Capítulo: 54

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Hermione tinha uma paixão pela chuva. Ela adorava o barulho que fazia, adorava usar botas de borracha até os joelhos, com as quais podia andar na lama e nas poças. Ela adorava sentir a água escorrendo do crânio até o rosto e correr para casa para se aquecer. Ela adorava ver as gotas caindo de dentro de sua casa, enroladas em cobertores perto da lareira.

Albert corria ao lado dela, divertido por ter que escapar do aguaceiro que começara no momento em que deram um passo para fora. Hermione teve que correr até o fundo de sua livraria para pegar as botas, antes de enfrentar as torrentes de chuva ao lado de sua melhor amiga.

Ela riu. Pela primeira vez em uma semana, Hermione estava rindo da situação. Ela estava encharcada até os ossos e seus dentes batiam de frio. Mas ela estava rindo. Talvez fosse o nervosismo, uma espécie de aumento depois daquela semana terrível. Talvez tenha sido um pingo de felicidade em meio a todos os seus infortúnios recentes. Ela não se importou. Ela estava rindo e Albert estava latindo.

E então ela riu porque de repente percebeu o absurdo da sua existência, da situação, dos seus dias, da sua rotina. Ela não podia fazer nada além de rir, rir até a garganta doer, rir quando queria chorar. Ela riu porque estava triste, porque estava perdida e porque nada parecia mais ridículo do que essas emoções.

Hermione parou, mas Albert continuou correndo. Sua risada morreu e os latidos de sua melhor amiga soaram como um eco distante. As gotas de chuva em seu rosto misturavam-se com lágrimas e sua garganta apertava com essas emoções que já não expressavam qualquer alegria. Ela chorou, era tão raro.

Fazia dias, semanas, talvez até meses, desde que ela sentiu tanto. Ela se sentiu como se estivesse envolta em algodão, como se todas as suas emoções tivessem sido silenciadas por tanto tempo. Chorando, rindo, foi tudo muito parecido mesmo. Ela era incapaz disso, ou pelo menos era muito raro que fosse normal. Ela queria gritar, soluçar, viver rindo, mas não conseguia. Tudo era tão insignificante e ilusório. Foi tudo efêmero.

Ela estava sem fôlego. Ela colocou as mãos nas coxas e se inclinou para frente, inspirando profundamente para se equilibrar. Ela fechou os olhos enquanto dezenas de gotas de água escorriam pelo seu rosto.

Ela estava rachando. Ela reconheceu aqueles momentos de loucura quando seu corpo e sua mente não continham nada. Aqueles momentos em que tudo parecia ridículo e simples, embora seu cérebro gritasse que nada mais estava certo. Aqueles minutos em que nada parecia valer a pena, quando nada importava. Foi rápido, nunca durou muito, apenas o suficiente para ela ser afetada, marcada por isso.

Ela sentiu como se estivesse entrando em outra realidade, uma dimensão que não era a dela. Ela se sentia leve, não mais carregando o peso do mundo sobre os ombros. Ela deixou de lado tudo o que segurou por tanto tempo. Suas preocupações desapareceram e ela estava pronta, por alguns minutos, algumas horas, para fazer qualquer coisa.

Ela estava louca. Louco .

Hermione olhou para cima e viu sua casa ao longe. A chuva torrencial dificultou a visualização do horizonte. Albert deve ter chegado. Ela o imaginou esperando do lado de fora da porta.

Seu peito ainda estava arfando e seus olhos ardiam de tanto chorar. Ela retomou sua corrida. Nada mais importava, apenas a risada dela animou o vale. Ela se sentiu enlouquecida, histérica. Seus movimentos eram regulares, seus olhos agitados e um sorriso doloroso no rosto. Um momento de felicidade, de leveza.

Ela chegou à porta, exausta. Sua respiração era irregular e suas pernas ameaçavam ceder sob seu peso a qualquer momento. Ela queria dormir, queria sair desse estado de loucura que lhe era tão doloroso. Ela doía muito, era muito difícil. A leveza se foi, só havia sofrimento, peso e opressão.

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