Noite de Guarda

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Eu sempre acreditei que tudo pode ser explicado por causas naturais. Nunca acreditei em sobrenatural ou causas do além. Pelo menos até aquela noite.
A noite estava fria. Pelas minhas estimativas devia fazer cerca de 9º graus e meu relógio apontava cinco para a meia-noite. Eu, como soldado do exército, estava de guarda num posto que fica no alto do morro. Meus ombros doíam do peso do fuzil e minhas pernas estavam cansadas. Apenas aqueles que também serviram ao exército sabem do desgaste físico que é uma guarda.
Passados dez minutos da meia-noite, vejo o cabo responsável pela guarda se aproximando para fazer a troca de turno. Mal posso esperar a hora de ir dormir e descansar meus pés cansados.
Após da devida troca, de retirar o carregador de minha arma e guarda-la no cabide apropriado, fui a minha cama me deitar. Olhei no relógio e os ponteiros marcavam 00: 25. Fechei meus olhos e me encontrei rapidamente no mundo dos sonhos.
De repente acordo com um forte barulho "POW". "POW POW", o barulho se repete e não fica dúvida de sua origem: tiros de um fuzil. Me levanto rapidamente assim como todos os presentes no alojamento, o cabo da guarda entra correndo gritando PDA(Plano de Defesa do Aquartelamento), todos sabemos o que temos que fazer, pegamos nosso fuzil do cabide que o cabo acabou de abrir e corremos para as nossas posições.
Eu corro morro acima para meu ponto de segurança. Este ponto não é o mesmo que estava antes fazendo proteção, mas uns 200 metros ao norte. Olho no relógio para saber as horas e vejo que já são três da madrugada. Quando chego lá, olho em direção da guarita onde o soldado que me rendeu deveria estar e não consigo-o encontrar. Sabendo que isto está errado, passo pelo meu rádio a situação para a guarda.
Assim que termino de passar a situação, escuto um barulho atrás de mim. Quando olho, eu percebo que se trata de um superior. Olhando em sua divisa noto que ele é um sargento e seu nome é A. Rossi. Eu não o reconheço, porém há muitos militares dentro de nosso batalhão e não seria o primeiro no qual eu não tenho conhecimento.
"Qual seu nome soldado?", ele me pergunta. "Soldado Clemente, número 898 senhor!" respondo prontamente. Ele me encara com olhos cerrados e por fim acena com a cabeça. "Muito bom soldado, fique de olhos abertos." e ele se retira.
Acho estranho ele não ter falado nada sobre a situação de PDA que nos encontramos, porém não tenho muito tempo para pensar nisso. Logo após dele sair de meu campo de visão, vejo subindo o morro quatro militares. Um deles, o sargento da guarda Roberto, olha para mim para se certificar que me encontro no devido lugar, depois continua em direção da guarita vazia.
Assim que eles chegam lá, vejo que eles correm descendo o outro lado do morro. Em menos de um minuto, escuto a voz do sargento Roberto pelo rádio solicitando ajuda médica. O padioleiro de plantão chega no local trazendo uma maca e logo vejo ele mais outro soldado correndo de volta com um corpo em cima da maca. Bem, ficamos em alerta até o sol nascer e chegar a hora de sairmos de serviço. Várias rondas foram feitas por todo o perímetro do quartel. Por volta das nove horas da manhã a nova guarda chegou e pude sair de serviço.
Assim que cheguei a guarda, o oficial que estava saindo de serviço chamou a todos para uma reunião. "Bem soldados, ainda não sabemos o que exatamente aconteceu ontem a noite.Sinto informar que o soldado Pedro do morro leste foi encontrado morto enforcado pela a bandoleira do fuzil preso numa árvore. Todos serão interrogados por mim e pelo comandante do batalhão. Peguem as suas coisas, deixe o armamento e se retirem ao auditório."
Ao ouvir o tenente fiquei assustado e triste. O soldado Pedro era de meu pelotão e um bom amigo. Sem processar direito a morte dele, peguei as minhas coisas e fiz assim como o tenente avisou.
Ficamos todos no auditório esperando por meia hora. Todos em silêncio. Era possível sentir o quão sério e pesado estava o ambiente. Todos estávamos tristes por nosso camarada e profundamente assustados. O tenente apareceu no auditório e começou a chamar um por um para o interrogatório.
Eu fui o terceiro a ser chamado. Provavelmente por também estar fazendo segurança naquela guarita. Acompanhei o tenente até a sala de nosso comandante. Vejo o comandante sentado tranquilo em sua mesa. Depois de pedi permissão para entrar na sala, ele pede para eu me sentar.
Me sentei de frente para ele e então as perguntas começaram. Eu tive que contar tudo que aconteceu no serviço. Desde a hora em que assumi meu cargo até a hora de sair agora pela manhã. Expliquei que nada de anormal aconteceu durante o meu turno. O tenente me perguntou se eu tenho certeza que falei tudo e, nesse momento, me lembrei do estranho sargento A. Rossi.
"Quase me esqueci comandante. Assim que cheguei em minha posição de PDA, um sargento me abordou."
"Que sargento Clemente?"
"O sargento A. Rossi."
Vejo que os olhos de meu comandante se arregalam. "A. Rossi, tem certeza soldado?" o coronel me pergunta.
"Sim senhor!", respondo com certeza.
"Me descreva o sargento A. Rossi."
"Ele era baixo de estatura, provavelmente uns 1,60. Cabelos castanhos e olhos azuis. Provavelmente uns 27 anos e pele pálida."
Consigo ver a cara de assustado do sempre tranquilo tenente-coronel. "Clemente, o sargento A. Rossi se matou enforcado a três anos naquele morro."

S/N.... São Paulo

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