A falsa noiva

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Caminhando sobre o tapete vermelho Isabel se aproxima do altar como se fosse a própria Bárbara.
Mas quem poderia supor que não se tratasse da mesma. Ali ninguém conhecia Isabel e as semelhança físicas eram suas aliadas naquele malicioso plano.
Chega ao altar, Raul a pega pelo braço acreditando ser a esposa tão amada, o padre inicia a cerimônia, pergunta se a falsa Bárbara aceita Raul como seu legítimo esposo, com a voz mais doce do mundo, bem diferente da habitual voz que usaria, responde com um delicado sim, fingindo uma caricata emoção.
Após todos os necessários trâmites do ritual, de braços dados Raul e a falsa Bárbara saem de braços dados, sendo reverenciados pela chuva de confetes.
Todos vão para o salão onde ocorreria a festa de comemoração, localizada ali na igreja mesmo. Raul faz questão de levar a "noiva" no colo, que ao chegar no local se pronuncia como se estivesse num teatro, usando de sua peculiar frieza para dar veracidade à cena:
- Nem acredito meu amor, estou muito feliz, me sentindo a mais feliz das mulheres de todo o mundo.
Feliz Raul lhe retribui com entusiasmo:
- E eu o homem mais feliz do mundo.
Talita próxima ao casal lhes desejam os parabéns:
- Parabéns meus amigos! Vocês merecem toda essa festa.
- Obrigado Talita. Ao lado de amigos especiais como você tudo fica mais especial ainda.- DizRaul.
- Verdade.- Concorda Isabel, ou melhor concordou "Bárbara".
Percebendo a ausência de Matias, Talita questiona " Bárbara" a falta do amigo:
- E por falar em amigo, cadê Matias Bárbara? Não o vi no casamento e também não o vejo aqui.
- Matias?, teve que ir embora hoje mesmo.
- Mas ele não iria só depois do casamento?
- Mas parece que teve um imprevisto, teve que ir hoje mesmo, me deu os parabéns a mim, inclusive mandou os parabéns pra você também Raul, e foi embora.
- É uma pena, Matias é um grande profissional, vai fazer muita falta no colégio. -Diz Raul, acreditando nas palavras da falsa noiva.
- Pena mesmo. Meu grande amigo. Naquele jogo às vezes até ela se esquecia, acreditando inconscientemente na sua encenação.
- Mas agora vamos curtir a festa, porque está tudo muito lindo. - Diz na tentativa de evitar novos dizeres e questionamentos que a possam deixar em apuros.
A festa flui normalmente, sem ninguém perceber qualquer algo suspeito. Isabel estava representando bem o papel, sem dar brechas as desconfianças.
Após algumas horas Raul chama a "noiva" para irem pra casa, uma noite bem especial os aguardavam na mansão. Não haveria lua de mel, pois devido ao trabalho no colégio e devido a gravidez de Bárbara optaram em não viajar. Isabel já estava a par disso, foi avisada sobre todos os detalhes previamente por Matias. Seguiram para a mansão. Isabel mantinha a personagem. No quarto se inicia a noite de núpcias, Raul nunca havia visto Bárbara em quatro paredes daquela forma, afinal Isabel sabia como agradar a um homem. Apesar de um beijo mais quente e um toque mais agressivo, a ideia de que aquela não fosse Bárbara passava bem longe dos pensamentos de Raul. E ali se amaram apaixonadamente como se a presença feminina naquela transa fosse realmente Bárbara.
Mas isso era impossível pois a genuína Bárbara se encontrava amordaçada no banco de trás do carro de Matias rumo a Porto Alegre. Algumas horas após o sequestro acordou, ainda meio zonza, recuperando os sentidos, mas era impossível falar, já que se encontrava amordaçada. Tinha consciência de que se tratava de um sequestro, mas não conseguia compreender o porque de Matias estar fazendo aquilo. No banco da frente uma sensação de culpa e alegria tomam conta do espírito de Matias.
Enquanto Isabel dormia nos braços de Raul. Após algumas horas de viagem Matias e Bárbara chegam ao destino. Ainda era de madrugada, umas cinco da manhã, estava escuro e nenhuma alma viva dava sinal de vida. Então o professor de matemática aproveita para retirar Bárbara do carro. Ela se debate bastante, já estava toda descabelada, chegava a soar. Entram na casa, Matias a coloca pra dentro, tranca o portão, que estava protegido por um pesado cadeado, tranca as portas e retira as amordaças de Bárbara, que como uma onça que sai da jaula começa a esbravejar:
- O que é isso Matias? O que pensa que está fazendo? Porque está me sequestrando? Tenho que me casar.
- Me desculpe Bárbara, mas é pro seu próprio bem, pro nosso bem.
- Do que você está falando? Que brincadeira de mal gosto é essa? Quero ir embora.
- Não é brincadeira meu amor.
- Para Matias, você está me assustando.
- Não é a minha intenção, eu quero apenas te amar.
- Você está louco. O que pretende com isso? Acha que me mantendo aqui em cárcere eu vou me apaixonar por você? Acha que ninguém vai acionar a polícia, que não vão me procurar?
- Ninguém vai notar a sua ausência, a Isabel está no seu lugar.
- O quê? Você tá de brincadeira né.
- Não é brincadeira. A Isabel colocou seu vestido e assumiu seu lugar, assim eu pude te trazer pra cá.
- Você está me dizendo que aquela golpista está no meu lugar? Isso não pode tá acontecendo. Eu quero ir embora, me solta Matias, por favor, eu te imploro. Me solta.
- Não posso, com o tempo você vai aprender a me amar e a gente vai criar esse bebê juntinho.
- Te amar? Eu nunca vou te amar Matias, entenda isso de uma vez por todas e essa criança que carrego no ventre, não é seu filho e nunca será. Aceite isso de uma vez por todas.
- Eu sei que no começo vai ser difícil pra você, mas depois você vai se acostumar, nunca vai faltar nada pra você, nem pro nosso filhinho, eu preparei tudo com carinho pra você, olha só, você gostou da casa?
- Não. Essa casa é horrorosa, tudo aqui é horroroso. Eu quero ir embora.
- Tá bem Bárbara, com o tempo você vai aceitar tudo, agora vamos descansar que a viajem foi cansativa. Nos primeiros dias eu vou ter que te deixar amarrada, não que eu queira fazer isso, mas é pra você não fugir.
Bárbara começa a se debater e com todas as suas forças começa a gritar:
- Socorro, alguém me ajuda, socorro...
- Não adianta Bárbara ninguém vai te escutar. Vamos combinar assim, você me ajuda que eu te ajudo. Vou ter que colocar a mordaça de novo, você está gritando demais.
As primeiras horas foram difíceis pra Bárbara. Matias a colocou num quartinho sem janela, apenas altos vitrôs, por onde se passava apenas o ar. Se negava a comer e beber, só pensava em Raul, queria sair dali a qualquer custo. Só de pensar em Isabel assumindo o seu lugar nascia o desejo de que a irmã estivesse morta. No entanto percebeu que aquilo faria mal ao bebê que gerava, então passou a se alimentar e se hidratar, além de se entregar as orações, clamando a Deus que lhe tirasse daquela situação.
Ao lado de Raul, Isabel, a falsa Bárbara, ajeitava sua vida. Quanto as aulas disse que estava exausta, cansada da rotina, por isso iria abandona-las. Permaneceu na vice-direção do Elite gaúcha, mas bem menos atuante do que antes. Alguns alunos e colegas perceberam algumas mudanças na "professora de português", que julgaram o tanto quanto estranhas, mas acreditavam ser decorrentes da gravidez. A gravidez, maior problema de Isabel, como iria se livrar dela? Fria e calculista, numa semana qualquer quando Raul estava ausente devido a um congresso de diretores fingiu ir ao ginecologista.  Quando Raul retornou da curta viagem a encontrou nos prantos, questionada sobre o que ocorrera, disse ter perdido o bebê, que a criança não havia vingado, que estava destruída. Raul não esperava por aquilo, ficou arrasado. Cancelou todos os compromissos daquele dia e foi chorar nos braços de "Bárbara", que fingia sofrer, como nunca havia sofrido antes.

A UVA PODREOnde histórias criam vida. Descubra agora