As seguintes anotações foram encontradas no quarto de um homem que está desaparecido, José Alves Teixeira, 22 anos. O quarto estava trancado, sem sinais de arrombamento, e na cama estava a roupa que o homem usava momentos antes de trancar o quarto, segundo informações de familiares. Estima-se que as notas foram escritas na mesma noite do desaparecimento.
" No dia 10 de março de 2006, uma garota foi dada como desaparecida na minha cidade. São quase 10 anos sem nenhuma pista de onde ela poderia estar, nenhum corpo encontrado (nem mesmo algum corpo irreconhecível pelo estado de putrefação ou totalmente carbonizado foi encontrado, nem nas cidades próximas). Natália Melina tinha 11 anos na época. Eu estudava com ela, no colégio Rogério Ribeiro, desde que havia entrado na primeira série. Como melhor amigo dela, não posso deixar que o Caso Melina, como ficou conhecido, vire apenas arquivos e memórias.
Estou escrevendo essas notas porque, após alguns acontecimentos recentes que irei detalhar posteriormente, descobri a verdade por trás do desaparecimento de Natália. Nunca havia percebido isso antes, mas o desaparecimento dela tem a ver com o diário. Mais precisamente, tem a ver com ela ter mostrado o diário dela para mim.
Explicando a história do começo, eu e Natália nos tornamos amigos na primeira série, após dividirmos os lanches. Ao contrário da maioria das crianças, Natália sempre foi quieta e não gostava de correr no pátio na hora do recreio. Preferia ficar pintando os livrinhos de colorir. Às vezes, desenhava. Eu sempre gostei de desenhar e colorir, por isso também fazia isso com ela. Um dos desenhos que tenho certeza que tem a ver com o desaparecimento dela foi um que Natália fez na quinta série. Ela desenhou algo que parecia uma cabra. Perguntei o que era, Natália respondeu que tinha encontrado esse animal passando muito mal e deu água e restos de comida para ele, e agora ele estava morando na sua casa, mas ninguém podia saber disso. Lembro que damos um nome para ele juntos: Carlito, o cabrito. Era engraçado na época. Nunca fui à casa de Natália, mas sempre acreditei que o cabrito era real e morava na casa dela, no porão, talvez.
Agora vamos à parte do diário. Sexta série, início do ano letivo. Março de 2006. Desde o início do ano, Natália parecia que havia mudado. Foi uma mudança considerada boa, ela havia ficado mais alegre, mais sociável e até notei que ela cresceu rapidamente. Ela tinha 11 anos, mas parecia ter 14. Foi no dia 9 que Natália cochichou no meu ouvido que tinha um segredo, eu mesmo falei que se era segredo ela não podia me contar, mas ela disse que podia confiar em mim. Hoje percebo que deveria ter insistido para ela não contar. Ela tirou da mochila o diário, dizendo que foi presente do Carlito. Eu ri, na hora pensei ser uma brincadeira dela. Ela disse que ganhou ele como um presente de ano novo, e que estava ansiosa para me mostrar. Disse que deveria ser segredo, mas que confiava em mim. Não cheguei nem a ler uma palavra do que estava escrito, mas parece que apenas saber da existência do diário irritou... aquilo.
No dia seguinte, Natália havia sumido. Lendo os jornais, eu soube que ela desapareceu à noite, enquanto dormia. As portas e janelas estavam trancadas. As roupas dela estavam posicionadas na cama como se ela estivesse usando-as. Era como se Natália tivesse derretido. Nenhum sinal de arrombamento, nenhuma chave fora do lugar, nada. Os policiais suspeitaram que os pais de Natália tivessem armado tudo isso, sumido com a garota ou até mesmo tivessem matado ela e escondido o corpo, mas nenhuma prova foi encontrada. Interrogaram todos que a conheciam, até mesmo eu. Eu sabia que os pais dela nunca fariam algo assim, Natália me contava tudo que acontecia com ela, e o relacionamento dela com os pais era perfeitamente normal. Foi um desaparecimento sem explicações. O diário havia sumido do quarto dela. E reaparecido no meu, dez anos depois. Hoje. Esta noite.
No início de fevereiro (não me sinto seguro para informar o dia) de 2016 estou escrevendo essas notas. Eu li o diário dela. Ela descrevia o cabrito como amigável e mágico, e que podia se transfomar em humano. Na verdade, humanoide, pois ainda tinha chifres, rabo e rosto parecido com um bode. Estão escritas coisas que eu nunca imaginaria que poderia ter acontecido com Natália... E coisas que ela nunca me contou sobre o bode, e sobre ela mesma. Coisas repugnantes, coisas atrozes... Coisas sobrenaturais sobre Carlito que eu nunca imaginaria.
Selecionei algumas páginas mais importantes do diário de Natália para suplicar por ajuda. Não apenas para encontrar Natália, mas por mim também. Esse diário não apareceu na minha casa porque alguém entrou aqui e deixou ele. Foi o maldito bode (ou o que quer que aquela coisa seja). Talvez eu já esteja morto ao lerem essas notas, ou desaparecido. Talvez eu encontre Natália. Peço aos possíveis leitores que procurem uma pessoa que possa se comunicar com entidades paranormais, alguém que entenda o que aconteceu com Natália e investiguem até o último momento! "