Arestas

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*Reis*


- Amiga, você viu a maneira que a Buiar me tratou durante a gravação? – pergunto pra Ingrid, só pra ter certeza que não foi coisa da minha cabeça ela ter me ignorado a tarde toda.

- Eu percebi, o que rolou? – confirma minhas suspeitas

- É que a gente não está se falando

- Por que não?

- Quer saber, eu não quero falar sobre isso

- Tá, por mim tudo bem, tá ok

- Obrigada - fico aliviada dela não se aprofundar no assunto

- Eu posso te dar um conselho?

- Claro – é sempre bom ouvir quem está de fora da situação, parece que conseguem enxergar melhor

- Pela minha experiência, se deixar algo em fogo brando tempo de mais, uma hora vai transbordar e extinguir a sua chama piloto

- Foi bem poético – fico impressionada

- Às vezes escrevo alguma coisa do tipo

- Sério? Eu não sabia

- Eu comecei a faculdade no curso de letras

- Uau! E porque mudou pra arte cênicas?

- Meu pai, ele era ator de cidadezinha pequena e eu via o bem que aquilo fazia pra ela e pra quem o assistia, ai quis fazer o mesmo

- Olha, isso é muito generoso da sua parte, desistir de algo pra tentar ajudar os outros de alguma forma

- Não fica sentimental, eu tenho uma reputação a zelar – fala se retirando

- Tá bom – sorri

Essa situação toda com a Buiar tem me causado muito desconforto, quero ao menos voltar ao que era no início, quando tudo era leve e a amizade, a cumplicidade se fazia presente em nossas vidas pessoais e também na ficção, Valentina e Luiza são o casal mais apaixonado que já li na história e isso precisa ser nítido para o espectador e mais que isso eu não quero estar longe dela, nós sempre nos ajudamos tanto em cena, ela sempre me dá dicas e me acolhe, isso me faz falta, eu queria muito ter abraçado ela no final da cena que fez hoje, sei que foi uma cena difícil pra ela, mas não tive coragem de me aproximar, não depois do jeito que ela me tratou.

Agora a noite vamos fazer outra cena bem difícil, vamos pra outra locação, passaremos a noite lá, teremos uma cena com a família da Valentina que será gravada amanhã e uma sentada em um banco do lado de fora da casa também pra amanhã, mas hoje será o dia que antecedeu o segundo acidente da Luiza, vamos gravar ela entrando em uma casinha na árvore com a Valentina e conforme entra vai lembrar do primeiro acidente que teve, isso a levará a um surto onde vai ser bem hostil com a Valentina, já estamos todos prontos para seguirmos até lá, só esperando Buiar que pediu pra trocar de carro com a Pugliese, só pra não ir no mesmo que eu, isso está ficando ridículo, acho que as pessoas em volta ainda não perceberam nosso afastamento, fora é claro Larissa que é o pivô de tudo e Ingrid que sempre foi muito observadora e percebeu logo de cara tudo que rolou, mas voltando, as pessoas não perceberam por enquanto, porém se isso continuar vai afetar nosso trabalho.

Fomos para locação no carro do Apóstolo com  ele obviamente dirigindo, Pugliese, Mia, Lucas e eu, a viagem apesar de ser um pouco longa, duas horas de estrada, foi bem tranquila, fomos conversando amenidades e ouvindo funk. Onde tem Lucas, tem funk, não dá pra separar os dois. Chegamos descarregamos as coisas e enquanto a galera arrumava o set, os atores seguiam para a caracterização, meu cabelo já estava pronto, só me faltavam a maquiagem e as roupas, deixei pra ir por último, subi para o quarto onde vou passar a noite, mais uma vez dividindo com a Buiar, nunca vai ter quarto suficiente e nunca vão colocar a gente em quartos separados eu já aceitei isso, fiquei ali descansando, sem me mexer muito para não estragar o penteado.


...



- Ação! – a cena começa, Valentina me conduz até o interior da casinha, mostrando fotos do casal com o filho, desenhos e pinturas dele – eu senti uma dor que eu conheço, não ter visto o filho crescer e a Valentina mostrava tudo com tanta alegria que de fato me sufocava

- Nessa foto você nem sabia que estava grávida – Valentina fala apontando para a foto – à medida que ela ia falando tudo ficava muito mais real pra mim, sabe quando a pessoa vai falando e aquilo vai te fazendo mal.

- Eu não tô bem – fala da Luiza, vou afastando do mural de fotos, minha vontade era de se abaixar ali, mas como atriz eu sabia que não poderia me abaixar, tinha que seguir a marcação certa pra cena correr bem, vou me afastando e desvencilhando das investidas da Valentina de me tocar, me agacho e começo com um choro bem doloroso, tento não pensar na minha vida nesse momento para não ter uma nova crise, como a dos primeiros dias de gravação

- O que foi? Oque você está sentindo, fala pra mim – Valentina tenta uma aproximação – Luiza! Luiza, fala comigo

- PARA DE ME ENCOSTAR! – Luiza grita e eu Reis fico quebrada por dentro, ter que gritar com a Buiar ainda que em cena é uma coisa que me machuca muito – saio da casinha apressada

- Corta! – no momento do corta eu fui até o guarda corpo, me debrucei ali e descarreguei toda a tensão daquela cena

- Reis você está bem? – Pugliese fala ao ver que estou chorando muito, entre gritos – Isso é só uma cena, você não é aquela pessoa – ela fala

- Eu sei, mas eu preciso soltar isso – gesticulo com a mão sobre todo o meu peito, indicando que o sentimento preso ali tinha que sair

- Ok – ela me deixa ali, Buiar como sempre vem para um abraço, não estamos bem uma com a outra, mas ela não deixa de ter esse cuidado comigo, mesmo não querendo que eu esteja por perto neste momento

Quando tudo se torna real (BuiaReis)Onde histórias criam vida. Descubra agora