Cada dia mais eu me pergunto quantas pedras eu atirei na cruz antes de ter nascido neste corpo. Devem ter sido muitas. Os espíritas dizem que somos nós quem escolhemos as batalhas a enfrentar durante nossa existência, mas eu duvido.
De todos os obstáculos do mundo, por que diabos eu teria escolhido Raquel Murillo?
— Por que eu deveria confiar em você?
— Porque eu estou vigiando as câmeras de segurança e vai dar merda se você apenas me ignorar.
Ela deve estar brincando. Não há outra opção senão ela estar brincando comigo. Eu não aceito.
— Mas nós não somos uma dupla, Raquel, você é minha adversária.
— Eu sei, mas você faria isso por mim também. Por mais que você me odeie em uma escala muito maior do que a minha, eu tenho a mais plena certeza que você faria a mesma coisa se fosse eu no seu lugar.
Porra, não é possível. Ela definitivamente está zoando com a minha cara. Desde quando ela acha que temos essa intimidade? Como ela ousa achar que sabe mais de mim do que eu mesma?
Apesar de tudo, sinto minhas bochechas corarem, só não sei se pela raiva ou porque fiquei envergonhada pelo jeito que ela falou. Eu não faria o mesmo por ela. Certo?
— E o que vamos fazer então, senhorita sabichona?
— Esperar.
— Porra, Raquel. É mentira, né? Eu já tô aqui há meia hora.
— Confia em mim, ruiva. Calma.
Se eu tivesse certeza de que era mentira, eu já teria dado vários tapas nessa mulher, mas como não tenho, prefiro não matar o disfarce. Se ela realmente está falando sério, todo cuidado é pouco.
Passam-se mais oito minutos exatamente, quase o final do tempo de debandar, até que o vejo passar serenamente do lado de fora, chegando cada vez mais perto da cafeteria. O sinal que emito no rádio é curto, mas o suficiente para que meus colegas entendam. Desligo o aparelho logo em seguida. Raquel percebe minha tensão e rapidamente a compreende.
Tento me levantar, mas ela segura minha mão como uma forma de me fazer esperar. Quero me soltar e fazer as coisas do jeito Alicia Sierra, mas temo que talvez seja mais seguro seguir o jeito Raquel Murillo.
Assim que o homem coloca os pés na cafeteria, ela me olha de um jeito estranho. Ela parece com medo, mas é impossível. Raquel é uma das pessoas mais corajosas que conheço no mundo todo.
Algo me diz que realmente pode dar merda.
O olhar que a lanço tenta captar os os próximos passos, mas ela não me entende e olha para o outro lado. Nunca conseguimos conversar só pelo olhar e seria um ótimo momento para termos uma ligação importante como essa.
De repente, ela chega mais perto, como se fosse me contar um segredo. Olho para os lados, não perdendo de vista o assaltante. Ainda não sei exatamente o porquê de ela estar me ajudando, mas devo confessar que ter esse auxílio dela é muito bom.
Novamente, ela me olha daquele jeito estranho, receosa. Percebo que ela transfere as pupilas para algo acontecendo atrás de mim e logo retorna para a minha face, mordendo a boca em nervosismo.
— Alicia, me beija.
— Quê? Tá doida?
— Me beija logo, porra.
Raquel fala mais baixo, entredentes. Entendo a situação, mas não consigo conceber a ideia. Meu estômago começa a revirar e sinto meu coração bater descompassado. Parece que vou vomitar.
A fim de não botar tudo a perder, me aproximo devagar do rosto de Raquel, observando pela primeira vez como sua boca é extremamente convidativa. Ainda assim, me retraio. Ela, porém, está impaciente e me puxa para si.
Suas mãos pousam em meu rosto com delicadeza, mas firmes em seu propósito de me segurar. Sinto minhas bochechas arderem enquanto nossos lábios seguem colados. Meu coração palpita de forma que seria preciso me levar ao pronto-socorro mais próximo, pois parece que vai rasgar meu peito.
Quando acho que Raquel vai me soltar, ela passa uma das mãos para a minha nuca e sinto meu corpo inteiro arrepiar. Busco apoio em sua cintura e ela abre levemente a boca, dando passagem para que sua língua encontre a minha.
Porra. Porra. Porra!
Sinto que ela chega ainda mais perto, como se fosse possível. Torço para que ela não perceba meu coração acelerado, pois com certeza vai usar isso contra mim na primeira oportunidade que tiver.
Sei que esse beijo só vai durar enquanto esperamos nossos colegas chegarem para reforço, mas aproveito a sensação que ele me causa como se fosse o último. Até porque deve ser mesmo.
Tudo o que dizem do beijo de Raquel Murillo é mentira, já que na verdade é muito melhor. Mesmo sem esforço, ela domina meu corpo de uma forma indescritível. A odeio, mas estou entregue.
Já falei isso, ela tem um magnetismo do cacete. E o beijo dela é igual.
Sinto que tudo está silencioso ao nosso redor naquela cafeteria. Todos devem ter parado para ver o beijo de cinema que estamos dando. Talvez pensem que somos namoradas ou que estamos ficando pela primeira vez.
Não há mais espaço a ser preenchido. Nossos corpos estão colados, em intensa sintonia. Nossas línguas dançam em um ritmo sensual ininteligível, escrito apenas para nós duas.
Sua boca colada na minha me dá a sensação das chamas de uma lareira em dias frios, como se nada de ruim pudesse acontecer. Acho que me entreguei demais e isso me preocupa.
Já estou sem ar, mas não sou eu que corto aquele contato. Apesar de estar tudo silencioso, ao longe é possível ouvir as sirenes dos nossos reforços chegando, e sei que chega também o fim daquela excitante aventura que é beijar Raquel.
Entretanto, ela demora para me soltar completamente. Fica com a testa colada na minha até ouvir o som de portas batendo do lado de fora e as várias pessoas entrando na cafeteria.
E então ela me olha com outra expressão. É uma que diz "vamos pegar esse filho da puta", e é como se tivéssemos ganhado a conexão de troca de olhares após o beijo, pois a entendo perfeitamente e sei exatamente o que fazer.
Ela sorri e eu a acompanho pois me sinto genuinamente feliz pelo que está prestes a acontecer. E apesar de não dizer com todas as palavras, também estou feliz por ter beijado Raquel Murillo, não posso negar.
Tudo o que vem depois acontece em cerca de cinco segundos.
Ela vira de costas para mim e, juntas, retiramos nossas armas do coldre e as apontamos para o assaltante. Nossos colegas já o cercaram e ele não tem escapatória.
Desesperado e pego de surpresa, ele puxa a própria arma e atira na primeira pessoa que ele vê.
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Prenda-me se puder
Fanfiction[AU Ralicia Academy] Raquel Murillo é a melhor aluna da Acadepol e Alicia Sierra a odeia com todas as forças justamente por isso. Entretanto, quando são obrigadas a trabalhar juntas, elas descobrem um novo sentimento e tentam fingir que ele não exis...