Capítulo 5

90 11 34
                                    

     Eu não acredito em Deus, mas se acreditasse, o xingaria até a sétima geração. Eu já disse que odeio Raquel Murillo? Acho que sim, mas é sempre bom reforçar: EU ODEIO RAQUEL MURILLO.

     Puta que pariu, quando eu disse que ela era a única à minha altura eu não estava pedindo um desafio. Apesar de ela ser uma surpresa extremamente desagradável para o meu psicológico, é muito melhor ter que lidar com ela.

     — Acredito que vocês já se conheçam. — Antonio diz, entreolhando nós duas.

     Assentimos juntas. Se ele soubesse...

     O bom de ser Raquel é que ela aumenta o meu espírito competitivo. O ruim de ser Raquel é que ela aumenta MUITO o meu espírito competitivo e eu terei que me controlar bastante para não atirar nela em vez de nos bandidos.

     Apesar de tudo, não somos uma dupla, e qualquer um que está contra mim, automaticamente, é meu inimigo. Antonio termina a explicação sem se importar se Murillo está acompanhando ou não. Ela que chegue mais cedo das próximas vezes, pois eu não a explicarei nada.

     Já me sinto na vantagem e isso me faz sorrir internamente. Se continuasse assim, finalmente meu trabalho estaria sendo recompensado. E eu espero ganhar o estágio para tudo isso valer a pena.

     Parece que seremos só eu e Raquel. Bem que o professor falou que o caso tinha sido pensado para nós, mas como dupla. Como será que ele se sentiria sabendo que estaremos uma contra a outra?

     Eu estou me sentindo adorável.

     Assim que o supervisor nos dispensa de suas explicações, escolho um dos computadores avulsos e pego algumas fotos de Andrés e mapas da cidade para começar a estudá-los.

     Raquel pega os outros e se senta mais longe. Se ela acha que eu vou querer dar uma olhada no que ela está fazendo está muito enganada. O que me surpreende é que dez minutos depois ela pede para sair da tenda e a sigo.

     Se vou trabalhar contra ela, preciso estar alguns passos à frente e parece ser o contrário. Incomodada, fico alguns metros atrás para que ela não me veja. Observo onde ela para e tira um maço de cigarros do bolso.

     Desde quando Raquel fuma? Será que a mãe dela sabe? Se não souber, o bicho vai pegar...

     Volto para continuar estudando os mapas e, sorrateiramente, pego alguns da mesa de Murillo para mim. Se forem diferentes, preciso saber de todos os pontos possíveis para cercar Andrés o máximo que eu puder.

     Alguns minutos depois Raquel retorna também e começa a procurar os papeis que estão comigo. Depois de bufar e me ouvir soltar um riso baixo, ela me olha com ódio. Engulo em seco por um momento. Nunca a vi me olhar daquele jeito e sinto minha nuca arrepiar.

     — Porra, ruiva. Esse papel é meu.

     — Não tem o seu nome nele.

     — Me devolve, estou usando.

     — Depois que eu terminar de usar, devolvo.

     — Caralho, Alicia.

     Ela avança para cima de mim e apoia as mãos na minha cadeira, ficando perigosamente próxima. Sinto sua respiração bater na minha e ela me fuzila. O que sinto é uma mistura de medo com tesão. Digo, tensão.

     — Me devolve o meu papel.

     — Ou o quê?

     É a minha vez de sorrir cinicamente. Vejo suas bochechas assumirem um tom mais rosado e posso perceber, pela primeira vez, que ela está provando do próprio veneno. E esse é o melhor gosto que eu poderia sentir.

     — Ou eu vou fazer da sua vida um inferno.

     Ela se aproxima ainda mais, quase colando nossos rostos. Sinto meu coração palpitar e espero que ela não ouça o ritmo descompassado da escola de samba nervosa que habita meu ser. A ideia é exercitar meu autocontrole e tenho conseguido, pois em outra época, eu já teria voado no pescoço dela.

     — Mais do que já faz, acho impossível.

     — Você não me conhece, ruiva. Cuidado.

     — Não sei se está me ameaçando ou flertando comigo, Murillo.

     — Entenda como quiser.

     Ela molha os lábios e retira o papel da minha mão sem esforço nenhum. Porra. Raquel Murillo é uma mulher muito linda e tem um magnetismo do cacete. Eu nunca admitiria isso, claro, mas não posso negar.

     Infelizmente, tenho um fraco por mulheres no geral. E mais infelizmente ainda, tenho um fraco por mulheres fodas. Raquel é uma mulher linda e foda.

     Mas ao mesmo tempo em que me sinto atraída por ela, sinto que poderia quebrá-la a qualquer momento. Nós duas em uma sala com uma arma só teria como dar errado.

     Espero que eu não tenha que matá-la, senão a mãe dela vem atrás de mim e eu teria que viver foragida por isso. Só existe uma pessoa no mundo inteiro que faz meu corpo arrepiar de forma negativa só de eu sentir a presença, e essa pessoa é a mãe de Raquel.

     Quando vejo Murillo retornar para sua mesa bufando, sei que a tirei do sério. Mas não posso fazer nada, esse é o meu dom, assim como é o dela. E tenho a plena certeza que ela vai fazer de tudo para realmente tornar minha vida um inferno.

     Só que eu também vou.

     Já falei, esse estágio tem que ser meu e eu não vou abrir mão disso. Não vou deixar que ela tome isso de mim também. Eu me esforço tanto quanto ela, ou até mais, então tenho a mesma quantidade de direitos.

     Estou cansada de sempre ser Raquel a que ganha tudo, que passa com méritos, que é a mais adorada dos professores. Faça-me o favor. Este ano serei eu e vocês me digam se esperavam ou não.

Prenda-me se puderOnde histórias criam vida. Descubra agora