É preciso contar uma pequena estorinha para a posteridade dessas figuras que me são tão queridas: Adam e Amélia, afinal, tenho a sensação de que os biógrafos desses dois vão romantizar essa história da forma mais irritante do mundo, tirando os resquícios de bom humor e humanidade que os cercam. Como mãe e sogra, é meu dever fazer isso.
O casamento seguia aquele típico roteiro de pombinhos, mas, no caso dos dois, era bem intenso, não a parte do amor que parece estar mais do que claro, mas a parte da cama, se é que vocês me entendem. Isto é bem compreensível, sabe? Os dois passaram quase quatro anos se privando disso. De qualquer forma, ninguém pode reclamar que aqueles eram dois frígidos. Deus, estou comentando sobre a vida sexual da minha filha! Deixe-me ater aos fatos! Fatos, Sônia! Fatos!
Após o casamento, os meses foram se passando com algum serenidade. Era como se os céus tivessem decidido que, após anos turbulentos, aquele par de amantes teriam algum sossego em suas vidas. Observava aquele início de casamento com certa curiosidade materna. Apesar de manter residência no Brasil, procurava visitar sempre que pudesse. Lembro que eles estavam perto de completar um ano de casamento quando reparei que Amélia não demonstrava nenhum sinal de gravidez. Isto é o sinal natural da continuidade e da satisfação no casamento - não que eles precisassem disso, mas devem entender que na minha época, as coisas eram feitas assim. Confesso que fiquei consternada com este fato e, principalmente, com o detalhe de que minha filha sempre quis ser mãe e não era mais uma mocinha, o que poderia tornar qualquer gravidez bem arriscada.
Pensei em bancar a sogra intrometida - coisa que, vale dizer, nunca fui - e abordar o tema com Amélia quando fui visitá-los em Cúmbria, naquela pequena ilha no meio do lago onde viviam. No entanto, o destino que traça seus próprios momentos e caminhos fez com que minha menina viesse até mim para falar sobre o assunto numa noite tranquila. Estava no quarto que eles sempre destinavam para mim quando ouvi duas pancadinhas na porta e logo, a figura bonita de Amélia surgiu timidamente. Por um instante ou dois, me permiti observá-la. Já não era a menininha de grandes olhos verdes que ria numa casa dominada por machos mais velhos, mas uma mulher formada que estava num momento de plenitude. Estava vestida para dormir com uma camisola longa e elegante, mas seu rosto estava inquieto.
- Você quer me falar algo... - deduzi com aquele ar petulante que nós, mães, temos. Afinal, conhecemos nossos filhos de uma forma tão completa que lemos variações de humor num simples arquear de uma sobrancelha. Amélia sorriu desarmada por esse pequeno poder mediúnico que toda mãe tem.
- Mãe, preciso confessar algo, mas a senhora vai prometer que não vai falar nada para o Adam - sussurrou, após hesitar por uns instantes. Estava acomodada em uma confortável poltrona, aproveitando-se disso, ela sentou-se aos meus pés.
- O que se passa nessa cabecinha, senhora presidente? - quis saber enquanto permitia-me afagar-lhe os cabelos que estavam soltos e indomados numa bonita confusão de cachos castanhos.
- Não é nada... - minha filha suspirou apoiando seu queixo nos meus joelhos o que a fez parecer nada mais do que uma menina. - É algo bobo, até.. - um meio sorriso tímido perpassou pelos lábios.
- Então, vamos, meu amor, diga-me o que se passou. - pedi com doçura deixando que meus dedos acariciassem a pele do rosto da minha filha, perseguindo as linhas que carregavam tantas partes de mim e outras tantas de Roberto, que guardavam o objeto de um amor tão grande quanto o materno.
Minha filha, a política eloquente, hesitou. Não uma, mas várias vezes. Pode ter sido impressão, mas um rubor leve coloriu suas maçãs faceis de um rosado gracioso. Mordeu o lábio novamente, inspirou e expirou tantas quantas vezes fossem necessárias para se acalmar. Foi um jorro de palavras quase atropeladas, sem preâmbulos a antecedê-las, que ela fez sua confissão.
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A diplomacia do amor
RomanceEsta poderia ser aquelas histórias onde dois estranhos se encontram numa ocasião qualquer, jantam, se conquistam e se apaixonam loucamente, mas não é. Algumas dessas coisas, talvez, aconteçam com Adam e Amélia, mas vocês vão entender que nada é tão...