Capítulo 7 - Gabe

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Capítulo 7

Quando o vento for embora
Saberei qual é hora
Vou te procurar
Pra gente sentir
Pra gente sorrir
Pra te ter pra mim
O tempo certo, Fragmentos

Tenho um sobressalto quando olho para o meu pulso e vejo que são exatamente onze horas. Não pretendia ficar tanto tempo na casa dos meus pais, porém, é impossível sair de lá antes do planejado, principalmente quando minha mãe resolve engatar uma briga. Virar as costas e deixá-la falando sozinha foi tentador, mas eu sabia que se eu fizesse isso ela iria me punir durante um bom tempo. E não adianta dizer a ela que eu tenho compromisso, pois ela sempre acha que estou apenas querendo fugir.

Minha mãe consegue me tirar do sério e fazer com que eu me sinta mal. Mesmo que ela repita que não me culpa pelo que aconteceu a Daniel, eu vejo nos olhos dela e na maneira como ela muitas vezes deixa escapar algumas frases, que ela imagina como seria diferente se eu não tivesse dado aquele presente a ele.

Eu odeio ficar remoendo aquelas lembranças. Eu odeio pensar em como a vida pode ser tão injusta e tão frágil. Eu odeio não ter controle sobre as coisas que me afetam. Mas, mais que tudo, eu odeio como essa situação me machuca e como sinto que jamais serei o mesmo. Tudo isso me deprime e eu reprimo o sentimento. Prometi a mim mesmo que tentaria seguir em frente, que não ia deixar que a dor me tomasse novamente e é exatamente o que estou disposto a fazer.

Estaciono minha moto na garagem. Não é preciso chamar o elevador, pois ele já está parado ali. Entro e aperto o botão que me leva até o meu andar e, enquanto estou subindo, fico imaginando se Erin ainda está acordada me esperando, mas é óbvio que ela já deve estar dormindo. Tenho certeza de que ela está com raiva de mim, pensando muitas bobagens, achando que posso tê-la deixado esperando por ser um perfeito canalha.

Não sei se sou capaz de esperar até amanhã para falar com Erin, por isso me preparo para bater na porta, dizendo a mim mesmo que se na quinta batida minha vizinha não aparecer, eu não irei insistir. Mas ela é rápida e logo ouço o barulho da chave girando e do ferrolho sendo destrancado.

Como eu imaginava, Erin não está com a melhor das expressões. Sua testa está franzida e ela não diz nada, apenas continua com a porta entreaberta, me olhando.

- Me desculpe - eu peço e comprimo os lábios.

Estou com as mãos nos bolsos da minha calça social e preciso reconhecer que essa situação me deixa sem jeito. Não estou certo de que desculpas irão bastar, mas, infelizmente, isso é tudo que posso oferecer. Não posso simplesmente abrir o meu coração só porque estou interessado nessa garota. As marcas que carrego comigo são muito profundas para exibi-las tão facilmente.

- Eu precisei passar na casa dos meus pais para vê-los e alguns problemas me prenderam por lá.

Soa como uma desculpa infantil de uma criança, mas eu torço para que ela consiga ver a verdade nos meus olhos. Não gosto da ideia de Erin estar decepcionada apesar de não nos conhecermos muito bem.

Minha vizinha sai para fora e se encosta na parede, deixando um dos seus joelhos dobrados. Ela está descalça, e os cabelos dela estão um pouco bagunçados e jogados para o lado, o rosto livre da maquiagem suave que sempre usa. Erin não faz ideia de como está atraente.

- Seus pais estão bem? - ela me pergunta com uma genuína preocupação.

Em resposta, eu assinto com a cabeça.

- Só queria que você soubesse que não fiz de propósito e que se não fosse realmente importante, eu jamais a deixaria esperando.

Minha vizinha pondera por alguns segundos.

- Por favor, me perdoe. - Uno as mãos e faço minha melhor carinha de cachorro sem dono.

- Tudo bem, Gabe. - Ela abre um pequeno sorriso.

Erin parece acreditar em mim e eu me sinto aliviado.

- Você já deve estar cansada e querendo dormir, não é?

- Para ser sincera, não estou com sono. - O sorriso se torna um pouco tímido.

- Você ainda quer sair comigo? -
faço uma tentativa, pois quero muito, muito mesmo, passar um tempo com essa garota e esquecer os pensamentos ruins que ainda pairam sobre minha mente.

Ela morde o lábio e olha para baixo, ponderando se deve ou não aceitar o meu convite. É loucura, nem preciso dizer, já está tarde e no dia seguinte teremos que levantar cedo, mas, se há uma coisa que eu aprendi com tudo que aconteceu, é que devemos viver e sentir cada dia como se não houvesse amanhã, pois, como diz uma das minhas canções preferidas, na verdade não há.

Na
Verdade
Não

- Tudo bem - ela concorda.

- Você pode esperar alguns minutos
- peço e elevo os cantos dos meus lábios. - Gostaria de tomar um banho antes. Prometo que serei rápido. - Ergo a mão espalmada e ela ri, meneando a cabeça.

- Ok, também preciso me arrumar.
- Ela toca em sua blusa fina e me olha com uma careta. - Está amassada. Além do mais, eu acabei cochilando no sofá e devo estar horrível! - Erin cobre o rosto com as mãos em concha.

- Para mim, você está perfeita - garanto apesar de saber que ela não irá acreditar. Eu realmente não entendo por que as mulheres nunca acham que estamos sendo sinceros com relação à aparência delas.

- Ah, claro - ela ironiza como eu imaginei. - Bem, é melhor irmos logo, ou só sairemos daqui amanhã.

Assim que Erin entra, eu também entro. Estou ansioso para tirar aquela roupa, pois não me sinto nem um pouco confortável tendo que me vestir tão formalmente. Tomo um banho rápido e coloco algo mais casual. Ponho meus anéis, pego minha jaqueta de couro e dois capacetes.

Quando saio, vejo que Erin já se encontra no corredor. Ela está olhando para o outro lado, mas, quando percebe minha presença, seus olhos claros se voltam para mim. Os cabelos loiros estão mais ajeitados, e ela está usando um casaco, mas não tenho certeza de que aquele agasalho será suficiente para protegê-la, ainda que a noite não esteja fria.

- Nós vamos de moto. Tem certeza de que não quer pegar algo mais quente.

- Estou bem assim - me garante. - Acha que vamos encontrar algum restaurante aberto? - Erin franze a testa.

- Eu conheço um bom lugar que fica aberto vinte e quatro horas.

- Ah, é? Onde? - Ela ergue a sobrancelha.

- Você já vai saber - digo e dou uma piscadela.

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