Novo México, 1954
Zayn Malik, Zayn Malik, as rodas do trem pareciam sussurrar nos trilhos. Zayn Malik, Zayn Malik...
Quando o apito soou, Lauren despertou em um sobressalto. Vivenciou um instante de confusão — onde estava? -, porém, logo se lembrou, mudando desconfortavelmente de posição e olhando para fora da janela.
Deserto. Até onde a vista alcançava.
Já havia passado por ali antes, há quase dois anos e meio, mas a Lauren Jauregui que agora se encaminhava do Texas para Albuquerque era muito diferente da assustada de catorze anos que subiu no ônibus errado. Aquela garotinha magricela não fazia a mínima idéia de para onde estava indo. Mas a Lauren de dezesseis anos, a mulher que já tinha vivido uma vida inteira, sabia exatamente o seu destino.
Certificar-se que, um dia, Zayn Malik pagasse pelo seu crime.
Quando uma onda de dor a acometeu, ela agarrou a barriga e prendeu a respiração. Quando a sensação abrandou, Lauren olhou para o relógio. Só fazia duas horas desde que tomara o último remédio. E não parecia ter surtido efeito algum. A dor vinha piorando. E também, ela notou, alarmada o sangramento.
Olhando de relance para os demais passageiros do vagão — ainda bem que boa parte cochilava em seus lugares —, levantou-se e cuidadosamente seguiu para o banheiro no fim do corredor. Ali, seu alarme se transformou em horror quando viu a quantidade de sangue que perdia. Estava tendo uma hemorragia. Em pânico, consultou o relógio mais uma vez. O trem chegaria a Albuquerque em menos de uma hora. Ela desceria do trem e procuraria uma farmácia. E depois tentaria encontrar a mãe.
Aquele foi o primeiro plano que fez ao deixar San Antonio: encontrar a mãe. Mesmo sabendo que os pais tinham deixado aquele estacionamento de trailers há dois anos, Lauren suspeitava que eles estivessem em algum lugar por perto. Quando seu pai levantava levantava acampamento e se mudava, nunca ia muito longe, parava na próxima cidadezinha que tivesse um bar. Lauren tinha esperanças de que eles ainda estivessem no Novo México. Sua mãe tomaria dela.
A não ser por isso, os planos de Lauren eram vagos, o único específico era um longo prazo. Zayn Malik...
Depois de engolir outro comprimido de morfina, retornou ao seu lugar e se deixou cair. Os comprimidos eram de Demetria, que um dia também se submetera a um aborto. Demetria...
Lauren fechou os olhos e visualizou o belo rosto da amiga. Na manhã anterior, Lauren havia despertado em sua cama encontrando-a a fitá-la com os grandes olhos castanhos carregados de tristeza.
— Sinto muito, amiga, mas Hazel me mandou subir para avisá-la que deve empacotar as suas coisas. Ela disse que você tem de ir embora. Aqui está o seu salário. — disse a mexicana.
Ainda na névoa da sua provação da noite anterior, Lauren não estava entendendo muito bem.
— Para onde... — sussurrou, fraca demais para falar. -Vou para onde?
— Isso é com você, amiga. Você tem de sair daqui. De outro modo, ela diz que vai chutá-la para fora. E é o que ela vai fazer. Já a vi fazer isso antes.
Então a névoa começou a se dissipar.
— Quer dizer que Hazel está me expulsando?
Lágrimas reluziram nos olhos de Demetria.
— Ela diz que não quer criadoras de caso em seu estabelecimento.
Contudo, Lauren sabia por que Hazel a expulsava. Zayn deve ter lhe dito para fazer isso.
Belle e Demetria ajudaram-na a juntar seus pertences com lágrimas rolando pelo rosto. Deram-lhe o tanto de dinheiro que podiam e depois a acompanharam de ônibus até a estação de trem, onde se abraçam e choraram juntas.
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Scorpion
Chick-LitUm rosto. Um nome. Um caminho. E apenas uma pergunta: O passado só nos deixa quando nós o deixamos?