Minha noite começa como nenhuma outra

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Minha mãe não para de falar sobre sua ida à casa do vovô. De como matou sua saudade das conversas sem graça do velho babão. Mamãe esquece até de seu cigarro quando tem algo para contar. Esquece principalmente até de cozinhar. Era o tipo de coisa que mais odiava em casa, porque fico sem comer algo que me faça ficar satisfeito. Só tem comida enlatada. Sopa, milho verde, ervilha, almôndegas, e salsichas. Refeições em latas fazem bem para saúde, para não dizer ao contrário. Tento me destrair ouvindo musica no celular enquanto procuro algo decente para comer. Batatas fritas? Melhor não. Bolinhas de queijo? Também não. Biscoito de chocolate, rosquinhas de chocolate, bolo de chocolate. Perfeito. Vou acabar morrendo diabético, mas vai ler a pena. Chocolate é vida, assim como o oxigênio. Despejo tudo em uma travessa e subo para meu quarto, deixando minha mãe na cozinha com seus cigarros.

São exatamente três horas. Minha tarde continua incrivelmente chata como todas as tardes em que fico em casa. Acho que ser filho único não é tão legal como dizem. Procuro alguns vídeos de sexo Gay na internet para passar meu tempo me masturbando, mas perco a vontade quando lembro do sonho que tive noite passada. Sou o tipo preferido da morte. Não sei se devo dar tanta importância para o que sonhei. Vivo me cortando, mas não acho que vou morrer desse jeito, sem sangue nos pulsos. "O ser humano que vive se mutilando tem a alma negra". Disse um rapaz da igreja que minha mãe frequentava. Não acho isso, porque se alguém se corta não quer dizer que está oferecendo sua alma ao demônio. Eles viam os cortes mas não entendiam. Simplesmente julgavam como se tivessem direito para fazer isso.

Cinco e vinte da tarde. A campainha toca. E para minha surpresa, eles estavam bem alí na minha frente. July, Cody, Nick, e Luna. Todos com sacolas cheias de besteiras como se estivessem planejando uma festa na minha casa. Festa. Foi o que pensei. Tô ferrado.

- vocês são loucos? Minha mãe vai me matar se a gente fizer bagunça aqui em casa.
- deixa de ser dramático Isaac - disse Nick, entrando e se sentando no sofá - nós não vamos fazer bagunça. Não muita.
- relaxa amor - disse July beijando-me na boca.
- o quê? Oi? Perdi alguma coisa esses dias? Vocês... Estão juntos? - disparou Nick boquiaberto.
- sim. Por um certo tempo - afirmou July com seu jeito louco de ser - cadê minha sogrinha?

Mamãe ouviu todo o barulho. Começou com seus gritos, mas ao ver July ao meu lado me abraçando, seus gritos estéricos se transformaram em "Querida July? não sabia que você viria hoje. Isaac não me contou". Cody prende a risada que estava prestes a soltar. Nick permanece calado no sofá. Luna, com seu jeito meigo de ser se apresenta para minha mãe, ganhando sua confiança. Um sorriso quer dizer que minha mãe não gostou da pessoa. Um sorriso e simples "oi" quer dizer que ela gostou sem precisar conhecer. O que faço com Nick sentado no sofá da minha mãe pronto para ser fuzilado com olhares assustadores? Olhares que diziam: "o que esse garoto faz aqui na minha casa? Não gosto dele. Péssima influência para meu Isaac". Mas July estava comigo, então mamãe não ousaria desrespeitar Nick em sua frente.

- podemos dar uma pequena festa em cinco no seu jardim? - pergunta July.
- festa? No meu jardim? - o silêncio toma conta da sala. Não terá festa. Apenas gritos da minha mãe expulsando todos de casa, até que... - mas é claro que pode. Com tanto que arrumem tudo antes de irem embora - fico boquiaberto com a reação controlada de mamãe.

Bebemos, comemos, dançamos, gritamos, rimos, conversamos, e bebemos novamente. O cheiro forte de álcool na camiseta branca de Cody deixava-me com ânsia de vômito. As altas risadas de Nick e July afastava a dor da minha mente. E Luna, sempre doce e feliz com o que passa com esses loucos, observava isso tudo como se o amanhã não viesse. Um olhar feliz e triste ao mesmo tempo. Diferente de seu irmão. Cody Lee. Que não para de beber nem por um segundo. E com tudo isso aqui em casa, minha tarde se trasnforma em uma noite divertida como nenhuma outra.

IsaacOnde histórias criam vida. Descubra agora