Capítulo 90

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Seis anos se passaram então, e Eduardo finalmente completou vinte anos dia 19 de fevereiro. Normalmente datas como essa costumam ser motivo de celebração, mas para ele era só um lembrete anual do passado que ainda o assombrava.

De tudo que perdeu.

Mas Abigail, sua madrasta, persistia em tentar fazer algo para alegrar o garoto, por isso depositou sobre a mesa de jantar uma torta de frutas vermelhas com nata. Além do café preto, serviu também chá de camomila e baunilha.

Eduardo estava sentado na ponta da mesa, os ombros curvados para frente e a cabeça baixa, focando seu olhar triste apenas no material de madeira da mesa. Seu pai estava sentado ao lado de braços cruzados enquanto observava a esposa os servir.

— Prontinho! Aqui está! — Exclamou Abigail, sorridente. — É seu sabor favorito, Edu.

O homem finalmente levantou a cabeça para olhá-la nos olhos. Um sorriso forçado tomou seus lábios.

— Muito obrigado.

Observou a mesa servida. O cheiro doce e confortável da camomila. Ele iria se servir, mas Abigail pegou o bule e encheu a xícara de porcelana.

— Eu sei que você não gosta de comemorar, mas é um dia especial, são seus vinte anos! Então não queria deixar em branco — após servir café ao seu marido, depositou o bule sobre a mesa novamente e ajeitou o vestido antes de se sentar em frente ao Augusto e ao lado do enteado. O sorriso gentil ainda se esticava por seu rosto.

"Meu Deus, ela está tentando tanto" pensou Eduardo.

Aliás, se aquele dia estava sendo uma tortura para ele, quem diria para Abigail? Foi ela que teve a filha assassinada 19 de fevereiro de 2015, dois anos atrás.

Por isso, se Abigail se forçava a manter um sorriso bondoso e cozinhar deliciosas tortas apenas para que deixasse o dia de Eduardo menos deplorável do que já era, ele tinha que se esforçar na mesma medida.

Respirando fundo, ajeitou a postura, pegando a faca antes que Abigail e cortando a torta em várias fatias.

— Deixa que eu corto — afirmou, já tirando um pedaço e servindo à Abigail.

Ela observou a torta e depois o seu enteado.

— Ei, esse é aquele costume do "primeiro pedaço"? Se for, estou honrada.

Eduardo soltou uma risada baixa, servindo seu pai e por fim ele.

— Pode ser.

— Ótimo então! Estou tão feliz que arranjou um tempinho da faculdade para ficar com a gente, faz tanto tempo que não fazemos isso.

— Ele tem que focar em seus estudos se quiser se tornar mesmo um professor universitário de física — disse Augusto, bebendo um gole amargo de seu café sem açúcar.

Em silêncio, Eduardo tirou um pedaço da torta e levou até a boca, sentindo o contraste azedo das frutas vermelhas se misturar perfeitamente com o sabor cremoso e suave da nata, a combinação derretia harmonicamente em sua língua. Continuou comendo, mais por cortesia do que por fome ou vontade.

— É bom estar aqui — comentou antes de beber um gole de seu chá de camomila e baunilha.

— Mas como vai as coisas? Como está o Nicolas? E as namoradinhas?

— Mais fácil o Nicolas virar uma namoradinha do que ele arranjar uma — resmungou seu pai, que foi repreendido por um olhar firme de Abigail.

Eduardo riu novamente.

— Pai, já falei que eu não sou gay. Nicolas está bem, está trabalhando comigo de garçom naquela pizzaria, mas não estou saindo com ninguém no momento.

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