eu estou tentando lutar, mas... é tão... tão... complicado. Dói quando olho para ele e vejo o quão ferido ele está; dói quando vou descobrindo, aos poucos, mais sobre o que a mente dele se tornou durante esses anos. Dói saber que... talvez... eu nunca o tenha de volta... que talvez... eu o perca como os outros... eu...

— A bolsinha não vai morrer. — O dragão me interrompe. Só então percebo que estava quase chorando. — Não vamos deixar ele morrer. Nem ele nem a Eri. Você sabe disso. A questão é que você tem que ficar sempre consciente de uma coisa.

— O que?

— Você e a bolsinha são como óleo e água; ficam juntos, mas não se misturam.


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Narrado por Kaminari Denki

Faz algumas horas que Hatsume foi embora.

Eu... não sei o que fazer. Nem como reagir. Eu só... estou aqui. Igual um idiota.

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