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- Oi Matheus. To indo e você? Então, eu liguei justamente por isso. Desculpa te incomodar no domingo, mas será que tudo bem se eu tirar aquela semana de folga que você tinha me prometido agora essa semana? Não to me sentindo bem hoje, acho que eu ia precisar faltar amanhã de qualquer jeito, daí me cuido... Tranquilo, meu computador tá aqui. Se tiver algo urgentão, me avisa... Tá com conteúdo adiantado pra próxima semana, e já tá aprovado com o cliente, então acho que nem vai precisar... Isso.... Também. Beleza, Matheus, valeuzão mesmo, viu? Obrigada, acho que passa logo. Beijo, bom domingo.

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Parte dela dizia, como sempre, "que exagero". Que levantar da cama não é ciência de foguete. Que viver o dia-a-dia não é um desafio. Ela só precisava levantar. Mas as pernas de Julia nem se mexiam debaixo das cobertas. Ela não conseguia tirar forças de nenhum centímetro quadrado do corpo. Queria se decompor bem ali.

Ela conseguiu voz suficiente pra fazer a ligação que ia garantir a paz que ela precisava para os próximos dias. Agora não precisava falar por uma semana, nem encarar o mundo. Ela sabia que tudo que tinha pra fazer no trabalho estava feito e que seria uma semana tranquila, mas parte dela tremia de medo. Aquela promoção que ela ganhara há pouco mais de quatro meses não era merecida, isso era fato. Ela não sabia como tinha conseguido enganar todo mundo à sua volta a acreditar que ela era qualificada. Ela mal sabia como tinha emprego, pra começo de conversa.

E se uma semana fora fizesse seu chefe repensar? E se ele percebesse o erro que cometera ao entregar um emprego de adulto pra uma menina de 26 anos? Porque ela não passava disso: uma menina fingindo ser uma adulta. Uma menininha assustada dentro do corpo de uma adulta, fingindo que sabia o que estava fazendo, que sabia cuidar de uma casa, que sabia fazer uns textos. Queria correr pra casa da mãe, mas sabia que se ela soubesse o que estava passando agora, de novo, ia ficar mal, e não valia a pena o desgaste. Ia reunir coragem no caso dela ligar pra responder normalmente, e ia ser isso aí mesmo.

E em algum momento, ela ia precisar sair daquelas cobertas e comer alguma coisa. Não podia decompor. Nada passava pela garganta, mas ela sabia que se não comesse, podia passar mal, e daí ia ser todo um rolo. Ela só precisava ficar em paz um pouco. Não precisava de polícia invadindo porta porque a menina desapareceu e bibibi. Vamos ter calma aqui.

Pensou em ligar pra Nanda. Ela sabia o que começava isso, e sempre sabia como tirá-la de lá. Mas daí isso queria dizer que Nanda ia sair de onde estivesse e ir até lá, ela sabia. Já tinha feito isso antes, sem Julia nem pedir. A única diferença era que da outra vez, ela trocava turnos com Diego. Foda-se o Diego agora, seja lá onde ele estiver. Ele a abandonou. E jogou na cara. "Eu cuidei de você". Que se foda ele, grandão.

Luca. Tinha certeza que se Luca soubesse, ele estaria ali, tentando fazer ela rir. Convencendo-a que tomar banho é necessário todo dia, assim como comer, levantar, existir. Foda-se o Luca. Ele tem uma vida só dele, que não tem nada a ver com ela. Era bom demais pra ser verdade, ela sabia desde o começo. Um cara daqueles, nunca ia gostar dela. "Eu vou criar bolas o suficiente pra ser o homem que você merece", ele disse. Da boca pra fora, com toda a certeza. Ele era perfeito, se não fosse o fato de que ama outra pessoa.

Essa caceta dessa menina, Cecilia. Nem conhecia, já odiava por tudo que Luca contou. Quando você é dessas de tomar dores, consegue odiar meio mundo pelos outros. Mas sabe, se o Luca gosta dela, só pode ser a pessoa mais incrível da Terra.

Ela começou a respirar rápido demais. Tirou a coberta do rosto pra aliviar. Quando se acalmou o suficiente, voltou para o seu casulo. Ela podia acabar com tudo dessa vez, parar de pensar. Mas estava cansada demais pra isso. Não queria complicações, não queria pensar no que ia causar à sua volta. Só queria ficar quieta, em paz.

How To Fight LonelinessOnde histórias criam vida. Descubra agora