Capítulo 16

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O sol raia numa bela manhã. Enquanto seus raios surgem, atrás dos morros que fazem do Boaçú um vale, as ruas mostram sua nova cor: Vermelho, deixado pela noite sanguinária e o caos imposto pela tomada dos pontos de drogas. Corpos largados em várias ruas deixam a população com medo, e perplexa.

No campo de dona Lourdes, há quatro corpos espalhados: Um com um buraco na cabeça que dava para ver do outro lado. Os miolos espalhados e grudados no chão de barro. Uma poça enorme de sangue. Os outros três também deformados de certa forma, ossos quebrados expostos, buracos espalhados pelo peito e barriga. Uma carnificina. A população com muito medo, mas também muito curiosa, cerca os corpos e surgem todos aqueles comentários. "Mataram fulano de tal", "coitado dele, era trabalhador", etc. O mesmo acontece em mais duas ruas do Boaçú. No Buraco da Cobra os corpos foram queimados. Os moradores ligam para a polícia avisando sobre os crimes. Depois de horas de exposição ao tempo, aparece um carro de polícia. Ele verifica toda situação, vai ver todas as ruas. Passa o rádio para a central, e depois de mais algumas horas aparecem mais carros da polícia, e o corpo de bombeiros para retirada dos corpos, e aí sim, a população tem uma sensação de normalidade novamente. É só uma sensação, pois todos sabem que o tráfico de drogas continuará, e apenas se espera que não seja mais violento que o comando anterior. A maior violência é achar isso normal. É pensar que não tem solução, que você tropeçar em cadáveres ao amanhecer, na hora de ir para o trabalho, é algo comum. Na maioria das vezes, esses corpos são de pessoas do próprio lugar, que cresceu e brincou com os próprios moradores. Frequentou a mesma escola. Mas por um fator desconhecido, declinou para o tráfico de drogas. João e seus amigos ficaram a noite toda acordados. Eles queriam notícias sobre a ação da polícia. Saber se iam precisar mudar de local, ou qualquer outra ação. Talvez o que eles fizeram motivariam outros grupos a fazer o mesmo com eles. Não podia dar mole. Então, só tem uma maneira. Todos ficam acordados até último comando.

As coisas se acalmaram. O bafafá do que havia ocorrido era pouco. Então foi marcada uma festa para comemorar o início do comando de João. Vai rolar um funk comunitário no sábado, e também foi chamado um pagodeiro de nome. Os preparativos estavam sendo feitos. João entra em contato com o comando do Rio para se abastecer. Tem que ter muita droga. Aliás, o primeiro grande evento tem que ser lucrativo. A notícia voou. Todos os maconheiros e xinxeiros da região estavam sabendo da notícia. Até ônibus foi fretado para trazer pessoas do Rio. A noite de festa promete. Foi montando uma estrutura de som fora do normal. As caixas de som chegavam a quase três metros de altura. Foram feitas gambiarras com lâmpadas espaçadas de dois em dois metros, e esticadas nas bordas do campo. A cantina do campo foi abastecida com muitas bebidas. Cerveja era o que dominava, mas também havia muita bebida quente. Cachaça, vodca, uísque, e muitas outras completavam o estoque. Foi montado um palanque com armação de andaime e tábua de trinta para o mestre de cerimônia e o pagodeiro de renome.

O resto da semana seguiu tranquilamente. Todos ocuparam os pontos de venda. Os viciados aos poucos foram chegando. Sentindo confiança na nova rapaziada. — Preto ou branco? — Perguntavam os vendedores para a clientela. Todos que compravam ficavam sabendo da funk comunitário. A notícia se espalhava. Os viciados estavam ouriçados. — É hoje! Cara vai ser muito doido. — Comentavam pelas ruas do bairro.

João foi andar um pouco pelas ruas, visitar os bares, dar o recado que agora tem chefe novo. Foi com ele Minhoca, Cobra, Pedrão e mais três capangas. Todos com rádio, e sempre em contato com os outros traficantes. Passava pelas ruas e acenava para as pessoas: — Fala! Como vai? Estamos de volta. — As pessoas apenas acenavam com a cabeça. Estavam com medo. Já era de se imaginar, João e seus homens estavam armados até aos dentes. Pararam num bar e pediram duas cervejas para refrescar o calor. João colocou uma arma sobre o balcão e disse ao dono do bar:

Em nome de JoãoWhere stories live. Discover now