Quarta sessão, segunda feira, 26/06/17 - 19:30 PM

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Fabiana riu.

Augusto sorriu.

Era a primeira piada que havia contado em mais de mês. E nem havia sido uma tão boa assim. Mas pareceu deixar a psicóloga orgulhosa.

A mulher alta respirou fundo e apertou os olhos com os nós dos dedos.

— Essa foi boa, Augusto — disse, ainda soltando suspiros.

O garoto se reclinou na poltrona, sorrindo como bobo, e coçou o canto da boca com as unhas carcomidas.

— Mas, voltando ao assunto delicado — disse Fabiana, ajeitando os óculos escorregadios. — Como estão você e Henrique?

Augusto a encarou por alguns segundos. Queria que todos cumprissem o memorando que sua cabeça emitiu, mas que obviamente só ele vira: NÃO FALAR MAIS DE HENRIQUE LORENZO. NUNCA. EM HIPÓTESE ALGUMA.

Mas respondeu com naturalidade:

— Na mesma. Sem nos falarmos. Acho que é o maior tempo que ficamos sem conversar desde que nos conhecemos.

Fabiana assentiu.

E o menino se calou.

Pensou por alguns segundos e então resolveu contar sobre a viagem que faria dali a dias — afinal ficaria duas semanas sem vir a sessão alguma.

Ele havia decidido ir com sua mãe porque precisava fugir do mundo, e decidiu contar a Fabiana naquele exato momento porque precisava fugir daquele assunto.

— Minha mãe me convidou para uma viagem no começo do mês, para uma cidade perto daqui por causa do trabalho dela, ela pediu pra avisar que não poderei vir nas próximas duas sessões, espero que não tenha problema faltar.

Ele falou todas as palavras quase sem respirar.

Fabiana, por sua vez, com toda sua habitual calmaria, o olhou como quem quisesse flagrar uma mentira e disse sem rodeio algum:

— Você quer ir nessa viagem ou sua mãe não te deu opção?

Augusto se lembrava de sua mãe o convidando — e não o intimando — no jantar de dias atrás.

Então respondeu:

— Eu quero ir.

Fabiana franziu as sobrancelhas.

— Parece bastante certo disso.

O garoto percebeu o que ela estava querendo dizer. Ela queria que ele admitisse que planejava fugir fisicamente de Helena, do colégio, daquelas duas sessões seguintes e, principalmente, de Henrique.

Mas ele deixou seu orgulho falar mais alto, como de costume, mais alto que a verdade.

— Não saio de férias faz anos, pensei que seria legal conhecer outro lugar — Tropeçou em algumas palavras e piscou repetidamente.

Não admitiu.

A psicóloga o encarou novamente, dessa vez com os óculos grudados aos olhos firmes. Em resposta, Augusto apenas se estremeceu sobre o assento fofo da poltrona azul. Teve certeza que sentiu um arrepio em sua nuca, mas também teve certeza que havia duas sessões que a psicóloga não abria as janelas detrás das poltronas.

Estava desconfortável por mentir.

E ela sabia disso.

— Acho que por hoje é melhor encerrarmos — disse ela, de repente.

Augusto a olhou, implorando uma explicação com o rosto, mas ela já havia se levantado — o que o obrigou a fazer o mesmo.

Quando atravessou a porta branca de madeira, Fabiana disse atrás dele:

— Espero que tenha uma boa viagem. E quando voltar... Espero que esteja preparado para me contar o que realmente está sentindo.

Ele assentiu, envergonhado, mas não se virou.

Continuou caminhando pelo corredor como aquele homem que vira na primeira vez que veio ali, gaguejando palavras sem sentido. No caso de Augusto: gaguejava pensamentos. 

Submarine-se, AugustoOnde histórias criam vida. Descubra agora