BÔNUS RICO

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SEM REVISÃO 


RICO

Sobre "A" conversa com minha ruiva. Eu queria tanto que ela acontecesse... mas tive muito medo.

Sim, medo.

Medo de perder a cabeça se soubesse que alguém a havia ferido; medo de que ela abandonasse nossa família; medo que ela tivesse uma doença rara e incurável; medo de que ela não conseguisse ser sincera; medo que ela não aceitasse se tratar; medo de perdê-la... muito medo.

Dessa vez, não imaginei que essa porra toda pudesse me fazer sentir menos macho. Nada disso me fez menos homem, muito pelo contrário. Só um homem, com todas as letras, consegue admitir isso, mesmo que apenas para si mesmo. Em nenhum momento eu tive medo de estar ao lado dela e isso não vai mudar.

Não consegui ser apenas ouvinte. Eu queria saber tudo. Precisava saber exatamente qual seria o meu papel de marido. Não vou falhar de novo. Não vou mais dar esse espaço. Não vou mais dar tempo para o que parece não ter tempo. Não vou ser uma porra de um frouxo; se as rédeas têm que ser tomadas, eu as tomarei.

E a merda era muito mais fedida e mais foda que poderia imaginar.

Ouvir a palavra transtorno fez minha cabeça trabalhar rápido. Precisava entender o tipo de distúrbio, aprender os termos e traças minhas metas. Queria gravar a conversa na cabeça. Não posso perder nenhum detalhe.

Como fui burro. Como fui inocente. Como pude não perceber que tinha algo muito errado?

Eu achava normal ela querer me beijar com sabor de morango, eu achava normal ela ter seus momentos de privacidade no banheiro, eu achava normal ela pular as refeições, fingir que comia quando saíamos... fingir que comia quando estávamos em casa. Ela sempre conversava e me mimava mais que comia... isso quando não me seduzia e deixava as refeições para trás. Ela sempre comeu pouco e eu nunca achei que isso fosse um problema. Eu não atentei aos detalhes, que não eram tão detalhes assim. Eu percebi que ela estava cada vez mais magra, eu ouvi dizerem que estava cada vez mais magra e fui negligente, cego e inconsequente. Eu inventei desculpas, eu olhei para o meu próprio umbigo, problemas e neuras. Olha onde precisamos parar para que eu percebesse o que estava na minha cara todo esse tempo? Nunca me senti tão mesquinho e egoísta.

A porrada que veio logo a seguir foi a desestrutura familiar dela. Que tipo de pais fazem isso com uma criança? Na realidade, para mim, esse tipo de gente nunca poderá ter esse nome. Pais... sempre tive, sempre pude contar com eles, sempre fizeram o impossível para nós, sem nos mimarem. Não faltaram amor e compreensão. Minha mãe foi mãe com todas as letras e meu pai sempre foi presente, à maneira dele. Nós tivemos uma figura paterna, sempre pudemos contar com nosso pai... e ela não. Ele, que prefiro nem saber o nome, não estava lá com ela ou por ela.

Nem a mãe, louca, desequilibrada, do tipo que além de não ajudar... prejudicou, não cuidou. Que ditadura da beleza é essa? Que perfeição é essa que mata a saúde? Que loucura é essa que impõe doença e magreza excessiva como padrão? Que tipo de mãe rouba a vida e a saúde da filha dessa maneira? E esse pai? Viver para trabalhar, alheio, alienado, confortavelmente distante ou todas as opções juntas... Uma espécie de cegueira seletiva?

E depois? Depois comprou a própria "liberdade". Jogou a filha em um manicômio e, após meses no inferno, a lançou, sem preparo algum, para o mundo. Isso é fechar com chave de ouro. Isso foi pra acabar de acabar com o emocional dela.

Deus! Como Alice deve ter sofrido! É inimaginável. É inaceitável. Felizmente ela foi forte, determinada e sobreviveu, mesmo com tantas sequelas.

Sempre ao seu lado (Livro 2 : Série Transformados pelo Amor) #wattys2016Onde histórias criam vida. Descubra agora