Capítulo 1

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Sentei na cama e por alguns instantes fiquei com o olhar fixo na janela me recuperando do susto, meu corpo tremia, minha cabeça pesava uma tonelada. Acordei num grito, banhada de suor. Fazia um dia bonito lá fora, um vento fresco balançava as cortinas. Busquei as imagens na minha cabeça, ainda que tenha sido um pesadelo terrível eu queria lembrar de onde eu os conheço? Aqueles dois não me são estranhos. Apertei os olhos relembrando o olhar bravio daquele homem ao me tomar e o sacrifício do outro ao me salvar. Balancei a cabeça tentando espantar as imagens da minha mente. 

Levantei praticamente me arrastando, o sonho mexeu comigo de uma forma que meu corpo interpretou como real, foi como se eu realmente tivesse passado por toda aquela situação. 

Na faculdade eu teria prova de direito tributário logo no primeiro horário, não podia nem sonhar em chegar atrasada. Tomei um banho quente e rápido, gostaria de ficar submersa na banheira por um tempo, mas não poderia naquele momento.  Entre resquícios do sonho e os lembretes da matéria da prova, peguei a mochila, os gigantescos livros de direito, bati a porta do quarto e desci.

Gritos exaltados vinham da cozinha, pelo jeito meu pai não tinha acordado de bom humor. Ele amaldiçoava alguém pelo celular. Pelo que entendi, ele falava com o delegado Martin Holt sobre uma invasão e roubo de um dos carros do escritório. Um grupo de marginais entrou no prédio durante a noite, rendeu o pobre James, o guarda noturno, deixando-o amordaçado e amarrado e levaram um dos carros. Os ladrões atravessaram a cerca de arame com o carro fazendo uma enorme bagunça.

Três da manhã na pacata Rogers, a cidade inteira adormecida no silêncio total, até que toda a calmaria é rasgada pelo som furioso das Harley's dos Tubarões

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Três da manhã na pacata Rogers, a cidade inteira adormecida no silêncio total, até que toda a calmaria é rasgada pelo som furioso das Harley's dos Tubarões.

- Kuopus, eu duvido você acertar essa garrafa na janela dos Hayes, du – vi – dei! Te dou 10 dólares.

- Eu vou acertar é a sua cabeça! Paga pra ver seu cretino? Não me desafia!

Ethan não pensou duas vezes e acertou a janela dos Diaz, fazendo um estardalhaço. Kuopus não ficou nada satisfeito:

- Você é idiota?

- Se você é covarde, eu não sou. Adrian, pague meus 10 dólares seu bastardo.

- O desafio não foi pra você, foi pro Kuopus.

Enquanto eles avançavam rua acima, os Diaz xingavam a plenos pulmões, e o grupo de arruaceiros seguia gargalhando pela noite.

- Se concentrem na ação, pode ser? Chega de idiotices!  

- Se concentrem na ação, pode ser? Chega de idiotices!  

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Beijei minha mãe, beijei Abby e beijei meu pai que pronunciava xingamentos em alta voz, vermelho de raiva, gesticulando como louco dizendo que o delegado sabia muito bem quem era o ladrão e exigia que ele fosse preso imediatamente. Meu pai tem certa influência com as autoridades da cidade, senão de todo o estado do Arkansas. O prefeito sempre se aconselha com ele antes de tomar alguma decisão. Construções, inaugurações e investimentos, nada passa sem que ele dê o seu aval.

Vamos às apresentações formais:

Meu pai é Joseph Snows, um dos homens mais ricos do Arkansas, advogado conceituado em todo o estado, mais de 20 anos de profissão, sócio majoritário da Snows & Atwill Associates, escritório de advocacia com filiais em outros estados da América. Um homem austero, com muita dificuldade de expressar seus bons sentimentos. O considero uma pessoa arrogante e exibicionista, que faz uma linha de bom homem, simpático e receptivo quando necessário e quando lhe convém. Nunca tivemos uma relação muito afetiva de pai e filha, ele acha que me cobrir desde criança com tudo do melhor e mais caro supriria a necessidade do seu afeto. Nunca o compreendi, mas também nunca o questionei.

Minha mãe, sentada e calada com uma expressão de tranquilidade é Judith Snows, socialite, rata de igreja, promovedora assídua de bailes e bazares de caridade, muito comuns aqui nos Estados Unidos. Atrevo-me a dizer que pouco de todo esse circo é realmente caridade, o resto é apenas imposição social. Ela é praticamente a líder do Conselho da Moral e dos Bons Costumes. Não, esse Conselho não existe de fato, mas as senhoras do seu círculo de amizade agem como se ele existisse e elas são tiranas em seus julgamentos. Minha mãe em seus 44 anos de idade, ainda é uma mulher muito bonita, mas seu olhar esconde um sentimento que não posso definir. Ela pouco sorri, mas tem um sorriso lindo. Tenho minhas dúvidas sobre toda essa dedicação dela aos outros e não muito à sua própria família. Talvez seja a maneira dela de dar sentido à vida vazia e passar o tempo. Também nunca a questionei. É, não sou uma pessoa muito questionadora.

Eu me chamo Annie Valerie Snows, tenho 20 anos e moro em Rogers, estado do Arkansas, no Sudeste dos Estados Unidos.

Rogers é considerada uma cidade pequena, o que significa que todo mundo se conhece e sabe da vida de todo mundo. É um lugar muito agradável para se morar. É cercado por bosques, pelo belo Lago Beaver e por grandes cavernas. No outono, a cidade inteira fica da cor laranja e o inverno costuma ser rigoroso. Na época do Natal a cidade se torna um grande espetáculo de luzes. Gosto muito de Rogers e não tenho grandes ambições que me levem para longe daqui.

Vivo numa casa muito confortável, meu pai fez questão que ela fosse a maior e mais bonita de Rogers. Temos uma vida sem nenhum aperto e com algumas regalias; ele sempre supriu a família com tudo que fosse necessário e com que não era também.

Apesar das boas condições de vida, eu nunca fui uma patricinha, sempre mantive muito pé no chão, nem um pouco deslumbrada com o luxo, modéstia à parte. Tanto que as garotas populares da escola e faculdade, geralmente as filhas e netas dos aristocratas do círculo de convívio dos meus pais nunca deram atenção para mim e nem eu para elas. Minha melhor amiga era de uma classe considerada inferior, mas eu não a trocaria por 20 garotas ricas de Rogers.

Pra falar bem a verdade, a arrogância do meu pai e a vida "plástica" da minha mãe, com sua pose de boníssima esposa e mãe amorosa, coisa que ela também não era, sempre me causou nojo. Às vezes eles faziam pose para fotografias, abraçados como se fossem um casal super feliz, logo após o flash o belo sorriso sumia e eles se largavam como se os corpos se queimassem quando ficavam juntos. Nunca senti que eles fossem felizes de verdade, logo, eu nunca quis fazer parte desse mundinho deles. Pergunto-me em que parte do tempo o amor deles se perdeu. Como nunca tive momentos de afeição em família, enfiava minha cara nos livros e séries de TV e dividia meus melhores momentos com a espevitada Dorothy.

Sempre fui uma menina ao estilo certinha, típica moça de família que anda de cabeça baixa, com os livros colados junto ao peito, tira as notas mais altas e não corre atrás dos garotos como a maioria das meninas da minha idade. Meus pais fazem a linha conservadora e eu seguia essa mesma linha até minha vida topar com a dele... Phillip Kuopus.

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