XVII. Dinamarca.

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ANA JÚLIA COSTA

A euforia da vitória contra a Noruega ainda pairava no ar, mas sabíamos que o trabalho estava longe de acabar. As semifinais se aproximavam, e o próximo adversário era conhecido por sua força e estratégia implacável. Enfrentaríamos a Dinamarca, uma equipe que sempre causava preocupação em qualquer competição. O desafio seria enorme, e todas nós estávamos cientes disso.

No vestiário, o clima era de foco absoluto. Gabi, como sempre, liderava com seu espírito de luta (por mais que estivesse machucada). Cristiano passava as últimas instruções, detalhando a estratégia para neutralizar os pontos fortes das dinamarquesas. Eu estava concentrada, absorvendo cada palavra, mas ao mesmo tempo, uma preocupação silenciosa persistia em minha mente: meu tornozelo. Ele ainda não estava totalmente recuperado, e o desgaste da última partida havia deixado a dor mais evidente.

Flávia estava sempre por perto, me apoiando em cada momento livre que tinha. No entanto, os holofotes da mídia sobre o nosso relacionamento começavam a se intensificar. Fotos nossas circulavam nas redes sociais, e rumores sobre nossa relação estavam em todas as manchetes. Era algo que eu sabia que estava pesando sobre ela, e isso me preocupava.

Depois de mais um treino intenso, saímos juntas para caminhar. Era nosso momento de relaxar, mas também de conversar sobre tudo o que estava acontecendo.

- Como você está lidando com tudo isso? - perguntei, enquanto caminhávamos por um parque próximo ao hotel.

Flávia suspirou, olhando para o céu, onde o sol começava a se pôr.

- Está sendo mais difícil do que eu imaginei. A pressão, os comentários... Eu sabia que seria assim, mas viver isso é diferente.

Eu parei e virei para ela, segurando suas mãos.

- Eu sei que não é fácil, minha linda, e se em algum momento isso estiver te fazendo mal, podemos lidar com isso de outra forma. Não precisamos estar em público o tempo todo, podemos manter as coisas mais reservadas.

Ela sorriu levemente, embora o cansaço fosse visível em seus olhos.

- Eu não quero esconder o que a gente tem, Ana. Só quero que isso não nos atrapalhe... não atrapalhe o que estamos construindo.

- Não vai, princesa. O que a gente tem é forte. Mas, se precisar de um tempo, de um espaço, só me diz. Estou aqui para você, sempre.

Ela assentiu, e continuamos andando, a tensão entre nós diminuindo. O fato era que, além das semifinais, precisávamos encontrar um equilíbrio entre nossas carreiras e o relacionamento que estava se desenvolvendo.

No dia seguinte, o treino foi focado em estratégias defensivas. Cristiano sabia que a Dinamarca viria com força total, e precisávamos estar preparadas para qualquer coisa. Durante uma pausa, ele me chamou para uma conversa.

- Ana, você sabe que tem sido uma peça fundamental para o time. Mas, e o tornozelo? Como está de verdade?

Eu hesitei antes de responder. Não queria parecer fraca, mas também sabia que precisava ser honesta.

- Ainda dói, professor. Mas eu posso jogar, estou pronta.

Ele me olhou com seriedade, percebendo minha determinação.

- Eu sei que você é forte, Ana, mas quero que você se cuide. Precisamos de você em plena forma, e se for necessário, podemos ajustar a formação para aliviar a pressão sobre você.

Assenti, compreendendo a preocupação dele. Eu faria tudo o que fosse preciso para ajudar o time, mas também sabia que tinha que ser inteligente sobre isso. Não podia arriscar uma lesão pior e comprometer nosso avanço.

Enquanto o dia da semifinal se aproximava, a pressão aumentava. Recebi mensagens de apoio de todos os lados, inclusive de Marcela, que estava ocupada com sua própria competição. Flávia, sempre atenta, fazia questão de me lembrar de que, independentemente do resultado, ela estaria ao meu lado.

No dia da partida, entrei em quadra com uma mistura de nervosismo e determinação. Sabia que cada passo seria crucial, que cada defesa poderia ser a diferença entre a vitória e a derrota. Mas o que realmente me motivava era a promessa que havia feito a mim mesma: proteger o que tínhamos construído, tanto em quadra quanto fora dela.

O jogo começou com uma intensidade que superava qualquer outra partida que havíamos jogado até ali. A Dinamarca era tão forte quanto esperávamos, mas estávamos preparadas. De Paula estava incansável, liderando os ataques com uma precisão cirúrgica, enquanto nossa defesa fazia de tudo para conter o avanço adversário.

A cada defesa que eu fazia, sentia o impacto reverberando pelo meu tornozelo. A dor estava lá, constante, mas eu a ignorava, focada apenas no objetivo maior. Em alguns momentos, sentia a visão embaçar, mas a determinação em não deixar minha equipe na mão me mantinha firme.

A partida foi acirrada, com ambas as equipes se alternando na liderança. Nos minutos finais, estávamos empatadas. Cada segundo parecia uma eternidade, cada movimento era decisivo. Foi então que Samara, com sua visão estratégica, conseguiu uma jogada brilhante, passando a bola para de Paula, que marcou o gol que nos colocou à frente.

A torcida explodiu em gritos, mas sabíamos que o jogo ainda não estava ganho. A Dinamarca partiu para um último ataque desesperado, e a bola veio em minha direção. Era o momento decisivo. Saltei para defender, sentindo toda a força e o peso da partida naquele lance. Consegui desviar a bola com a ponta dos dedos, e ela bateu na trave antes de sair.

O apito final soou. Havíamos vencido.

Cai de joelhos, exausta, enquanto minhas companheiras corriam para me abraçar. A dor no tornozelo agora era insuportável, mas o alívio e a alegria superavam qualquer outra coisa. Flávia correu para a quadra, e eu a puxei para um abraço forte, sentindo as lágrimas escorrerem.

- Conseguimos, princesa - sussurrei em seu ouvido.

- Você foi incrível, Ana - ela respondeu, sua voz embargada pela emoção.

Com a vitória nas semifinais, estávamos agora a um passo do ouro olímpico. A pressão só aumentaria, mas sabíamos que juntas, poderíamos superar qualquer obstáculo. E enquanto eu me recuperava no vestiário, com as mãos de Flávia segurando as minhas, senti uma certeza profunda: não importa o que viesse a seguir, eu estava exatamente onde deveria estar, com as pessoas que mais importavam para mim.

𝐏𝐀𝐑𝐈𝐒, ᶠˡᵃᵛⁱᵃ ˢᵃʳᵃⁱᵛᵃOnde histórias criam vida. Descubra agora