19. A traição

151 21 0
                                    

— Vamos sentar — Eliana convidou. — Robert e eu queríamos dizer uma coisa para vocês.

Conduziu Marisa até o sofá, acomodando-se ao lado dela enquanto Marco ocupava a poltrona e Robert se mantinha de pé. Marisa relanceou de novo a cama, onde a escultura de um elefante de toalha — cortesia do serviço de bordo — os observava com suas indiferentes órbitas feitas de bombom embrulhado em papel-alumínio verde.

— Foi uma alegria reencontrar Marco e um prazer conhecer você, Marisa — continuou Eliana, e Robert concordou com um aceno. — Nós prezamos a sua amizade. É muito bom estar aqui com vocês.

A retórica de Eliana só fez alimentar a desconfiança de Marisa. Ela questionou se a troca de casais envolveria intimidade feminina. Sentada ali entre Eliana e Marco, ocorreu a Marisa que os dois já poderiam ter discutido o assunto sem o seu conhecimento, a exemplo da orgia. Sua indecisão deu lugar à exasperação.

Naquele intervalo, Robert abriu o armário e retirou dali dois pacotes, entregando um a Marco e outro a ela.

— O que é isso? — Marco perguntou enquanto Marisa pensava em toda sorte de apetrechos eróticos.

— É o nosso agradecimento pelo seu apoio. Vocês sabem... a festa — Eliana esclareceu. — Desculpem termos desmarcado. Devíamos ter deixado os convites com vocês.

— Nós só íamos fazer companhia. Afinal, é para isso que são os amigos. Vocês não precisavam ter comprado nada para nós. Na próxima, as bebidas são por nossa conta — disse Marco, indicando seu cartão de bordo.

O pacote dele, longo e estreito com etiqueta dourada, continha uma refinada gravata de seda azul. Marisa insistiu que ele a provasse e removeu a fita com o cartão de bordo que Marco trazia ao pescoço. Colocou-lhe a gravata atabalhoadamente, demorando-se a ajeitar o nó. Quando não pôde mais protelar, desfez o laço vermelho da caixa cor-de-rosa com seu presente. Já sabia o que encontraria dentro dela. Não obstante, surpreendeu-se. Agradeceu e ficou quieta ruminando, ao passo que Marco conversava despreocupado com o casal.

De volta à sua cabine, ele deu pela falta do cartão de bordo e foi buscá-lo. Marisa tornou a abrir sua caixa, estudando o par de sandálias. Era quase idêntico ao que ela havia descartado após a queda na piscina. Sentou na cama, alisou o couro negro de boa qualidade e as calçou — serviam perfeitamente. Ao afivelar as tiras, sentiu as mãos de Robert ao redor de seus tornozelos. Levantou e recuou um passo para mirar-se no espelho sobre a cama, o salto alto arranhando o carpete do mesmo modo que arranhara a coxa dele no sonho. Quero que você se toque. Marisa fechou os olhos e deslizou a mão entre as pernas. Era como se pisasse em agulhas. As agulhadas lhe subiram até o sexo e lhe suscitaram um inexplicável prazer. Isso a assustou, e ela tirou as sandálias fazendo menção de devolvê-las à caixa.

Foi quando percebeu.

No fundo da caixa, sob o papel de seda branco, ela discerniu a quina de um envelope. Abriu-o.


Espero que você goste deste par.

Que seja seu parceiro de dança.

Que adorne os seus passos.

Que a leve para o seu desejo.

R.


Alvoroçada, Marisa deixou o cartão cair no piso. Recolheu-o com cautela, fitando-o longamente, e por fim o rasgou. Jogou os pedaços no vaso sanitário e puxou a descarga. Marco chegou no momento em que ela saía do banheiro. Marisa arrebatou as sandálias largadas no carpete e guardou-as no armário.

VERMELHO 2: Jogo de Espelhos [#Wattys2017]Onde histórias criam vida. Descubra agora