Raely Helena
O que está acontecendo comigo?
Eu só tropecei na calçada da escola, mas ouço muitos risos vindo para mim. O foda é que pareço uma ratasana estrabanada no chão, e minha touca verde também está suja. Loren me ajuda a levantar, mas pobre coitado, nem ele tem força suficiente para me puxar. Nós dois somos apenas crianças, pobres e fodidas, jogadas ao relento deste mundo cruel.
- Você está bem? - pergunta ele quase chorando, depois que consigo me levantar sozinha e colocar a touca de volta, encarando os filhos de papaizinho que passam na rua, vindos da escola privada do outro lado da quadra.
- Tô ótima, não tá vendo? Nenhum arranhãozinho. - respondo sorrindo e ainda ajeito nos ombros minha mochilinha rasgada. - Vaso ruim é difícil de quebrar!
- Você está se chamando de vaso ruim? Você é melhor que muita gente que conheço.
- Não é isso, mas não sou não. - respondo fazendo bico. - As meninas do Colégio Integral são sim. Olha aquilo, elas têm até mochila de rodinhas.
- Mas ninguém precisa daquilo.
- Elas têm carro, tem dinheiro, tem até pais...
Um grupo delas passa por perto, na verdade é um trio detestável. Estão indo para a lanchonete, fazendo fofocas e conversando abobrinhas. Eu me odeio por saber o nome de cada uma e elas mal saberem o meu. Tem a loirinha Groover, antipática, com um nariz que suga todo o ar do planeta. Tem a de cabelos curtos, Nicole, acho que quando nasceu bateu a cabeça no chão, ela é burra pra caramba. E tem a... Droga! A Nathalia está me encarando só porque agora estou mais desarrumada que tudo. Sua pele é negra e seu cabelo é cheio de cachinhos, deve passar horas e horas só o arrumando.
- Ei, Raely! - É o Loren me tirando daquele transe quase infinito. - Vamos! A gente não pode perder o ônibus!
- Tá bom! - exclamo e juntos corremos o mais rápido possível até o ponto de ônibus mais próximo.
No caminho me despeço dele, a minha casa fica mais longe. Odeio o cheiro de suor das pessoas e essa lotação dentro do busão, mas é minha realidade, a realidade de muitos de nós. Eu só tenho a agradecer a minha mãe, que mesmo depois de meu pai a abandonar, ela consegue fazer tanta coisa por mim. Ela é minha heroína, a mulher mais linda e mais forte que existe no mundo. Se alguém me disser que estou errada, sou capaz de furar o olho da pessoa com um lápis!
Bato na porta da cozinha avisando que cheguei, lá está ela terminando de cozinhar o almoço.
- Já tô com fome! - entro animada e dou pulinhos.
É um cheiro gostoso de feijoada, com pedaços de cenouras e algum outro vegetal que eu não faço ideia do que seja. Enfio o dedo para provar e levo um tapão da véia, que nem é velha, mas gosto de chamá-la assim.
- Ei ei! Para com isso! É falta de educação! - E depois de gritar comigo, ela retira minha camisa e minha touca para poder lavar.
Troco de roupa e sento à mesa para comer.
Do quê eu poderia reclamar? Almoçar apenas feijão não é tão ruim, todo dia revezamos para tentar comer algo diferente, mas infelizmente não há muito o que fazer. As únicas fontes de renda da nossa família são as costuras que minha mãe faz para uma fábrica xexelenta, e as latinhas que eu cato para vender. Falando nisso, tenho que comer depressa e começar a trabalhar.
- Come direito! Se não vai ficar careca!
- Entendi. - penso em voz alta: - Então quer dizer que o diretor da escola passa fome?
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The Last Garden
Ficção AdolescenteRaely é uma jovem sonhadora, animada e divertida, que almeja mais do que tudo, salvar sua mãe de uma doença terminal. Para isso ela encara um torneio perigoso ao lado de seu amigo Loren, um garoto rejeitado pela própria família, tímido e que deseja...