Balancei minhas pernas, escorando minhas costas na parede e encarando a rua do lado de fora. Meu tênis quase encontrava no telhado embaixo da minha janela e isso era o máximo de contato externo que eu tive pelos últimos três meses.
- Então - ouvi a voz do Dr Hernandez e desviei meu olhar da rua - O que acha? - ele questionou calmamente, cruzando as pernas.
- Não sei se consigo - respondi honestamente, me lembrando de sua pergunta - Não gosto de ficar no escuro - sussurrei, voltando meu olhar para meus tênis.
- O que acha de deixar apenas o abajur aceso? - Dr Hernandez sugeriu, e ao erguer meu olhar, o vi anotando algumas coisas em sua caderneta - Não precisa ser todos os dias, apenas algumas noites, o que acha? E, se você se assustar no meio da noite está tudo bem em acender a luz, o importante é você tentar - ele explicou em um tom calmo, um leve sorriso nos lábios.
Lembrava o sorriso de Aline. Era reconfortante.
- Eu não me senti enjoada ontem, ao pensar em tudo - mudei de assunto, o vendo erguer a sobrancelha - Também não fiquei com tanta raiva ao pensar nos meses lá, ou em meu pai - confessei.
- Eu fico muito feliz que tenha me contado isso, Maraisa. Estou orgulhoso que tenha conseguido controlar o que sentiu - ele disse com um sorriso genuíno que me deixou um pouco orgulhosa de mim mesma.
- Acabamos? - perguntei ao vê-lo começar a guardar suas coisas.
- Por hoje sim, te vejo na próxima semana - avisou, se colocando de pé - Ainda está escrevendo?
- As vezes - murmurei, desviando o olhar - Tem dias que é difícil - expliquei baixo, soltando um suspiro pesado.
- E é nesses dias que é ainda mais importante que escreva, a medida que você coloca no papel é mais fácil para se abrir com outras pessoas e até mesmo para entender tudo que sente - Dr Hernandez aconselhou e eu me limitei a assentir devagar - Até semana que vem, Maraisa.
- Até - acenei levemente, sem me preocupar em lhe acompanhar até o andar debaixo.
Saí da janela, tirando meus tênis e caminhando até a cama, pegando meu celular que estava ali. Eu conversava todos os dias com Sofia e a via duas vezes por semana. Eu estava realmente tentando consertar as coisas com minha irmã caçula, e era inacreditável o tanto de coisas que eu havia perdido em apenas oito meses. Era como se nesse pequeno espaço ela praticamente tivesse deixado vários dos traços infantis e eu visse quase uma adolescente em minha frente.
Balancei a cabeça, a respondendo rapidamente e ignorando um pouco meus amigos. Era bom poder ter todos de volta a minha vida, mas às vezes incomodava o nível de problemas deles. Como Lari não estava se adaptando a Califórnia e odiava o time de vôlei no qual jogava, como Bruno estava indeciso sobre o curso que tinha escolhido, ou como Lau estava tendo problemas em conciliar a universidade e os trabalhos de meio período, e Maiara que estava em uma má fase no time de futebol da universidade de Miami.
Eram todos problemas reais e que afetavam a vida deles. Eu só queria que meus problemas fossem esses, fossem relacionados a algo como vôlei, universidade, amigos. Coisas mais simples.
Joguei o celular na cama e saí do quarto, caminhando lentamente até a escada. Minhas meias praticamente escorregavam pelo piso, o que fazia com que eu não fosse ouvida. Não me surpreendi ao ver que meu psicólogo ainda estava na sala.
Acho que ainda estavam se certificando que eu não o xinguei ou o ignorei completamente.
- Acho que estamos fazendo progresso - Dr Hernandez disse, enquanto tomava uma xícara de café.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Lost Girls - Malila
FanficMaraisa sempre acreditou ser uma garota que perdia. Perdeu a mãe cedo demais para uma doença que ela mal sabia pronunciar o nome quando aconteceu. O pai, perdeu para o crime. A irmã, perdeu para uma família que ela nem ao menos conhecia. A vida? Ain...