Capítulo 6

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Era uma noite escura e chuvosa; as gotas, tamborilando contra o vidro das velhas

janelas, dificultavam a chegada do sono para Hank e Mary. Ela acabou adormecendo; mas

Hank, com o espírito já perturbado, teve muito mais dificuldade em se descontrair. De

qualquer forma, o dia fora péssimo; ele havia trabalhado a fim de cobrir de tinta os dizeres

pichados na frente da casa e tentado descobrir quem neste mundo escreveria uma coisa

daquelas. Ainda retinia em seus ouvidos a conversa que tivera com Alf Brummel, e a mente

continuava a repassar vez após vez os comentários cáusticos feitos durante a reunião do

conselho. Agora podia acrescentar a assembléia extraordinária da noite de sexta-feira às suas

preocupações, e orava ao Senhor em sussurros inaudíveis, desesperados, deitado ali no

escuro.

Engraçado como cada dobrinha do colchão parece muito mais incômoda quando se está

aborrecido. Hank começou a achar que acordaria Mary com todo aquele remexer e virar.

Ficou de costas, de lado, do outro lado, colocou os braços debaixo do travesseiro, em cima do

travesseiro; apanhou um lenço de papel e assoou o nariz. Olhou o relógio: 12:20hs. Eles

tinham-se deitado às 10:00hs.

Mas o sono acaba chegando, geralmente de maneira tão imperceptível que a pessoa não

percebe que sucumbiu, até acordar. Em dado momento no decorrer daquela noite, Hank

cochilou.

Mas após poucas horas, seus sonhos começaram a azedar. A princípio, eram as

bobagens de sempre, como dirigir um carro através da sala de estar e depois voar no carro ao

se transformar este em avião. Mas aí as imagens começaram a se acelerar e amotinar em sua

cabeça, cada vez mais frenéticas e caóticas. Ele começou a fugir de perigos. Podia ouvir

berros; teve a sensação de estar caindo e a visão e o gosto de sangue. As imagens passaram de

brilhantes e coloridas a monocromáticas e lúgubres. Ele lutava constantemente, batalhando

para salvar a vida; inúmeros perigos e inimigos o cercavam, cada vez mais perto. Nada

daquilo fazia sentido algum, mas uma coisa era bem definida: puro terror. Ele queria

desesperadamente gritar mas não tinha tempo na luta com os inimigos, monstros, forças

invisíveis.

O coração começou a martelar nos ouvidos. O mundo todo rodopiava e latejava. O

horrível conflito que se agitava em sua cabeça começou a aflorar à superfície do seu

consciente de todos os dias. Ele se mexeu na cama, virou-se de costas, inspirou

profundamente, tentando acordar. Os olhos semi-abriram-se, sem focalizar coisa alguma. Ele

estava naquele estranho estado de estupor, nem bem adormecido, nem bem consciente.

Será que realmente a tinha visto? Era uma lúgubre projeção em pleno ar, um quadro

luminescente em veludo preto. Logo acima da cama, tão próxima que ele podia sentir o cheiro

do hálito sulfuroso, e a máscara medonha de uma cara pairava, contorcendo-se em

Este Mundo Tenebroso - Volume 1Onde histórias criam vida. Descubra agora