so lonely

1.8K 111 5
                                    

Luna

Fiquei encarando o pedaço de papel rabiscado e as três notas entre meus dedos por um bom tempo. Pensei no que aquilo significava e no que deveria fazer.

Não sei quando comecei a chorar, mas logo minha cabeça doía e meus olhos ardiam. Eu tentava não chorar e lembrar do passado, mas um desconhecido acabou de me ajudar da forma mais discreta possível, fez mais do que a minha própria família.

Não só pelos setenta reais, mas por ter parado e parecido se importar, de ter me oferecido seu número e não me julgar.

Respiro fundo ao perceber que tinha que sair dali. Os funcionários já tinham começado a limpar o local para terminar o expediente. Ajeito Sol em meu colo e me levanto, com a mochila nas costas.

Era exatamente tudo o que eu tinha. Eu precisava de um lugar pra passar a noite, e de um banho, e precisava descansar.

Ando um pouco até encontrar um pequeno hotel. Não parecia dos melhores, mas eu não estava em situação de escolher.

Respiro fundo ao ler o cartaz com a tabela de preços. Sessenta e cinco reais, doze horas.

Já estava ficando escuro e eu não tinha onde procurar saída. Então, pago a moça da recepção e pego a chave gasta e encardida, ela não pediu nenhum documento.

Subo as escadas de madeira, encontrando o quarto número dezessete sem muita dificuldade.

- Você está ficando bem pesadinha pra eu ficar te carregando no colo, mocinha! - Sorrio fraco para minha filha, a colocando na cama de lençóis brancos.

Ela solta meu cabelo e se joga pra trás, gargalhando quando o faz.

O quarto era pequeno, mas bem mobiliado e iluminado. Uma pequena televisão sobre a cômoda de madeira, uma cama de casal e dois criados-mudos, a porta para o banheiro era clara. O aviso nela dizia que a água quente era limitada, que a energia acaba quando o tempo de estadia se expede e que eles não tinham um restaurante próprio.

Com isso, decido que devia dar banho em Sol primeiro, então assim o faço. A noite seria longa.

•••

— Tá tudo bem. É, tudo melhor que nunca! — Murmuro para mim mesma, cobrindo Sol com meu casaco, acelerando pra tentar sair da chuva.

O inverno está chegando e esse foi meu maior alerta disso.

Estava trovejando e chovendo muito. Como um bom dia em São Paulo, o tempo mudou do nada e tudo aconteceu muito rápido.

Olho para os dois lados rapidamente antes de atravessar, assim que avisto o ponto de ônibus vazio. Me sento no banco de metal e respiro fundo. Os pingos pesados faziam barulho quando colidiam com a cobertura.

O casaco estava ensopado, mas Sol não havia pego chuva. Ela não estava chorando, mas me encarava assustada. Talvez por conta do barulho.

Tento encontrar uma solução. Respiro fundo algumas vezes, fecho os olhos por alguns segundos e a única conclusão é que eu estava sozinha. Sozinha, cem por cento. Não tinha tempo pra fingir que estava tudo bem. Não mais.

— Richard! — Meus lábios balbuciam assim que sua figura aparece em minha mente.

Tiro o pedaço de papel umido do bolso, com um pouco de dificuldade. Me esforço mais um pouco para tirar o telefone público do gancho, discando o conjunto de números, esquecendo qualquer hesitação que ligar para um estranho pra pedir ajuda tinha.

— Luna? — A voz melodiosa se pronuncia do outro lado, antes mesmo que eu o faça, um tanto no impulso, eu acho.

— É, é, sim. Richard, né?

— Sim, eu. Está tudo bem? — O tom de preocupação em sua voz é nítido. Respiro fundo. — Isso é barulho da chuva? A Sol está com você?

— Uhum! — Acho que minha voz embargou ali. Fecho os olhos e aperto minha filha contra meu corpo — Eu... Preciso de ajuda.

— Tudo bem! Tudo bem, só me... Fala onde você está, ok? Eu chego aí rapidinho. — Suas palavras saem rápidas e ele parecia estar andando agora.

— Na segunda rua depois da lanchonete de ontem. — Engulo seco quando sinto as lágrimas escorrerem. Eu não estava acostumada a pedir ajuda.

Eu não estava acostumada ter a quem pedir ajuda.

— Chego rapidinho, ok? Em dez minutos no máximo.

alright, richard rios.Onde histórias criam vida. Descubra agora