Antes da primeira sessão, quinta-feira, 04/05/2017 - 6:18 AM

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Augusto acordou com o toque da mão de sua mãe em seus braços.

"Já é de manhã?", pensou enquanto tentava abrir os olhos. Era estranho acordar de um sono calmo, sem pesadelos ou sonhos agitados. Ele só percebeu quando olhou para o relógio encimando a escrivaninha: eram seis e vinte da manhã. O sol já estava começando a nascer e alguns raios entravam pela janela do quarto. Ele, então, debateu-se na cama algumas vezes, jogando os lençóis para todos os lados; do lado de fora do cômodo, o salto da Sra. Martins provocava estampidos ao entrar em contato com o chão.

Quando o sono passou e Augusto finalmente conseguiu levantar-se de sua cama, sua mãe veio lhe dar um beijo de despedida. Era costume e quase uma tradição: ela sempre saía vinte minutos antes do filho — por causa disso ela não tinha noção nenhuma das faltas escolares dele.

O garoto andou até a sala, meio cambaleando por causa do sono, e inclinou-se para se despedir de sua mãe.

— Tenha um bom dia de aula, filho — disse a Sra. Martins.

Ele apenas assentiu com a cabeça, pois sabia que aquilo não iria acontecer.

E assim, de repente, o apartamento voltou a mergulhar num silêncio sepulcral. O garoto ficou olhando para a porta de entrada por alguns segundos, antes de bufar e decidir que precisava se aprontar. No silêncio de seu próprio lar e na escuridão que reinava do lado de fora, Augusto se vestiu com o máximo de ânimo que conseguiu arranjar.

Alguns pássaros já cantavam quando ele saiu de casa.

Andou pelas ruas desertas com seus fones de ouvido instalados em suas orelhas, música alta tocando e com os lábios quebradiços devido ao frio. Alguns carros passaram pelo garoto com certa pressa, o que fez ele se perguntar se andar depressa fazia o dia acabar mais rápido.

Subiu no ônibus em completo silêncio e se sentou em um banco duplo, vazio. Ajeitou-se na cadeira e virou para o lado; a grande janela do ônibus o cumprimentava com uma Curitiba cinza e semiescura, além de várias pessoas com pressa, e frio, andando numa ordem social visível apenas quando observada de longe. Vagavam pelas casas e prédios numa hierarquia silenciosa. Quase todos os edifícios da cidade eram pichados e antigos; às vezes achava que era aquela cidade que o fazia se sentir daquele jeito.

Mas no fundo sabia que o problema era muito maior.

Augusto frequentava um colégio integral, então perdia todo seu dia estudando — e desde que os Dias Ruins começaram, frequentar as aulas estava se tornando mais e mais difícil. Havia quase oito meses que aquela rotina tinha se instalado em sua vida e não tinha sinal algum de que aquilo fosse acabar logo. O garoto já havia acumulado doze daquelas cartas dentro de uma caixa, guardada num armário que só ele tinha acesso, e começava a se perguntar se as coisas continuariam daquele jeito pra sempre.

Depois de uns vinte minutos de pensamento soturno, o ônibus chegou ao ponto de destino e Augusto desceu sobre o cimento gelado e desgasto de rua central da cidade grande. Muitos carros estavam parados, presos no trânsito infernal, poucos cachorros latiam alto à barulheira da manhã, e vários outros adolescentes atravessavam a rua para adentrar ao prédio de quatro andares — iluminado pelo pouco sol da manhã —, que esperava mais um dia letivo iniciar.

Ele a atravessou, como todos os outros jovens, e entrou pelos portões do colégio com a cabeça baixa; não era como se tivesse alguém para cumprimentar. As paredes dos corredores do colégio eram todas brancas e, ao contrário dos filmes norte americanos, não continham nenhum armário. Augusto andou sozinho em meio ao mar de pessoas que se distribuía ao longo dos cômodos e quando chegou à sua sala, parou para respirar. Observou os armários ao fundo: eles existiam nas salas de aula — para os alunos que não fossem ficar no prédio na hora do almoço.

Submarine-se, AugustoOnde histórias criam vida. Descubra agora