A companhia de André Luiz era extremamente agradável e, enquanto efetuávamos, ciceroneados por ele, um pequeno tour por "Nosso Lar", íamos conversando:
— Dr. Inácio — perguntou-me —, nunca esteve antes em nossa cidade?
— Não, André, a vontade sempre foi muita, mas confesso-lhe que nem em estado de desdobramento... De modo geral, as minhas atividades me prendiam o espírito ao Sanatório; mesmo quando saía do corpo, eu permanecia na região, sem conseguir ausentar-me da esfera das minhas preocupações imediatas...
E disse-lhe, envergonhado:
— Li o seu livro, que se converteu em best seller, uma única vez e não tive oportunidade de ler, detalhadamente, os demais que lhe constituem a famosa série; desculpe-me, mas, para ler, como a maioria dos espíritas, eu sempre fui um tanto preguiçoso... Odilon, sim, era um assíduo leitor, pois, sempre que eu o encontrava, estava de livro nas mãos e tinha o hábito de ler caminhando...
— Nós já o visitamos no Sanatório, em Uberaba, Doutor — revelou-me André com simplicidade —; por duas ou três vezes, na companhia do Dr. Bezerra, lá estivemos apreciando o seu trabalho... Quando a oportunidade nos ensejava, antes ou após as tarefas desenvolvidas na "Comunhão Espírita-Cristã", passávamos por lá, conduzindo companheiros interessados no estudo da obsessão; aliás, visitávamos atividades semelhantes em toda a região do Triângulo Mineiro e de outros Estados; nem sempre podíamos ir juntos, mas nos dividíamos em diversas equipes, sob a coordenação do Dr. Bezerra de Menezes e Eurípedes Barsanulfo... Certa vez, participei de uma reunião dirigida por você com a médium Maria Modesto Cravo, e admirei o entrosamento de ambos no trabalho mediúnico; raros grupos, à época, conseguiam resultados tão satisfatórios...
— Bons tempos aqueles, André! — comentei, pesaroso.
- Os de hoje são melhores, Doutor — confortou-me o amigo, solicitando, com o olhar, a aprovação de Odilon.
- Desculpe-me perguntar — falei, aproveitando a chance —, mas você não sente certa saudade do trabalho que desenvolveu ao lado do nosso Chico, desde Pedro Leopoldo?... De anônimo seareiro na Vida Espiritual, você se tornou conhecido em todo o Brasil; inúmeras de suas obras foram traduzidas para outros idiomas e o seu pseudônimo se encontra inscrito na fachada de várias instituições espíritas...
Sem receio algum de mostrar-se emocionado, o interpelado respondeu-me:
— Estou me sentindo como quem houvesse desencarnado uma segunda vez, sem que sequer tivesse novamente reencarnado...
— Os nossos irmãos do mundo não acreditarão nestas palavras...
— Muitos nos consideram aquilo que não somos, ou seja, espíritos já completamente libertos de toda e qualquer emoção humana... Nós, os mortos, também sentimos saudades da Terra!... Os que fazíamos parte da equipe dirigida pelo venerável Emmanuel, em tarefa regular junto ao médium Xavier, estamos com várias reuniões programadas com o nosso Dr. Bezerra.
Careceremos de definir rumos e... cuidar da vida, que não cessa... Quanto a mim, digo-lhe que não esperava que a responsabilidade crescesse tanto, contudo, conforme lhe disse, uma nova experiência no corpo me espera...
- E conseguirá, ao reencarnar, esquecer o que foi e o que representa para o Movimento Espírita?
— Odilon — retrucou sorrindo o Benfeitor—, o nosso Dr. Inácio vai fundo nas questões...
— Você ainda não viu nada! — comentou o confrade, deixando-me ruborizado.
— Desculpe-me o atrevimento, mas é o que eu, se ainda estivesse encarnado, gostaria de saber — expliquei-me.
— E com justa razão, Doutor; estou apenas admirando o seu modo transparente de colocar as coisas... Isto talvez seja uma virtude também rara por aqui, depois da morte. Mas, respondendo-lhe, digo-lhe que é preciso que eu esqueça, assim como não mais me lembro de que, um dia, fui Carlos Chagas, haverei de me esquecer de que sou André Luiz...
- Você não era Osvaldo Cruz?... — indaguei sem vacilar.
Não!...
- E por qual motivo não se identificou desde o início?
— A obra do médium Xavier não necessitava do meu nome para lhe conferir credibilidade e, depois, precisávamos evitar maiores problemas para a Doutrina...
— Está se referindo ao caso envolvendo a família do escritor Humberto de Campos?
— A ele e ao estardalhaço que a imprensa leiga haveria de promover; se o próprio Emmanuel constitui pseudônimo, porque eu não poderia ter feito o mesmo?... E Frederico Figner, porventura, não adotou o pseudônimo Irmão Jacó, em tributo à sua origem judaica?
Quando me preparava para continuar entrevistando a respeitável entidade, cuja importância do trabalho mediúnico de parceria com Chico permanece inédita para a maioria dos adeptos do Espiritismo, Odilon chamou-me a atenção para a belíssima paisagem à frente:
- Veja, Inácio, como é exuberante a Natureza em "Nosso Lar"!...
— Este é o famoso "Bosque das Águas" — esclareceu André Luiz. — Hoje, evidentemente, como quase tudo aqui em "Nosso Lar", se modernizou. Apenas os casais de namorados que passeiam por ele, trocando juras de amor e traçando planos de futuro reencontro na Terra, não se alteraram em seus propósitos; aqui continua sendo o lugar preferido dos que pretendem um relacionamento afetivo mais espiritualizado...
O veículo, que era conduzido por André, obedecendo-lhe ao comando mental, pousou suavemente sobre a relva, próximo a uma cascata que jorrava entre pedras dispostas em formato de coração. Para mim, eram tantas as novidades e surpresas, que eu me esquecera de reparar naquele aérobus em miniatura que nos transportara, sobrevoando o espaço aéreo da cidade...
Notando o meu interesse ao examinar o veículo, o devotado irmão esclareceu:
- À época em que escrevi "Nosso Lar", o aérocar ainda estava em fase de experimentos; ele é constituído de matéria sutilíssima, intermediária entre o vidro e o plástico, extremamente leve, porém ultra-resistente a impactos...
— A impactos? — indaguei, curioso.
- Sim, por vezes, o trânsito aéreo por aqui também fica complicado...
— Qual é o combustível que o faz movimentar-se?
— Energia solar, e o índice de poluição é zero...
— E o custo também?
É claro!...
Convidando-nos a caminhar nas proximidades, André nos informou que o "Bosque" havia se transformado no cartão postal da cidade.
- Outras colônias espirituais têm procurado copiar o nosso paisagismo, no entanto, certas espécies de árvores e de flores só se desenvolvem aqui: as sementes que elas produzem — ainda não se sabe por quê — não vingam em outras regiões. Neste sentido, diversas experiências já foram realizadas em vão; acredita-se que o magnetismo do solo lhes seja particularmente propício...
— Chove em "Nosso Lar"? — quis saber, inteirando-me dos detalhes possíveis.
- Como não! — respondeu André incisivo. —Em seu estado gasoso, que para nós é líquido, é que a água existe por aqui; não temos aquelas tempestades que provocam enchentes devastadoras, mas, na estação oportuna, cai uma espécie de garoa que, sendo chuva muito fina, fertiliza o solo, aumenta o volume dos riachos e dos rios, saneia a atmosfera... Não se esqueça, Dr. Inácio, de que "Nosso Lar" e uma colônia situada próxima à Crosta e muitos dos fenômenos atmosféricos que atingem o Planeta, de forma mais atenuada, passam igualmente por nós... Apenas acima, na região fronteiriça a Dimensões pertencentes a outros orbes planetários do Sistema, é que o clima muda as suas características...
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Na Proxima Dimensão
روحانياتO Mundo Espiritual é constituído de múltiplas dimensões... Como será a Vida em uma delas? O Dr. Inácio Ferreira, que, em seus dois livros anteriores - "Sob as Cinzas do Tempo" e "Do Outro Lado do Espelho" -, nos conduziu pelas sombrias veredas do Pl...