Juliette Amado
Lisboa, 20 de Agosto de 2020
Dedilhando a agenda do telemóvel encontrei a anotação "aniversário dele"
Já faz 10 anos que deixei o Brasil, desiludida com a vida profissional e amorosa.
Tinha 19 anos e muitos sonhos. Um deles era ser Advogada, mas a vida nem sempre é feita de sonhos.Estudava e trabalhava, mas por um precalço a situação mudou. Envolvi-me com o filho do patrão e este quando soube demitiu-me. Já tinha uma prometida para o seu nénem. A filha de um empresário abastado.
Quem era eu? Uma pobretanas sem família e sem futuro, dizia ele.
- O meu filho merece melhor e se depender de mim, vai ter.Sem meio de pagar os estudos, cancelei a faculdade. A procura por emprego tornou-se uma tarefa de sobrevivência. Era necessário pagar as contas que todos os dias chegávam.
O meu nome é Juliette e hoje com 29 anos consegui vencer. Aqui em Lisboa para onde fugí há 10 anos sinto-me realizada. Acabei a faculdade e tornei-me uma juíza respeitada.
Vim do Brasil quase escorraçada. Não que eu tivesse feito algo de mal, mas a perseguição de um homem sem escrúpulos levou-me a tomar essa decisão. Em poucos dias peguei nas parcas economias e comprei uma passagem de ida para Lisboa.
A vida foi madrasta para mim. Vi-me sózinha, sem lugar para morar, num País diferente e longínquo e para piorar descobri tempo depois que estava grávida.
Como nem tudo pode ser ruim, Deus pôs na meu caminho um casal que me acolheu em casa e que foi durante muito tempo a minha única família. Faleceram há dois anos e fizeram-se sua herdeira, pois não havia mais familiares.
Foi um choque para mim que já os considerava como pais e ainda mais para Maria Eduarda.
Maria Eduarda é meu xodó. Fruto do meu primeiro e único amor. Eu amava Rodolffo, filho de meu patrão.
Rodolffo cursava Engenharia na altura e a química entre nós foi imediata, mas ele não teve peito para enfrentar o pai, ou não me amava tanto quanto eu.
O pai exigiu o nosso afastamento ou expulsava-o de casa e deixava de bancar a vida boa a que ele estava habituado.
Ele conversou comigo e pediu um tempo. A princípio não aceitei, mas com o pai dele na minha cola, dei-lhe todo o tempo e afastei-me até hoje.
Nunca escondi de Maria Eduarda as suas origens. Ela acompanha o pai nas redes sociais sem nunca se ter identificado. Faz um ano e meio que eu permiti que ela fizesse isso desde que não se identificasse.
Pediu-me de presente no seu aniversário que eu a levasse a conhecer o pai. Prometi pensar, mas sinceramente estou com receio do encontro entre os dois.
Na sua bio ele apresenta-se como solteiro, mas todos sabemos como é o mundo da Internet. Nada é o que parece.
Hoje viemos à agência tratar da nossa viagem. Está agendada para 15 de Setembro. Voamos de Lisboa para Recife.
Maria Eduarda não cabe em si de contente. O sorriso dela de orelha a orelha deixa-me igualmente feliz. Acabou de me dizer que postou uma mensagem de parabéns ao pai.