34 o primeiro encontro

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Ares me convidou para nosso primeiro encontro e não sei o
que vestir.
Este não é um daqueles típicos momentos de indecisão de
alguém que tem um monte de roupas e não sabe qual
escolher. Literalmente não tenho o que vestir, está tudo
pendurado no varal, porque minha mãe lavou todas as
minhas roupas e só deixou no armário o que eu não uso, e é
óbvio que não uso por uma razão: não cabem em mim ou
simplesmente já partiram dessa para uma melhor (em
outras palavras, as peças estão rasgadas ou transparentes
de tão desbotadas).
Por que Ares tinha que me chamar para sair logo hoje?
Ainda me lembro daquela voz doce no telefone, quando
ele me pediu que, por favor, desse uma fugidinha. Como eu
poderia dizer não? Obviamente não pensei direito quando
respondi que sim. A única pessoa que pode me salvar é
Dani.
Quando ligo, ela atende no terceiro toque.
— Funerária Las Flores, em que posso ajudá-la?
— Até quando você vai fazer isso, Dani? Já te falei que não
é engraçado.
Ela solta uma risadinha culpada.
— Eu acho engaçado. O que houve, resmungona?
— Preciso que você venha aqui.
— Você não está de castigo?
— Estou. — Diminuo a voz. — Mas vou fugir.
— O quêêêêê? Como assim? — Dani exagera no tom. —
Bem-vinda ao lado sombrio — Você está louca. Vem para cá, mas me espera na
esquina da minha rua.
— Certo, mas você está escondendo o motivo da sua
fuga. Vai para a balada comigo hoje?
— Não, tenho… planos.
— Com quem?
— Depois te explico. Você vem, né?
— Sim. Chego aí em dez minutos.
— Obrigada, você é incrível.
— Me diz alguma coisa que eu não saiba. Até daqui a
pouco!
Desligo e enfio travesseiros debaixo dos lençóis, para
parecer que estou na cama. Faço isso apesar de saber que
minha mãe não vai conferir, porque jamais imaginaria que
fugi e, bem, sinceramente, até algumas horas atrás nem eu
acreditaria que sou capaz disso.
Saio do quarto sem fazer barulho. As luzes de casa já
estão apagadas, então dou uma conferida rápida no quarto
da minha mãe, e nunca pensei que ficaria tão feliz em
escutar seus roncos. Ela está dormindo pesado; teve
plantão ontem à noite e provavelmente não dormiu nada
até agora. Por um instante morro de remorso, mas logo um
par de olhos azuis invade minha mente e isso é motivação
suficiente para sair de casa.
Já na rua, o frio me atinge com força. Sempre esqueço
que o verão escaldante já passou. Não trouxe casaco, então
abraço meu corpo, esfregando os braços. A rua está bem
iluminada e há algumas pessoas conversando do lado de
fora de suas casas. Eu as cumprimento cordialmente e sigo
andando.
Na esquina, tremendo de frio, me dou conta de que talvez
fosse melhor ter esperado um pouco no calor da minha
casa. Só se passaram seis minutos. Dani não mora longe,
mas os sinais de trânsito podem atrasá-la um pouco.
Estou morrendo de frio.
Está vendo tudo o que faço por você, deus grego? Quando avisto o carro de Dani, sinto um alívio tão grande
que sorrio que nem idiota. Pulo dentro do veículo, e Dani
volta feito louca para casa.
Dezoito combinações de roupa depois…
Dizer que sou indecisa é pouco. Dani me deu muitas
opções, e todas eram lindas, mas me bate a ansiedade de
querer estar perfeita para ele, e nada ali me parece à altura.
Sei que ele estará lindo seja qual for a roupa que escolher.
Preciso me achar bonita também e nunca me arrumei de
modo especial para encontrar alguém. É a primeira vez.
Ares continua marcando todas as minhas primeiras vezes.
Como vou superar esse cara se ele não para de fazer isso?
— Eu voto pela saia, a blusa e as botas — opina Dani,
mastigando um Doritos com a boca aberta.
— Que classe — debocho.
— Ficam ótimas em você e servem para qualquer ocasião.
Não sabemos aonde vocês vão.
Ela tem razão. Será que iremos ao bar de Ártemis ou a
alguma outra casa noturna? Depois de me vestir, estou
penteando os cabelos quando vejo no espelho que Dani se
levanta e vem até mim. Ela está apontando o dedo laranja
de Doritos na minha direção.
— Preciso te falar uma coisa.
Eu me viro, nervosa. Seu tom é sério.
— O quê?
— Fico muito feliz que esse idiota finalmente tenha
confessado o que sente por você, mas… — ela morde o
lábio — não esqueça que Ares já te fez sofrer muito, e não
estou dizendo para guardar rancor nem nada disso, mas ele
precisa lutar para merecer seu amor. Você sempre se
entregou de bandeja, e ele não deu valor. Meia dúzia de
palavras bonitas não bastam, amiga. Você vale muito. Deixe
que Ares saiba disso e que lute para conquistar seu amor.
Sinto uma pontada no peito ao ouvir essas palavras. Dani
percebe a mudança em meu semblante e sorri.— Não, não estou tentando estragar seu primeiro
encontro. Só acho que é meu dever, como sua melhor
amiga, te dizer a verdade, mesmo que seja um pouco
dolorosa. Você merece tudo de bom, Raquel, eu sei disso, e
esse idiota precisa saber também.
Retribuo o sorriso.
— Obrigada — digo, pegando sua mão. — Às vezes me
deixo levar pelos sentimentos e esqueço tudo o que já
passei com ele.
Ela aperta minha mão.
— Te adoro, boba.
Meu sorriso aumenta.
— Também te adoro, sua tonta.
Meu celular toca. Dani e eu trocamos um olhar rápido.

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