Sem Canção

Capítulo 4 - Gabe

Capítulo 4

Eu te ouço em silêncio
Enquanto meu coração grita
Eu mexo meus lábios
Mas você me evita
Quero muito estar com você
Mas não há nada mais que eu possa fazer
Porque simplesmente não sou capaz
Não sou capaz de te convencer
Uma Chance, Fragmentos

Não pude deixar de achar engraçada a forma como minha vizinha reagiu quando seus olhos encontram os meus. Eles se arregalaram ligeiramente e ela soltou um grito assustado, enquanto respirava com dificuldade por conta do exercício de subir as escadas. Ela pronunciou meu nome como se não pudesse acreditar que eu era a mesma pessoa do restaurante e um sorriso sutil se formou em meu rosto ao ver que ela ficara ainda mais estupefata com o fato de eu saber o seu nome.

Verdade seja dita, era difícil não notar Erin. Desde a primeira vez que eu a vi no corredor da recepção, semanas antes de me mudar, fui atraído pela forma como ela falava e pelos trejeitos de seu corpo. Foi inevitável não ouvir a conversa dela ao telefone, pois minha vizinha possui um jeito bastante peculiar de se expressar.

Olho para Erin enquanto ela parece divagar em outro lugar. Acho que a faço devanear sobre a noite passada quando a parabenizo pela sua coragem e sinto uma pontada de culpa. Fiquei a noite toda observando a maneira como aquele cara a olhava e tive certeza de que ele estaria esperando por ela em algum lugar. Não tive dúvidas sobre segui-la. Não podia deixar que nada de mal acontecesse a ela. Mas não quero que minha vizinha se afunde em pensamentos ruins. Não quero que ela pense sobre ele. Então, ainda que seja óbvio, eu pergunto a ela se ela estava correndo. Erin volta a me fitar e me mostra um sorriso que me deixa um tanto perturbado. Ela responde que sim e seus olhos me percorrem. Percebo que ela deve estar me achando muito diferente do cara descontraído de ontem.

As portas do elevador se abrem e sou obrigado a me despedir. Aperto o botão que me leva até o subsolo onde fica a garagem e, ao chegar lá, caminho até minha Harley. Subo na moto e dirijo até o escritório. É incomum para alguém na minha posição escolher esse tipo de transporte, mas dane-se o que os outros pensam. Em algum momento da minha vida simplesmente deixei de me importar com a opinião que as pessoas têm a meu respeito.

Trabalho numa grande empresa que fabrica joias, mas na parte administrativa. Cuido de todo o setor financeiro, gerenciando as demais funções que dizem respeito ao que faço. Não é algo que particularmente me dê prazer, mas os acontecimentos em minha vida me levaram a seguir essa carreira. Infelizmente, nem sempre é possível se dedicar inteiramente aos sonhos, ainda mais quando algo abala grandemente suas estruturas.

Ao chegar à empresa, estaciono e me dirijo à minha sala. Já há uma quantidade boa de trabalho para fazer. Me sento na cadeira e ligo o notebook. Aproveito a calmaria e que estou sozinho para colocar numa música qualquer e a deixo tocar, pois sei que aquele será um longo dia e somente uma canção poderá ser capaz de aliviar o estresse que está por vir.

*

Assim como eu tinha previsto, minha tarde é repleta de coisas para resolver. Quando, enfim, meu horário de trabalho termina e volto para casa, a primeira coisa que faço é tomar um banho, colocar roupas mais confortáveis e ligar o som. Conecto meu iPod ali e me deixo levar pelo ritmo suave que embala meus sentidos.

Ainda são cinco e meia da tarde. A política do prédio diz que os moradores podem fazer barulho até oito horas e imagino que Erin não irá se incomodar com o som. É claro que eu não irei exagerar no volume como fiz no final de semana. Minha intenção era fazê-la bater à minha porta e ter um motivo para nos falarmos, já que nunca conseguimos nos esbarrar, mas Erin parece não se importar muito com esse tipo de coisa. Se eu quiser fazer com que essa garota me note, acho que terei de arranjar novas estratégias.