Décima sessão, segunda-feira, 28/08/2017 - 19:32 PM

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Fabiana olhou mais uma vez para o seu relógio de pulso. Os ponteiros indicavam mais de meia hora depois das sete. Ela mordeu o lábio. Sabia que provavelmente nada de ruim teria acontecido, porém, lá no fundo uma vozinha repetia em sua cabeça que algo não estava certo.

Tentava ignorar o máximo de vozinhas interiores que apareciam em sua cabeça. Ela sabia que era algo natural e que todos os seres humanos a tinham em menor ou maior grau e que elas nem sempre estavam certas, mas era mais fácil falar sobre do que de fato fazer. Era muito melhor lidando com outras pessoas do que com ela mesma.

De toda forma, esperou mais.

E depois mais, e depois mais.

Quando o relógio bateu oito horas, ela teve sua confirmação: Augusto Martins não tinha mesmo aparecido para a sessão.

Ela pousou a mão em sua própria têmpora. Apertou a pele com os nós dos dedos. Conseguia sentir a cabeça começando a latejar. Odiava quando esse tipo de coisa acontecia, pois entrava num dilema moral. Talvez nada de ruim tivesse acontecido; mas talvez tivesse.

Se algo ruim tivesse acontecido, caberia a ela intervir?

Ela se questionava se deveria entrar em contato com a mãe de Augusto e informá-la da falta dele. Ela sabia que não seria necessariamente quebra de sigilo, porém, não queria criar situações que colocassem a confiança que ela e Augusto tinham criado em cheque.

Ela caminhou até Laura, na recepção.

— Augusto Martins informou se faltaria à sessão de hoje?

Laura prontamente olhou para a tela do computador na sua frente, digitou algumas coisas e depois ergueu o olhar em direção à Fabiana.

— Não há nada aqui.

— Tudo bem, obrigada.

Laura perguntou:

— Está tudo bem?

— Só odeio quando esse tipo de coisa acontece. — Ela retirou os óculos do rosto e coçou os olhos. — Mas não se preocupe, já irei resolver.

Fabiana se dirigiu ao banheiro e jogou um pouco de água no rosto. Olhou-se no espelho. O cabelo preso no rabo de cavalo ainda continuava intacto, porém, duas mechas haviam escapado do penteado. Ela os prendeu novamente ao rabo de cavalo.

Fitou novamente seu relógio de pulso, como se o tempo fosse lhe entregar alguma certeza. Começou a refletir a respeito das últimas sessões, tentando achar nas memórias alguma pista de algo que pudesse ter acontecido. Lembranças da semana anterior lhe fizeram se sentir culpada e sabia que a culpa não era um bom termômetro de nada. Logo percebeu que estava ficando paranoica. Não adiantava, não tinha certeza de nada e especular só lhe faria ficar mais e mais confusa.

Encarou seu próprio reflexo pela última vez.

Ao sair do banheiro, sabia que já tinha tomado uma decisão, mesmo ainda tendo dúvidas se estava mesmo fazendo a coisa certa. De todo jeito, ela iria informar Camila Martins e perguntar se ela sabia a respeito da falta do filho.

No fundo, achava que podia ser apenas um grande mal-entendido. Talvez Augusto tivesse esquecido de avisar a respeito da falta de hoje e não houvesse nada para se preocupar. Porém, depois da sessão na semana passada, alguma coisa em seu interior a pinicava.

Camila Martins atendeu no primeiro toque.

— Alô?

— Olá, Camila, aqui é Fabiana, a psicoterapeuta de seu filho.

Ela ouviu a respiração de Camila ao telefone acelerar de supetão. Demorou mais ou menos cinco segundos até ela dizer alguma coisa.

— Claro, está tudo bem? Precisa que eu busque Augusto?

— Não. — disse. — Ele não veio à sessão hoje.

Novamente, um silêncio ensurdecedor do outro lado da linha.

— Como assim ele não foi à sessão?

— Eu liguei justamente para lhe informar disso; pensei que houvesse algum mal-entendido e ele pudesse ter esquecido de avisar que não viria hoje.

— Não, claro que não!

Fabiana não respondeu. Na verdade, não sabia o que responder. Na linha, tudo que se podia ouvir era o chiado baixo das respirações aceleradas.

Depois de mais uma eternidade onde universos inteiros foram criados, ampliados, expandidos ao infinito e mortos dentro da fatia de tempo que se encontra entre um ponteiro e outro no relógio de pulso grudado em seu braço, Camila Martins disse:

— Fabiana, onde está meu filho?

Submarine-se, AugustoOnde histórias criam vida. Descubra agora