Amigo do meu irmão

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Alsel Qiang



O restaurante está quase lotado, mas ainda há algumas mesas vazias. Nos apressamos em escolher uma delas e sentamos aguardando a chegada de um garçom. Durante a luta de hoje, Cayo pôde me dizer algumas coisas, mas o desgraçado não quis me contar tudo, ele deseja me entregar as informações aos poucos, até o último dia do torneio. Não é como se eu estivesse ansioso para saber tudo agora, mas o tempo é algo precioso.



Entretanto, mesmo que eu já soubesse mais que o necessário, não posso simplesmente abandonar Raely aqui e seguir adiante com meus outros planos. Ficarei quase um mês lhe fazendo companhia, até que consiga vencer o torneio, ou se perder, em algum momento posterior terei que a deixar para cumprir meus próprios objetivos.



O garçom finalmente aparece, eu peço uma macarronada com molho rosa, Raely escolhe um almoço tradicional e Loren fica com uma porção de carne assada. Os vejo rindo e conversando sobre coisas da antiga escola, isso me faz lembrar dos bons momentos que passei ao lado de meus amigos. Desejo reencontrá-los pessoalmente, um deles ainda mantém contato comigo, Diego, é aquele que me ajuda com o caso da minha mãe, a outra, Carol, deve estar viajando pela Austrália, o sonho dela era se casar com um surfista e construir uma casa em Camberra.



O macarrão está muito bom, mas ainda não se compara ao de Maya. A velha sabe fazer as melhores receitas deste país, pelo menos na minha opinião.



- E então, vai me falar ou não? - sussurrei para Cayo, no banco da arquibancada.



- Mas é claro que sim, garotinho Qiang. Só fique sabendo, que nada vem de graça.



- O que você quer?



- Hum... Vejamos... Será que é uma tarefa difícil para um ninja como você? Eu desconheço suas técnicas, mas acredito que lhe será fácil.



- Não enrola.



- Calma.



O sujeito ficou me observando de uma forma estranha, o que insinuou naquele olhar? Está apaixonado por mim, por acaso? Ele agia como se houvéssemos uma longa intimidade, inclusive tocou em minha mão de forma duvidosamente delicada.



- Quero que mate meu irmão. - a resposta foi fria e seca. - Ele assassinou o nosso pai diante de mim e de nossas três irmãs. Ele ficou com toda a nossa herança, ele jurou que a morte de nosso pai era planejada desde sua adolescência. Ele é louco, um desgraçado, um covarde...



- Vingança? Que coincidência. Então é por isso que está disposto a me ajudar com aquelas informações? Por termos algo em comum?



- Alsel! - Raely me chamava para falar sobre a luta de Loren - Meu amigo... Ele está ficando cada vez mais encurralado!



- Infelizmente, não há nada que possamos fazer. - respondi.



- O homem que matou sua mãe, é amigo do meu irmão.



Cayo me lançou essa fala, como um tiro de raspão.


Agora fez mais sentido meu amigo o ter encontrado. Companheiro de seu irmão? Colegas de trabalho? Será que o irmão dele também está envolvido na morte da minha mãe? Dois assassinos... Um que destruiu a vida do próprio pai e o outro... Qual seu objetivo em destruir Jian? Será algum parente nosso? Alguém que tinha alguma dívida com ela? Ou simplesmente a odiava?



- Alsel! Ei! - Raely me chama novamente, dessa vez no presente.



Eu estive muito concentrado em minhas memórias de algumas poucas horas atrás. Loren termina de comer, está tomando um refrigerante que pediu para acompanhar.



- Está tudo bem? - a mesma ainda me pergunta.



- Sim, estou bem. Já terminou de comer?



- Ainda não, eu pedi mais um prato! E você? Mal tocou no seu.



- É verdade... Já deve ter esfriado.



Retorno a comer, dessa vez focando nas situações externas.



- Então você conseguiu fazer novas amizades na sua escola? - Loren pergunta para Raely.



- Sim, com um tal de Guilherme. Acho que vocês deveriam se conhecer! Mas eu tenho certeza de que se odiarão no primeiro dia, hahaha. E como estão seus pais? Eles... voltaram?



- Não, eles nunca mais voltarão. Minha mãe nem está com o mesmo homem, desde que traiu meu pai, na real, eu nem sei o que ela anda fazendo da vida. Já meu pai... também está com outra mulher, inclusive... eu vou ter uma irmã...


Raely Helena



Ele não está feliz em me contar isso.


Se bem que eu daria de tudo para ter um irmãozinho... mas não dessa forma, parece que além de perder o um por cento de amor paterno que ainda lhe resta, ele ainda carregará o peso de ser o irmão mais velho e talvez até o provedor da casa. Eu sei que minha situação de vida é difícil, mas meu amigo parece estar numa bem pior. Eu tenho pena dele, quero poder fazer algo para ajudá-lo.



- E sua mãe? Como ela está?



- O câncer dela tem evoluído um pouco, isso está complicando sua saúde, mas com muita dedicação, a tiazinha do Alsel está fazendo chás para controlar isso. Tem a ajudado bastante.



- Que bom, eu realmente desejo que consiga vencer o torneio. Eu não sei qual as motivações dos outros lutadores, mas tenho certeza de que a sua é muito melhor!



- Hum... Talvez...



Agora que estamos aqui, já quase saindo do restaurante, estava me esquecendo de falar algumas coisas.



- Loren, qual foi a última vez que viu a Nathalia?



- Última vez?... Bom... foi ano passado, quando a vi cercada de gente na rua. Eu não queria, mas também nem podia me aproximar. Não sei o que era, mas ela parece estar ficando muito famosa.



- Famosa? Será que ela participou dos torneios anteriores?



- Talvez, é bem provável. Ou ela só tenha virado influenciadora nas redes sociais.



Isso é bem a cara dela.


Loren me olha desconfiado, eu sei que é estranho, eu parecer me preocupar com ela. Mas eu sou muito curiosa, não tem jeito. A Nathalia já não me representa mais nada, eu deveria esquecê-la, ela não faz mais parte da minha vida, agora estamos muito distantes uma da outra.



Alsel pagou meu almoço e o dele, Loren pagou o seu próprio.


Pergunto para meu amigo onde ele conseguiu dinheiro e me responde que estava ajudando um barbeador próximo de sua casa. Guardou a grana até acumular um pouco, ele também conseguiu alugar um quarto de hotel aqui na cidade, mas agora que perdeu no torneio, deve retornar para sua casa. Eu o faço ficar, para me assistir até o fim, mas também para ficarmos mais tempo juntos, já que faz alguns anos que não nos vemos.



Retornamos ao estádio, a segunda luta logo irá começar.


Ai, estou sentindo dores em minha barriga... será que foi a comida? Ou deve ser a ansiedade? No meio do corredor, eu quase não aguento, corro até o banheiro para fazer o maior barrão. Alsel se preocupa comigo, ele procura em sua bolsa algum remédio para mim. Ainda bem que tenho sua companhia.



- Beba isso. É um calmante.



- Calmante? Mas ela está com dor de barriga! - desdenha Loren.



- Não, isso é efeito do estresse. Se ela continuar assim, não vai conseguir lutar nesta noite.



Aceito o remédio e bebo.


Puta merda, que coisa amargosa! Blêê!


Que tipo de calmante é este? Se bem que nunca tomei um antes.


Caminhamos até às arquibancadas, estou muito lenta... O que está acontecendo comigo? Caramba, quanto sono... Acho que vou me apagar...

The Last GardenOnde histórias criam vida. Descubra agora