CAPÍTULO XVII

56 9 4
                                    

Capítulo XVII
Jackson

- Vamos fazer uma política de revezamento. – Bob disse na direção. – Nossa viagem é longa e não podemos nos dar ao luxo de imprevistos. Então escutem. Eu e Noah começaremos dirigindo nas primeiras seis horas. Alguém se voluntaria para o próximo turno?
- Eu. – Digo.
- eu posso ir depois dele. – Mike disse logo após eu terminar minha fala.
- ótimo, sobrará mais um turno...
- Eu dirijo. – Brook disse interrompendo o conselheiro.
- ótimo. Então já temos nossa política de revezamento montada.
Depois disso, a viagem continuou calma e silenciosa. Ninguém disse nada durante um bom tempo. Os únicos ruídos que se ouviam eram o da rua, e o do baixo som do rádio tocando uma playlist de músicas antigas.
Três horas depois, paramos na beira da estrada. Os conselheiros trocaram de lugar e seguimos nosso caminho.
Em pouco tempo, quando olho para o lado, percebo que Brook já havia dormido no ombro de Allyson. Brook... Não sei nem o que pensar sobre essa garota. Ela é tão forte. Não consigo imaginar se acontecesse comigo tudo que tem acontecido com ela. Ciclos e ciclos de falsas esperanças e desilusões, mas ainda assim ela tem segurado a barra. Treinando, ajudando e incentivando o grupo.
Tirei esse tempo que teríamos pra arrumar meus pensamentos. Coisa que raramente consigo fazer.
Sempre que paro pra pensar no que tem acontecido me pego desacreditado. Quer dizer, a tão pouco tempo fui iniciado, mas tanta coisa já aconteceu, e o pior não é isso. Quando lembro de tudo que Noah nos contou e ainda nos conta, fico sem saber como reagir. As vezes parece que esta não é a vida real. As vezes parece que tudo o que acontece faz parte de um livro de fantasia ou de um filme de ficção cientifica. É surreal.
Agora, este grupo que eu mal conhecia a algumas semanas, são literalmente tudo que eu tenho. Aprendemos uns com os outros e também um sobre os outros, conseguimos achar um jeito de conviver com cada um e nos unir, e neste exato momento estamos armados e treinados, indo ao encontro de uma mulher megalomaníaca e psicótica para impedirmos-a de acabar com o mundo que conhecemos. Me sinto como o super-homem numa história em quadrinhos, mas a parte ruim é que na vida real a ficção dos quadrinhos não se aplica.
Lá fora o vento cortava rápido o ar, as casas, as arvores, as pessoas, tudo passava rapidamente por nós e pela primeira vez eu me senti como tudo lá fora. Despreocupado. Dentro do carro, percebi que eu não era o único assim. Todos, por incrível que pareça estavam... normais. Admiravam a passageira vista, pensavam, e naquele momento eu me senti como parte de uma família, apenas saindo para viajar nas férias de inverno ou de verão. Dando um tempo na cansativa rotina do dia a dia. Mas infelizmente, sabia que isso duraria pouco.
[...]
Mais três horas depois, Noah encostou o carro em frente a um hotel.
- Por hoje, vamos descansar aqui.
Todos concordaram. Saímos do veículo depois que ele o estacionou, pegamos nossas coisas e entramos.
O lugar era lindo. Muito grande, muito bem iluminado, muito bem limpo, poltronas e sofás de couro preto, com mesas de madeira escura e vidro mobilhavam a recepção contrastando com o enseirado chão de brilhosas tábuas bege. Quase ao centro do local, uma divisória feita de pequenos espelhos decorava do teto ao chão o local e apenas o deixava mais rico em beleza. Atrás de um balcão branco uma mulher e um homem vestidos com uniformes iguais. Uma camiseta branca de botões por baixo de um terninho preto com uma pequena placa de ouro em seus peitos esquerdos contendo seus nomes.
- Olá, como posso ajuda-los? – A moça do balcão disse a nós enquanto o homem continuou mexendo no computador.
- Gostaríamos de nos hospedar. – Noah respondeu.
- Claro!
- Quantos dias?
- Apenas esta noite.
- Quartos compartilhados ou individuais?
- Seis individuais, por favor. – Bob tomou a frente.
Enquanto os dois ficaram fazendo a reserva, eu e os outros fomos sentar nos sofás, mas em menos de dez minutos os conselheiros se juntaram a nós.
- Conseguimos pegar seis quartos, mas  não no mesmo corredor. – Noah disse enquanto nos levantávamos.
- H12, Oitavo andar. – Ele entregou uma chave a Brook. – H14, Oitavo andar. – Allyson. – J06, Décimo andar. – Eu. – J13, Décimo andar. – Mike. – Eu estarei no O02, décimo quinto andar e Bob estará no O03 no mesmo andar. Agora escutem. São 6h43min pm. O restaurante fica aberto para o jantar das 7h00min pm. ás 9h00min pm. Passaremos a noite aqui, amanhã tomamos café as 8h00min am. e saímos as 9h00min am. depois disso teremos apenas mais uma parada as 12h00min pm. Para almoçarmos. Nossa previsão é chegar em Las Vegas ao entardecer. Então recomendo que durmam cedo, e bem. Entendido?
- Sim. – Todos concordamos.
- Ótimo. Eu e Bob vamos entrar em contato com nosso amigo e conversar sobre nossa viagem. Façam o que bem entender, mas não abusem, por favor.
Todos fomos para os elevadores, para onde cada um seguiu eu não sei, mas as meninas desceram no andar de seus quartos, eu também, mas Mike disse que ia dar uma volta por ai.
[...]
Depois de me jogar um pouco na cama do hotel e tomar um banho, desci para o restaurante para comer. Não vi ninguém do meu grupo lá, mas como eram os primeiros minutos do jantar, imaginei que eles viriam depois. Comi e subi para o quarto novamente, não estava tão curioso para conhecer o hotel quanto alguns.
Pouco tempo depois ouço alguém bater em minha porta.
Quem poderia ser?
- Pois não?
- Jack? Sou eu, Allyson.
Quando ouvi sua voz me levantei da cama para atende-la.
- Oi. – Disse após abrir a porta.
- Oi. – Ela sorriu.
- Está tudo bem?
- Sim, por que?
- Não sei, para você aparecer aqui assim, sem avisar. – Ela sorriu novamente, mas percebi que desta vez estava sem graça.
- Desculpe, se estiver ocupado posso voltar outra hora.
- Não, por favor. – A dei espaço. – Entre.
Quando ela assim fez, fechei a porta atrás de nós. Segui para a cama e me sentei sobre ela.
- Sente-se.
- Obrigada. – E sentou ao meu lado, porém um pouco distante, mais pra ponta do móvel.
- o que foi?
- Como assim?
- Você não veio aqui apenas pra dizer "oi".
Ally riu com o comentário, mas logo voltou ao seu estado inicial.
- É, você tem razão.
- Então o que houve?
- Queria apenas conversar com alguém. Pensei em fazer isso com Noah ou com Bob, mas não sei como chegar e puxar certos assuntos com eles. Com Brook, parece que nunca é uma boa hora. Se não é o medo de tocar em assuntos delicados em relação a acontecimentos é o fato de eu sempre achar que posso magoa-la. E com Michael... Bom... Nem preciso comentar, não?
Rimos juntos desta última parte.
- Então você procurou sua última opção. – Digo brincando.
- Não! – Ela sorri. – pelo contrário.
- Muito bem. – Meu sorriso desaparece. – Que tipo de "certos assuntos delicados" você quer conversar.
Allyson respirou fundo antes de começar a falar. Ela realmente parecia estar tensa.
- Tem... Tem acontecido coisas estranhas.
- Que tipo de coisas estranhas?
- Estes... – Ela estava muito hesitante em falar. – Sonhos.
- O que tem eles?
- Bom eles começaram no Instituto, logo nos primeiros instantes depois de eu sei iniciada, mas lá eles eram incertos. Realistas, mas incertos, como se tudo fosse uma névoa que pudesse ser alterada com o vento. Eu realmente vi o massacre do instituto antes dele acontecer, mas em meu sonho, ele era diferente.
- Como assim?
- No sonho, eu morria depois de entrar na sala que eu pedi pra ninguém entrar. Quer dizer, não morria, era atingida pela arma dos Ônix e provavelmente era infectada, mas na época nós não sabíamos disso. O fato é, isso quer dizer que tudo que aconteceu depois disso, não era para ter acontecido. Não era para estarmos aqui.
- Aonde quer chegar?
- Eu não sei. Veja, inicialmente os sonhos serviam como "avisos", mas... – Ela pareceu desistir de falar.
- Mas... – A incentivei.
- Eles estão piorando.
- Piorando?
- Sim. A frequência de sonhos está aumentando, eles tem se tornado mais realistas, e eu sinto que tem estado mais concretos. Não mais como uma névoa, e sim como uma parede. Além disso, eu estou confusa e com medo. Não entendo nada do que vejo ou ouço neles. Quer dizer, as palavras e as formas são claras, mas eu não consigo encaixar isso em nenhum lugar. E o que me assusta, é que eles sempre mostram tragédias. – Ela deu uma pausa longa em seu raciocínio. – A cada momento, tenho medo de fechar meus olhos e ver o inferno acontecer na vida das pessoas ao meu redor. E o que me aterroriza mais ainda. É que os sonhos se tornam realidade.
Eu não sabia o que dizer. Eu não era especialista em psicologia e muito menos entendia como funcionavam as habilidades de um Sensitive. Eu só sentia uma vontade enorme de poder dizer que tudo ia ficar bem e dar certo, de que estes sonhos horríveis iriam parar. Mas se nem mesmo eu acreditava nisso, como poderia faze-la acreditar.
- E... – Ela continuou. – Tem mais uma coisa.
- O que?
- Há três dias, algo a mais começou a acontecer.
- Algo... a mais?
- Sim.
- Como o que.
- Eu não sei explicar. É como se eu pudesse ver tudo que um objeto "Viu" – Ela fez as aspas com os dedos – ou "Presenciou" quando o toco.
Fiquei quieto para tentar entender, mas logo ela cortou meus pensamentos.
- Deixe-me lhe mostrar. – Ally olhou em volta parecendo procurar algo. – Você... Ainda está com ele?
Eu deveria ter demorado um pouco para entender, mas assim que ela disse eu já sabia do que se tratava.
- Estou.
- Posso?
Concordei com a cabeça. Peguei minha bolsa que estava ao lado da cama e abri um dos bolsos. Hesitei em pegar o objeto, mas por fim o tirei de dentro da mochila.
- Aqui. – Entrego o aviãozinho de Simon para ela, mas ela não esboça reação.
Ela ficou lá, parada, com os olhos fixos no nada. Sem piscar, sem fazer nada. E isso se repetiu por alguns minutos, até que começou a me preocupar.
- Allyson? – Tento chama-la a atenção.
- "Papai! Papai!" – Ela disse enfim.
- Allyson?
- "Oi, meu pequeno.", Ele disse se abaixando para dar um abraço no filho. – Ally parecia estar narrando uma história. – "Eu trouxe uma surpresinha para você", "O que papai?", ele abriu a bolsa e entregou uma miniatura de avião para a criança. Sua reação foi inconfundível. Ele amou o brinquedo. "Isto é para meu pequeno piloto", "Obrigado papai!". Este foi o brinquedo favorito dele por muito tempo. Mas algo a mais aconteceu. A criança estava nos braços do pai, abraçando-o com força num lugar aberto. Ela estava assustado e com medo. Ao redor, várias pessoas se aglomeravam e alguns homens uniformizados gritavam para a multidão se organizar em fila. "Papai, eu não quero ir lá". "Será rapidinho, meu pequeno. É só um exame de rotina." Quando eles chegam aos próximos da fila outros homens, vestidos como médicos retiram uma amostra de sangue do filho e do pai. "Senhor, nos dê a criança". Um homem diz. "Não. Ele é meu filho.", "Senhor, a criança por favor", "Papai, eu não quero ir com eles", "Senhor!", O homem arranca o pequenino dos braços do pai e seus gritos se espalham por toda parte. O pai tentava seguir o filho, mas homens os seguravam.
Eu não sabia o que pensar. Eu apenas fiquei paralisado ouvindo. Mas Allyson já não era ela mesma. Era como se algo tomasse conta de seu corpo e falasse com sua voz.
- "Papai!!! Papai!!!", Ele gritava, mas nada podia fazer. O brinquedo caiu no chão e a última coisa que ele presenciou depois disso foi o menino sendo carregado por um homem para dentro de uma tenda, Mas um dos médicos o pegou. "O que pensa que está fazendo" Uma mulher perguntou a ele dentro de uma sala fechada. "Todos os pertences antigos dos pacientes devem ser destruídos. De um fim nisso!" Mas o homem o guardou no bolso. "Olá." Ele disse entrando numa sala. O menino estava deitado numa cama de hospital. "Olá.", "Como está se sentindo?", "Bem. Quem é você?", "Um amigo.", "E quem sou eu?", "Você é Simon", "Eu sou Simon" A criança repetiu. "Trouxe um presente para você", o homem entregou o avião para o garoto.
O que estava acontecendo? Eu queria continuar ouvindo, mas minha atenção se voltou para outra coisa. Do nariz de Ally, um liquido começou a escorrer. Eu chamaria de sangue, mas o fluido era negro.
- Ally? – A chamo.
- Ele viu um garoto na enfermaria uns meses depois. Ele estava com medo dele, na verdade estava com medo de tudo e de todos. Sentou-se numa cama ao lado e começou a brincar com dois aviões. – O sangramento intensificou. O liquido escorria de suas duas narinas.
- Ally?
- "Oi", "Sou Jack, tudo bem?", "Você gosta de aviões?" – Seus ouvidos começaram a sangrar também.
Aquilo estava me assustando, era um tanto medonho. Ela não parecia me ouvir e muito menos me ver.
- Allyson!!! – A balancei, mas a nenhum momento ela me olhou nos olhos.
- "Vruuuuummmm!", "Oh, não! Comandante, vamos bater numa montanha com formato de nariz!", "Precisamos de ajuda!!!" – Agora eu estava realmente apavorado. Uma lágrima negra escorreu por seu olho esquerdo.
- ALYSSON!!! – Eu arranquei o brinquedo de sua mão e a balancei de novo.
Desta vez ela me olhou diretamente nos olhos. Sua expressão era de dor e espanto, mas em poucos segundos ela se inclinou para o lado e vomitou uma boa quantia de sangue escuro.
- Allyson! – Me aproximei e a abracei preocupado. – Você... O que houve?
- Jack... – Ela disse entre um respirar e outro. – Eu... Eu... Me perdoe.
-Não, Tudo bem. – A ajudei a levantar. Seu rosto estava coberto por aquele liquido medonho.
- O que houve?
- Na.. Nada de mais. Isso tem acontecido quando...
- Quando o que? A quanto tempo isso acontece?
- Não é nada, eu estou bem.
- BEM? Você sangrou pelos olhos, ouvidos e nariz, vomitou sangue e o pior é que ele está negro.
- Era a esse ponto que eu queria chegar com essa conversa toda.
- Como assim?
- Muita coisa estranha tem acontecido. Os sonhos, As visões, Acordar no meio da noite sendo sufocada por um sangue escuro preso na garganta, eu... eu não sei o que está acontecendo comigo. – Seus olhos se encheram de lágrimas. – Eu... – E elas começaram a escorrer. – Eu estou com medo.
- Calma. – A abraço. – Vem aqui.
Não conversamos mais depois disso, apenas continuei a abraçando enquanto ela chorava por um tempo.
Eu não sabia o que dizer, eu não sabia o que fazer. Foi tudo tão estranho, mas não sei o que me assustou mais. A história que ela estava contando, o modo mórbido e esquisito de como estava contando ou do nada seu corpo começar a expelir um liquido escuro e medonho. Não haviam palavras que tentassem dizer alguma coisa que a consola-se, e além disso percebi que ela estava preocupada com outras coisas também. Os sonhos, as visões, como e porque tudo isso estava acontecendo? O que estava acontecendo? Nem posso imaginar o quão confusa e instável Ally estava. Mas o que mais me frustava era que eu não podia fazer nada.
[...]
- O que eu tenho? – Ela disse enxugando o rosto.
- Eu não sei, mas seja o que for, vamos descobrir.
- Obrigada, Jack. Por tudo.
Sorrio consolador.
- Não tem o que agradecer.
- Bom, acho que vou me limpar. – Ela disse se levantando. Me perdoe pela bagunça.
- Não se preocupe com isso.
- Até mais, Jack. – Abriu a porta e saiu.
Após isso eu procurei coisas para limpar o local antes que o serviço de quarto achasse que eu havia feito um ritual satânico no local ou achado uma fonte de petróleo no oitavo andar.
Meu Deus, O que aconteceu aqui?

Sensitive - IniciadosOnde histórias criam vida. Descubra agora