Capítulo 34

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Nina Novaes.

Permanecemos em silêncio durante todo o almoço. Quer dizer, não literalmente em silêncio, porque ora ou outra Alex fazia um comentário desnecessário, como a movimentação da ala de emergência ou o prato do dia do restaurante – coisa que ele nunca foi de comentar. Percebi que estava só tentando me manter distraída, porque sabia que eu ainda estava pensando no ocorrido em sua sala.

Tudo isso me levou a pensar no meu primeiro dia no hospital, quando Alex me disse que no futuro eu teria ótimas oportunidades como cirurgiã e que, assim como ele, não deveria recusá-las jamais. E ele acabara de recusar uma por mim. Não apenas uma, mas talvez a melhor que poderia receber em sua vida. Trabalhar em um hospital na Califórnia e receber, sei lá, cinco vezes mais do que recebe aqui no Brasil? Isso sem falar no reconhecimento.

Quando por fim acabamos de comer, ainda estou com a pior das caras, porque Alex para por um segundo e segura a minha mão sobre a mesa.

– Ainda está pensando naquilo?

– Como não pensaria?

– Não sei porque está tão preocupada, anjo. Eu não vou a lugar nenhum. Vou ficar com você.

– Esse é o problema.

Ele franze a testa e me lança um olhar confuso.

– Você quer que eu vá?

Fico por um instante em silêncio e depois inspiro pesadamente.

– Não, mas eu...

– Enquanto a resposta for não, continuarei aqui.

– O que você disse para o doutor americano? George, né?

Ele desvia o olhar por um segundo, depois volta a me encarar.

– Eu disse que não iria.

– Alex...

– O quê?

– Ele não insistiu nem nada?

– Um pouco. Me deu até domingo que vem para responder.

Conto mentalmente quantos dias teria que remoer isso ainda. 12 dias.

– Isso tudo?

– Sim. Mas eu disse que não seria necessário – ele diz e dá uma breve olhada no relógio em seu pulso. – Vamos? Marcamos cirurgias quase para o mesmo horário – ele comenta e ri, mas eu só dou um sorriso amarelo e me levanto com ele.

Ah, que droga... Mas, bem, eu precisava esquecer disso e me concentrar na minha cirurgia, porque mesmo que eu já estivesse acostumada a ir para uma cirurgia sem Alex, sentia um frio na barriga enorme só de pensar em cometer alguma besteira e ter que bipar enlouquecidamente para ele. Era hora de colocar o meu lado extremamente profissional em ação e esquecer que o meu namorado está abrindo mão de seus sonhos por mim.

(...)

São oito horas quando olho para o relógio na parede da sala. Estava com o pensamento meio longe, deitada no sofá, ouvindo o som do chuveiro no cômodo ao lado e me recriminando por ter recusado o convite de Alex de ir para o banho com ele. Ele sabe que estou meio borocoxô por causa dessa história toda, por isso não insistiu e disse que voltaria logo para fazermos coisas de "casal fofinho", como ele mesmo disse.

Puxo o cobertor mais para cima e me encolho. Ainda não tinha contado a história pra ninguém e não sabia como faria isso, embora entendesse que era extremamente necessário, pois eu precisava de opiniões. Vejo o meu celular encostado no outro canto do sofá (junto ao de Alex) e o trago até mim. Penso em ligar para a minha mãe, porque ela é minha melhor opção no momento. Sofia e Marcelo com certeza diriam coisas como "você não é louca de me abandonar", partiriam para chantagens emocionais e, se não desse certo, ameaças. Eles eram bons nisso.

Anjo (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora