O Jantar

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Não sei como a maioria das pessoas reage diante de uma pessoa bonita, mas é assim que ajo. Eu fico quieto e, provavelmente, boquiaberto. Meus olhos não ficam arregalados por muito tempo, mas ficam imóveis como os de um boneco. Até eu me dar conta do que estava fazendo, levou bastante tempo.

E foi nesse tempo que consegui observar Sam com bastante atenção, sem interrupções.

A primeira coisa em que reparei foi em seus olhos claros, mas não parei neles por muito tempo, porque a boca dele, de lábios enormes, exagerados, chamava muita atenção. Era carnuda e tinha tudo para ser desproporcional em seu rosto, mas a sorte era que nada nele era pequeno. Seus maxilares eram salientes, seu nariz era, de certa forma, notável e seus cabelos, loiros, não eram curtos e terminavam de maneira desgrenhada um pouco abaixo da orelha. E então baixei o olhar para o corpo, mas a vistoria que fiz não demorou mais do que dois segundos. Eu não queria dar motivos para que ele suspeitasse de mim.

Mas ele era atlético. Vestido com uma camiseta simples, branca, de mangas azuis, consegui notar seus trapézios proeminentes, seus bíceps avantajados e seus tríceps contraídos. Até o abdômen podia ser divisado por trás do pano branco, e mesmo aquela silhueta era sedutora.

Parado à porta do que agora eu tinha certeza de que era o seu quarto, Sam me olhava com um misto de desconfiança e incredulidade. Era quase como se pensasse no que fazer comigo, agora que havia me encontrado invadido sua privacidade.

– Sim, sou eu – eu finalmente respondi, engolindo em seco.

– Chegou tarde – ele disse, passou por mim e se sentou em sua cama. Descalçara os tênis e agora tirava as meias. – Fizeram uma boa viagem?

– Sim, fizemos, foi tranquila.

Sam parecia estar querendo ser simpático comigo, mas seu rosto ainda continuava sério como o de alguém que precisava de explicações.

– Sinto muito se me encontrou aqui – eu acabei dizendo, de maneira impulsiva. – Não era minha intenção xeretar o seu quarto, mas é que o quarto de hóspedes é tão parecido com esse que tive que procurar sinais de que algum deles já pertencia a alguém...

– Você poderia ter aberto a porta do armário – ele disse e, sentado, agora descalço, apoiou as mãos na cama. – Tenho algumas peças de roupa por lá.
Assenti com a cabeça, me sentindo burro. É claro que eu poderia ter feito isso, mas por que não fiz?

– Achei que isso fosse invadir demais a privacidade de alguém... – comecei, mentindo.

– Você abriu a porta do meu quarto e entrou nele. Já tinha invadido a minha privacidade. Não existe essa de invadir mais ou menos a privacidade de alguém.

Diante do que você fez, abrir a porta do armário não melhoraria ou pioraria as coisas.

Minhas narinas ardiam. Se antes eu estava pouco à vontade em estar naquela casa, agora eu sentia como se só pisar no chão fosse como andar em um piso de pregos.

– Ou você poderia ter perguntado à minha mãe – ele disse e deu de ombros. – Tenho certeza de que ela iria tirar essa sua dúvida.

Eu estava tão nervoso que não conseguia pensar em fazer outra coisa, além de me defender. Parecia o mais correto.

– Ela parecia tão ocupada preparando o jantar...

– Hoje é sexta-feira, ela não está preparando nada muito elaborado. Deve estar colocando tudo no micro-ondas e verificando o Facebook no celular ao mesmo tempo. Você teria que chamá-la umas três vezes até que ela notasse sua presença? Teria. Mas aí não teria invadido a minha privacidade.
Assenti mais uma vez com a cabeça. Eu não sabia mais o que fazer.

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