Capítulo 16. Egoísmo

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Observava de longe os dedos delicados segurarem algumas velas, escolhendo cuidadosamente qual compraria. Com uma cesta em seu braço e prendendo uma mecha de seu cabelo atrás da orelha.
Sun sorriu, vendo como Lilith, mesmo com uma personalidade séria, conseguia ter um ar “bobo” e gentil.
— Por que a demora? — Riu.
Seu rosto distraído se levantou — Oh, é que na minha casa eu costumava comprar do tipo caseiro, essas aqui não tem o mesmo aroma.
Segurou uma entre seus dedos e sentiu seu cheiro — Que tal essa?
— Jasmim? É boa até… Pitanga também é agradável.
— Qual você costumava comprar?
Inalou, revirando os itens — Huh, qualquer uma, acho que o que fazia ser bom era o carinho… Mesmo que básico, lavanda era gostosa. O capim-limão era útil também.
Sorriu — Quando você voltar podemos comprar mais delas juntos!
— É, é uma boa ideia…! — Deixou um leve sorriso escapar de seus lábios antes de falar e a terminou mostrando os dentes numa curta risada.
— E então? A mocinha já decidiu? — O atendente se aproximou.
— Canela, por favor.
— Senhorita, deixe-me pagar!
— Não precisa, garoto. Posso pagar eu mesma.
— Faço questão! — Empinou o nariz e bateu o dinheiro na mesa.
A jovem riu, posicionando os dedos sobre o canto de seus lábios e fechando os olhos. O garoto se iluminou com o som que suas cordas vocais emitiam como se iluminassem o local.
— Você é mesmo engraçado…! — Apertou sua bochecha — Obrigado.
Seu rosto corou — De nada!
Andava atrás da garota vendo seus olhos buscarem algo, fascinado com a beleza.
— E agora? O que quer comprar?
— Procurando algumas frutas para termos um lanchinho durante a viagem. Temos comida para os cavalos?
— Uhum!
— Tudo bem então, só frutas.
— Senhorita, vamos fazer o que no final da “missão”?
— Acho que vou voltar para minha casa e vocês podem morar perto de mim. Ou viajamos de tempo em tempo para visitas. Gosto dessa pergunta... Imaginar o futuro...
Sorriu — E vai continuar a ser uma assassina?
— Claro que não, pretendo comercializar algumas coisas… ter uma vida pacífica e calma. Abandonando meu título e vivendo em paz. E você?
— O que tem eu?
— O que pretende fazer no futuro?
Inalou o ar, pensativo, curvando as sobrancelhas — Eu não sei… — Ficou atordoado.
Lilith deu alguns tapinhas em seu ombro — Com o tempo você encontra um objetivo — Bagunçou as ondas laranjas do jovem confuso.

Então, rabiscava uma folha com o rosto da mulher enquanto a própria organizava suas malas para que enfim pudessem sair.
Mordiscou sua língua sentado à mesa, procurando expressar cada detalhe de sua beleza excêntrica e única.
Cada detalhe de seu corpo era como uma paisagem diferente, como um paraíso indescritível. Lábios brilhantes, braços grandes, glúteos e seios tão... Tão curvilínea e majestosa.
Seu rosto queimava a cada linha do corpo, tê-la como musa era uma gratidão eterna imensa.
Lilith saiu do quarto distraída, ocupada. Seu coração errava diversas batidas apenas de pensar na mulher com tantos detalhes de sua estrutura corporal.
— Ah! — Bob gritou. Pousado sobre uma escrivaninha e zanzando para todos os lados.
— O que foi, Bob? Também quer um desenho seu? — O pássaro voou até a mesa e observou o desenho andando por cima das folhas.
— Isso aqui é um desenho, é tipo… Um reflexo seu, só que feito a mão! — A ave continuou em silêncio — Espere, vou fazer um pra você. — Tentou, mesmo que não fosse tão bom quanto gostaria.
— Que tal? — Mostrou a arte, logo sendo bicada e rasgada. — Ah… Acho que você é meio perfeccionista, né? Faz sentido, você parece ser meio amargo.
— Lilith! — O pássaro gritou, voando até a mochila da mulher.
Se esticou na mesa com a bochecha pousada sobre a madeira — Já está sentindo falta dela…? Hum… eu também — Ergueu a cabeça — Por que sentimos tanta falta dela quando ausente? Eu sei que você gosta dela tanto quanto todos nós.
Às vezes ela é rude, não se importa como afeta os outros que ela não tem afeição. Mas às vezes ela sorri… Agradece, é gentil e se coloca em último lugar. Ela sempre se coloca em último lugar. — Ficou de pé e aos poucos se deitou na cama — Acho que entendo. Penso mais nela do que em mim…
O pássaro mordeu seu dedo.
— Também me morderia numa situação dessas. Tão… inútil, vivendo pelos outros e não por mim…
— Sun? — Colen se aproximou. — Falando sozinho, marujo?
— Oh! Perdão! Não te vi aí!
Se sentou ao lado do bardo na cama — Vivendo por quem?
Ficou vermelho — Você ouviu?!
Sorriu — Uhum.
— Ah… — Olhou para o chão — Só refletindo…
— Sobre o que? — Se aconchegou ao teu lado com o braço por seu ombro.
Deitou a cabeça sobre o peito do pirata — Todos tem um motivo para viver, sonhos pro futuro. Eu vivi por Edgar, agora por todos vocês, mas não por mim…
— Entendo… e por que não tem nenhum objetivo de vida?
— Não sei… por muito tempo não pensei sobre, achei que aparecia de repente ou algo assim. Quando me dei conta, estava vivendo para ser um objeto dos outros.
Algumas lágrimas começaram a se formar em seus olhos — Estou farto de não ser alguém. Eu me apego a pessoas, faço o que querem e elas vão embora.
Estou sempre a mercê de outros, mas nunca de mim mesmo. Sou tão idiota...
Suspirou e acariciou seu cabelo — Conheci Edgar quando ele era como você.
— Jura?! — Soluçou.
Balançou a cabeça — É. Ele estava preocupado por perceber que sua única força era cuidar de você.
— Ah… e como ele resolveu isso…?
— Ele se encontrou. Depois de um certo tempo procurando, ele finalmente encontrou o que queria.
— O que ele queria?
— Oras, não é claro? Uma família para amar — Sorriu. — Ninguém precisa ser bom em algo e transformar isso num objetivo complexo de vida. Apenas escolha um caminho confortável que te preencha.
— E se eu não conseguir me sentir assim…?
— Ninguém pode ser totalmente preenchido. Sempre vai haver algo para você sentir falta, é normal. Porém, sempre que sentir um vazio, basta olhar para trás e ver tudo o que já conquistou e se sentir grato. É clichê, mas não damos valor para o que temos quando buscamos por mais sendo que temos o suficiente.
Consegue entender?
— Acho que sim…
— Não pense que por ele estar bem com o que já tem você deve se identificar por fazer parte. Encontre o que te faça feliz, mesmo que isso signifique abandonar algo para receber outra coisa.
O garoto colocou as mãos sobre o joelho — O senhor é esperto.
— O tempo nos torna assim, as vivências nos enchem de sabedoria.
— Eu queria ser assim... Sempre sabendo das coisas, eu sou... Muito confuso. Nunca sei o que fazer ou dizer, nem o que pensar.
— Bem, o que seria do mundo sem pessoas confusas, né? O bom da nossa confusão é que mostra que somos humanos, e mais humano ainda é trabalharmos para mudar.
— Mas e seu eu não conseguir mudar?
— Você consegue, todo mundo é capaz de mudar. Não importa quanto tempo leve.
— É... — Sorriu — Você foi um jovem confuso?
— E um jovem egoísta… Tinha pessoas que me amavam, porém me enchi de fantasias e abandonei elas por algo irreal.
Quando pequeno, achava que ser pirataria era como nos livros e como sou agora, aventuras e risadas com histórias memoráveis. Piratas são seres que roubam, matam se podem e muitas vezes morrem bêbados no mar.
— Se arrepende então?
— Me arrependo de fugir da minha família, mas não de traçar um destino diferente do que me foi apresentado. Eu não queria ser como os verdadeiros piratas, queria ser como era nos meus sonhos.
Fico feliz em saber que consegui ser diferente e realizar o que desejava, mas teria feito algumas coisas diferentes.
Foi um erro meu ir atrás de mais quando tinha o suficiente, eu deveria ter esperado um pouco mais, mesmo que não me aceitassem...
Franziu o rosto — Lilith é egoísta?
— Por quê?
— Ela tem nós e mesmo assim continua procurando o irmão que tentou matá-lá.
— Não diria egoísta. Ela começou isso por ele, e ele foi tudo o que ela teve por grande parte da sua vida. Não é fácil abandonar uma vida toda por alguns meses, ela não teve a chance de se desenvolver como nós, então ela está atrás de respostas sobre quem é...
Sun deu um suspiro alto e abaixou a cabeça.
— Ela precisa de nós também, não se preocupe. Você não abandonaria seu irmão por quem mal conhece, né?
— É — Sorriu.
O homem bagunçou o cabelo do garoto — Pessoas são complexas, tá tudo bem. Ela não vai abandonar seu irmão e nem a gente, todos tem sua importância e parte do seu amor. Nenhum de nós temos amor frágil, creio eu.
E enquanto isso, sei que vai achar seu próprio caminho da melhor forma que ele for apresentado.
Ambos deram uma pequena risadinha.
— Pode me ajudar a encontrar o que quero pra mim?
— Posso, majuro! Que tal começar pela música? Você é bardo, não é?
— Mas é só porque eu precisava de dinheiro...
— Mesmo assim é bom no que faz. Não gosta de liberar essa sua timidez cantando e tocando?
Sorriu — É... Gosto...
— Então vamos tentar por esse caminho! Se não gostar, a gente acha outro. Vou te ajudar em tudo o que precisar.
Seus braços se enrolaram pelo pescoço do homem num abraço apertado e repentino — Obrigado, pai…
Seus olhos brilharam, escapando um grande sorriso genuíno, o coração acelerou e uma lágrima teimosa escorreu — Por nada…

Assassina de PandoraOnde histórias criam vida. Descubra agora