Capítulo 7

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Já escureceu, estou a ver televisão e o Renaldo está dentro do escritório a trabalhar. Será que é sobre a máfia ou sobre a empresa? Aliás, será que essa empresa de seguros realmente existe?

Está a dar um filme sobre um grupo de adolescentes que participa em competições de dança na escola. A vida nos filmes é tão fácil. Sabemos sempre que tem um final feliz. Bom... A maioria. Solto um longo suspiro.

-Tens saudades da escola? - a voz da Jorgina sobressalta-me. - Desculpa. Não te queria assustar.
-Não faz mal. E sim, tenho saudades. Acho que é vontade de ver pessoas da minha idade.

-Eu percebo.

-Jorgina! Podes servir o jantar! - o Renaldo manda.

Estou deitada na cama e está a custar a adormecer. O jantar com o Renaldo também foi silencioso, mas ele parecia preocupado. Parece que finalmente os meus olhos começam a pesar e sinto o sono a aproximar-se.

Estou na cozinha da minha casa a beber água. Oiço a minha mãe descer as escadas e viro-me para ela entusiasmada.

-Já está tudo preparado para a minha festa de aniversário? - pergunto.

-Qual festa? Não vai haver festa nenhuma. - ela responde séria.

-Mas disseste que...

-Pois, menti. Não vou gastar o meu dinheiro, muito menos o meu tempo numa festa idiota. - o meu sorriso desaparece. Sinto os meus olhos lacrimejarem e apresso-me a sair da cozinha.

Entro no meu quarto e deito-me na cama a chorar. Tenho de parar mas não consigo. As lágrimas não param. Ela prometeu-me uma festa de aniversário e agora diz não.

-Juliana! - oiço a sua voz, por isso limpo as lágrimas.

Ela entra no meu quarto e eu levanto-me com a cabeça baixa. Ela aproxima-se devagar ficando frente a frente comigo, então eu inclino ligeiramente a cabeça para o outro lado.

-Olha para mim. - ela ordena e eu obedeço. - Estiveste a chorar? - não respondo e a minha respiração acelera. Sinto uma bofetada e acabo por cair no chão. Ela agarra no meu cabelo obrigando-me a olhar para a sua cara.

-Para de chorar. Tenho raiva de quem chora. - ela quase grita. - Vai limpar a casa de banho. - depois de me largar, vai até a porta. - Vou sair. Quando voltar não quero vestígios de lágrimas. E... Parabéns - dito isto ela sai deixando-me sozinha.


Abro os olhos de repente e estou de volta ao quarto na casa do Renaldo. Uma luz tenta entrar pela janela e vejo que já amanheceu. O meu coração está acelerado e sinto a cara humida. Olho para o relógio, são 7h30. Abro uma gaveta da mesa de cabeceira onde tenho um pequeno calendário. É meu aniversário. Esqueci-me. Também nunca foi uma data feliz.

Saio da cama e caminho até o casa de banho. Lavo a cara e os dentes, depois sai para vestir o fato de treino.

Desço as escadas direcionando-me para a cozinha onde está a Jorgina.

-Bom dia! - ela assusta-se ao me ver chegar.

-Bom dia. Acordaste cedo hoje.

-Éh não consiguo dormir mais. - sento-me à mesa.

-Pesadelo?

-Mais ou menos. Memórias do meu aniversário passado.

-Quando é que fazes anos? - exito um pouco em responder.

-Hoje.

-Parabéns. - ela sorri e abraça-me - Vou preparar um pequeno almoço especial.

A Jorgina levanta-se e começa a tirar ovos, leite, farinha e mais algumas coisas. Ela mistura tudo e põe na frigideira repetitivamente. Depois dá-me um prato com panquecas e cobertura de chocolate.

Estou a acabar de comer as panquecas. Acabar com muita pena minha, porque estão deliciosas. A Jorgina sai cozinha com um individual e um prato, mas volta pouco tempo depois com tudo nas mãos.

-O senhor Renaldo já acordou e pediu para ires falar com ele. - ponho a última garfada na boca e caminho para fora da cozinha depois de me despedir dela.

-Bom dia! - diz ele.

-Bom dia. Não tomas o pequeno almoço? - pergunto enquanto saimos de casa.

-Tenho uma reunião. Não me posso atrasar. - entramos no carro e rapidamente chegamos ao pavilhão.

Entro lá dentro e vejo o Lourenço a mexer em algo em cima da mesa.

-Estás pronto para lutar? - pergunto e ele olha pra mim.

-Nós não vamos lutar. - aproximo-me dele séria e fico parada alguns segundos à sua frente. Surpreendo-o com um pontapé na lateral.

-Muito bem, se é que tu queres. - ele dá-me um murro na barriga e eu ponho as mãos sobre o local.

Olho para ele zangada e tento um murro do qual ele se defende.
5 min depois estou deitada no chão com o Lourenço em cima de mim a agarrar as minhas mãos acima da cabeça.

-Foste tu que pediste. Eu sabia que não estavas preparada. - ele levanta-se e ajuda-me a levantar.

-Não é justo. Perdi no meu próprio aniversário.

-É o teu aniversário? Parabéns. Tenho uma prendaa para ti.

-A sério? - uma prenda? Ele vai até a mesa e tira uma arma da sua mala preta.

-Esta é tua. - ele está a dar-me uma arma? Uma arma?

-Estás a gozar.

-Não. É isto que vamos usar hoje. - olho para ele zangada. - Entraste para uma máfia. Querias o quê? Tens de aprender a usar uma arma.

Pego no revólver e observo-o enquanto ele posiciona alguns alvos ao longe. Ele diz para fazer pontaria e disparar. Aponto para o primeiro alvo e acerto à segunda tentativa. Acerto nos outros dois, mas a minha expressão permanece séria.

-Acertaste. Porque é que continuas com essa cara? É só porque eu te dei uma arma?

A verdade é que quando ele disse que tinha uma prenda, eu comecei a pensar na última vez que recebi uma e não me recordo. Lembro-me de ver as raparigas da minha escola a chegar no dia a seguir aos seus aniversários e a falar sobre as prendas com os amiguinhos.
E o sonho que tive a noite passada só serviu para abrir a ferida que estava a cicatrizar.

-Não é só que... Tive um sonho a noite passada. - arrependo-me assim que as palavras saiem da boca.

-Com o que é que sonhaste?

-Não interessa. O que é que queres fazer agora?

Ele pendura uma corda com um alvo na ponta e diz para eu tentar acertar, mas com o alvo em movimento. A corda anda de um lado para o outro e eu só acerto ao terceiro disparo.

-Ok. Queres lutar?

-E perder outra vez? Não, obrigada.

-Prometo ser mais brando desta vez. - dito isto dou-lhe um pontapé na lateral.

Ele larga a arma e eu faço o mesmo. Depois tiro o casaco e começo a lutar com ele.

Amor E PesadeloOnde histórias criam vida. Descubra agora