Capítulo 21

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• - - - - - - ☆- - - - - - • Judy • - - - - - - ☆- - - - - - •


Eu acordo com a sensação de que não conseguirei enfrentar o dia na escola. Em vez disso, decido focar no ensaio com meu antigo professor de piano e violino, o mesmo que me ensinou por anos, até a morte de meu irmão. Desde então, eu havia me afastado, tanto dele quanto do piano, mergulhando apenas no violino.

O professor, um homem experiente e sempre atento, logo percebe a minha tensão enquanto toco. Ele me interrompe no meio de uma peça e me observa por um momento, com a cabeça inclinada de leve.

— Judy, você está tensa — ele comenta com um tom gentil, mas firme. — A música precisa fluir, sem essa barreira que você está criando.

Eu desvio o olhar, com os dedos ainda descansando nas cordas do violino, sabendo que ele está certo, mas incapaz de deixar os pensamentos me acalmarem.

— Estou bem, só... distraída, eu acho — respondi, sabendo que não era uma explicação completa.

O professor suspira e se aproxima, sentando-se ao meu lado no banco do piano.

— Eu também já fui assim — ele começa — A música exige mais do que técnica. Ela precisa vir do lugar onde seus sentimentos estão, sem medo de enfrentar o que está dentro de você. O que está te segurando, Judy?

Eu não consigo responder. Em vez disso, sinto um nó se formando em minha garganta. E então, como se adivinhasse o que mais está me afetando, o professor continua.

— Eu gostaria de te ver voltando ao piano.

Essas palavras caem sobre mim como um peso insuportável. O piano era... era algo que eu não conseguia mais tocar. Era como se cada tecla estivesse cheia de lembranças, e só de pensar nisso, meu peito apertava.

— Não — digo, hesitante, mas firme. — Eu não posso voltar a tocar.

O professor olha para mim como se lamentasse a cada sílaba da minha resposta. 

— Judy, você nasceu para o piano. O violino é maravilhoso,  e você é ótima no violoncelo também, mas o piano... é quase uma extensão de você.

Essas palavras, em vez de me motivar, só me sufocam ainda mais. A insistência dele, a pressão... era demais. Eu me levanto, interrompendo o ensaio.

— Eu... preciso ir. Desculpe.

Sem esperar resposta, recolho minhas coisas e saio do estúdio, sentindo as emoções borbulharem por dentro. Eu não volto para casa, como deveria. Em vez disso, sigo em direção ao lago, o único lugar onde posso ouvir o silêncio, onde posso me afastar de tudo e todos.

Quando chego ao lago, o vento suave balança as árvores ao meu redor, e o reflexo do céu no espelho d'água é calmo, sereno. Eu me sento no píer, abraçando os joelhos, e deixo os pensamentos fluírem.

Jaxon invade minha mente, claro. O beijo no lago, a maneira como ele se afastou... e o quanto aquilo me confundiu. Eu pensava nele mais do que gostaria de admitir, e não sabia como lidar com isso. Mas não era só ele. Era tudo. O violino, o piano, as expectativas. Meu irmão. Sinto falta dele. 

O lago, que sempre foi um refúgio, agora parecia uma prisão. Eu não conseguia encontrar respostas para nada. Apenas o silêncio ao redor, e as lembranças que não me deixavam escapar.

Eu fecho os olhos, deixando uma lágrima solitária escorrer. Será que algum dia  eu conseguiria entender o que estava acontecendo dentro de mim?

Eu chego em casa quando o sol já se escondeu, o céu pintado de tons escuros com as últimas faixas de laranja desaparecendo no horizonte. Quando estou prestes a entrar, vejo Jaxon saindo com sua moto. Meu coração se acelera na mesma hora, como se estivesse pedindo que eu corresse até ele, que gritasse para ele parar. Mas eu não faço nada. Apenas fico parada, o ignorando como se ele não fosse mais nada para mim. Eu não sei se é orgulho, ou se é medo de estar certa sobre ele... de que ele percebeu que eu não sou o tipo de garota que ele quer.

Entro em casa e subo direto para o meu quarto. Aquele sentimento de vazio não me abandona. Vou até a janela, minha cabeça cheia de perguntas. Será que ele me viu? Será que ele pensou em mim, assim como estou pensando nele agora? Eu queria odiá-lo, queria não sentir nada, mas é impossível. Eu me encosto na janela e, mais uma vez, olho para a janela dele. As luzes estão apagadas. Ele já foi, já desapareceu, e eu continuo aqui, presa a esses sentimentos confusos.

Minutos depois, ouço um leve barulho na janela. Sei o que é antes mesmo de olhar. Maxie. Ela entra no meu quarto com a energia de sempre, como se o mundo lá fora não a afetasse de jeito nenhum.

— Judy, o que houve? — ela pergunta, já se jogando na minha cama. — Você faltou a aula. Estava ensaiando?

— Mais ou menos — respondo, sem vontade de entrar em detalhes.

Maxie me encara por um segundo, mas logo muda o foco.

— Eu vi o Jaxon hoje, sabia? — ela começa, como se fosse uma fofoca qualquer. — E quer saber o melhor? Ele foi até a sala de música... te procurando. Ele ficou andando de um lado para o outro, meio perdido.

Meu coração dá um salto, mas eu tento não demonstrar. Ele me procurou? Por quê?

— Ele parecia um idiota, sério — Maxie continua, vendo que eu não reajo. — E eu disse a ele que, claro, ele tinha magoado você.

Paro o que estou fazendo e olho para ela, brava.

— Maxie, por que você disse isso? — minha voz sai mais alta do que eu planejava. — Você não devia ter falado nada! Isso não é da sua conta!

Maxie me olha, surpresa pela minha reação, mas logo sua expressão muda, ficando irritada.

— Não é da minha conta? — ela repete. — Eu só estou tentando te proteger! O Jaxon é só outro cara qualquer, Judy! Um cara que claramente não sabe o que quer. Você merece muito mais do que isso! Esquece ele antes que se machuque mais.

Eu fico em silêncio, minhas emoções se misturando. Será que ela está certa? Será que eu estou exagerando? Será que ele é só um cara que vai me magoar?

Eu quero gritar, quero negar que ele me machucou, mas lá no fundo, eu sei que Maxie tem razão. Ele me feriu. Eu não sei o que esperar de Jaxon, e essa incerteza está me destruindo. Mas, ao mesmo tempo, a ideia de esquecê-lo... de simplesmente fingir que ele não significa nada para mim... parece impossível.

— Talvez você esteja certa, Maxie — eu finalmente admito, minha voz mais baixa. — Mas eu não posso simplesmente desligar o que sinto.

— O que pensa em fazer? — questiona, se virando para mim. 

— Queria eu saber responder isso, mas não faço a menor ideia. De todo modo, vou focar nos ensaios e no festival, e quem sabe, esse é o momento de esquecer o que aconteceu. 

— Eu odiei o que ele fez com você, mas confesso que vê-lo hoje, meio perdido, procurando você na sala de música, me deu um pouco de pena. Ele está meio patético até. 

Eu a encaro, tentando assimilar aquelas palavras. É patético ele me procurar depois do que fez? Ou é patético só o fato de ele me procurar? Decidi que era melhor não descobrir a resposta. 

— Talvez ele quisesse se desculpar... ou se explicar. — digo, desviando o olhar, para não ver a expressão de Maxie. 

— Seja o que for, ele não merece ser desculpado, Judy. 

— Maxie, a gente não sabe o que aconteceu, não sabe dos motivos dele. 

— Não tente defendê-lo. 

— Não estou defendendo. Só estou dizendo que... podemos estar precipitando. 

Maxie me encara, com aquela expressão de quem discorda de cada palavra do que eu disse.

— Precipitado foi ele te beijar. Isso que foi precipitado! Foi seu primeiro beijo, Judy. Ele ao menos sabe disso? 

Balancei a cabeça, em um claro não silencioso. Maxie suspira. Ela percebe que o assunto está me sufocando e muda de repertório. O assunto Jaxon vai para a pasta dos assuntos proibidos, como costumamos fazer quando algo nos incomoda. E aquele assunto me incomodava. 


O Amor é feito de EstrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora