Revelações

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Assim que o dia amanheceu, Talita foi para o colégio normalmente, representando a todos estar tudo bem. Foi difícil encontrar a falsa Bárbara e trata-la como se não soubesse de nada, pois a raiva por aquela impostora lhe consumia. Em alguns momentos chegou a se dirigir a ela com a voz áspera, o que gerou desconfianças por parte de Isabel, mas nada próximo da desconfiança de que saberia de toda a verdade.
Talita como o combinado marcou um encontro com Isabel no período da tarde. Raul se ofereceu para também ir, mas Talita disse que se tratava de assuntos femininos, os quais não o interessavam, o que deixava tudo aquilo mais esquisito ainda. Apesar do receio a farsante confirmou sua ida ao encontro, mal sabia o que lhe esperava.
Após o almoço se despediu de Raul com um beijo no rosto, aquele seria o seu último contato com o diretor. Pegou sua bolsa e alguns objetos secretos que sempre carregavam com si desde que passou a interpretar a irmã. Um revólver e um spray de colifórmio. Pegou o carro, foi dirigindo ela mesma, chegou ao edifício onde Talita mora, subiu o elevador e com um suave toque apertou a campainha. Talita abre a porta, Isabel lhe cumprimenta com um beijinho, e um olá amiga, é retribuída com um cínico olá. Entra, deixa a bolsa no sofá e percebe que Talita trancava a porta, encabulada, indagou:
- Por que você trancou a porta?
- Assim a gente pode ficar mais a vontade não acha?
- Sim, então qual o assunto que me traz até aqui?
- Vou buscar o que te traz até aqui amiga, a surpresa tá no quarto, já volto.
Talita vai ao quarto chama pela autêntica Bárbara, que deixa a criança dormindo na cama, fecha a porta para não o assustar com a discussão. Assim surge na frente de Isabel, que com o semblante de quem vê um fantasma diz:
- Bárbara?
- Essa é a surpresa amiga. Mas pera aí, você não era a Bárbara?- Diz Talita.
A verdadeira Bárbara por alguns instantes se mantém calada, apenas com um olhar desafiador, enquanto desesperada a farsante tenta entender o que ocorre:
- O que você tá fazendo aqui? Como conseguiu escapar? Sabia que Matias não ia dar conta.
- Surpresa Isabel. Achou que sua farsa iria durar para sempre? Sua pilantra desalmada. -Pronuncia Bárbara.
Isabel sai em direção a porta, como quem quer escapar, mas Talita se firma em frente a saída, impedindo sua fuga.
- Acha que vai embora assim Isabel, sem dar explicações, sem antes acertamos nossas contas. - Diz Bárbara possuída de raiva.
- Eu quero ir embora, abram essa porta.
- golpista, safada, explicar o que né, isso é uma coisa que não tem explicação. Mas eu só quero olhar na sua cara, nos seus olhos e saber como você teve coragem de se casar no meu lugar, se deitar com meu marido, mentir que perdemos o nosso filho? Vamos. Diga como Isabel. Olhe pra mim, eu exijo uma resposta.
- Quer saber de uma coisa Bárbara, fiz mesmo, fiz porque você merece só uma coisa nessa vida, sofrer, sofrer e sofrer muito. Não me arrependo de nada, faria tudo de novo.
- Não. Não é por causa disso não. Você teve coragem porque você é uma golpista, mal caráter, imunda, que não tem um pingo de vergonha nessa sua cara lavada.
- Tá bom Bárbara, pouco me importa sua opinião. Acabou seu show? Vai fazer o que agora, vai me entregar pra polícia?
- Claro que vou fazer isso, mas não vai ser agora não, antes vou te dar uma coisa que você está merecendo há muito tempo, uma coisa que o pai nem a mãe tiveram coragem mas eu vou ter. Uma surra sua desgraçada.
Após pronunciar tal frase Bárbara dá um forte e estrondoso tapa na cara de Isabel.
- O que é isso?, você tá louca Bárbara, quem pensa que você é para me dar um tapa na cara.
- Não to louca não, isso é só o começo, você não viu nada ainda. -Diz Bárbara que acerta um segundo tapa.
- Resolveu tirar essa máscara de boa moça, de santinha do pau oco. Há, há, há. É assim que eu te quero ver mesmo, descontrolada, fora de si, infeliz. Há, há, há.
- Você ainda tem a ousadia de rir, sua vagabunda, descarada, então quer dizer que a surra então tá boa.
Bárbara dá início a uma sequência de tapas no rosto de Isabel, usava de toda sua força, o que fez com que a irmã caísse no chão. Quando sobe em cima dela e o deferimento de tapas continuam, chegando ao ponto dos lábios e nariz da irmã começarem a sangrar. Isabel tentava reagir, mas Bárbara estava possessa de raiva, ali descontava toda repulsa e desprezo que sentia pela irmã. Talita apenas observava, gostava da surra que a farsante levava. Isabel só conseguia pronunciar a palavra chega. Seu corpo ficou esticado ao chão da sala, após ter sofrido tamanha tortura. Bárbara se levanta, toda descabelada, vermelha, soando vai em direção ao telefone e diz:
- Agora sim eu vou chamar a polícia. Foi pouco ainda viu perto do que você merece. E uma última coisa, saiba que o meu filho está vivo sim, nasceu e é uma criança linda.
No entanto antes de efetuar a ligação para a polícia, foi ao banheiro lavar as mãos, quando retornou a sala, pegou no gancho novamente, junto de Talita, estavam de costas a Isabel, que rastejando pega sua bolsa no sofá, coloca uma máscara cirúrgica. Com uma mão saca seu revólver com a outra o tubo de spray de colifórmio e mesmo com o rosto ensanguentado se levanta, surpreendendo Bárbara e sua amiga com o revólver apontado:
- Coloca esse telefone no gancho imediatamente.
Mesmo antes que desse tempo de Talita e Bárbara falar alguma coisa, Isabel aperta o spray, que faz com que as duas percam o sentido e aos poucos desmaiam.
Contudo antes que caísse desmaiada sobre o chão, o instinto materno fala mais alto e inconscientemente Bárbara vai em direção ao quarto que o filho dormia, mas sem sucesso, cai apagada em frente a porta do quarto.
Ao verem as duas desacordadas, Isabel comemora:
- Lesadas, burras, tontas, acharam mesmo que iriam conseguir me pegar. Você vai pagar muito caro por essa surra, vai pagar por cada tapa que me deu. Desgraçada. Só não dou um tiro na testa de vocês duas agora, porque vai ser um fardo muito grande pra mim carregar.
Após alguns segundos de raciocínio, Isabel já sabia o que fazer. Foi até o quarto de Talita, rapidamente colocou uma máscara cirúrgica no bebê que só não respirou o gás tóxico devido a porta fechada. Revirou o guarda-roupa, se cobriu com um lenço, colocou um óculos de sol escuro, improvisou um cesto de dormir, pegou a criança e saiu pela porta. Antes disse:
- Aguarde Bárbara, você não perde por esperar, essa surra ainda vai lhe custar caro.
Assim desceu o elevador, entrou em seu carro e pegou estrada. Estava sequestrando Gabriel. Rodou por alguns quilômetros, desceu do carro, abandonou o veículo numa encruzilhada, andou mais alguns quilômetros a pé. Entrou numa estrada de terra, o sol estava escaldante, a sua maquiagem chegava a derreter. A criança só chorava através de um berreiro incessante. Não tinha o menor dom com bebês, só conseguia dizer: cala a boca desgraça! O salto também era seu inimigo naquela estrada cheio de buracos e pedras pontiagudas. Contudo após uns sessenta minutos de caminhada, chega ao seu destino, uma casa verde. Bate na porta da residência instalada num modesto sítio. Era a casa de sua antiga patroa, Teodora. Num primeiro momento a ex cafetina não a reconheceu, o lenço, os óculos, e seu rosto todo desfigurado não ajudavam. No segundo momento se surpreendera, ao notar de quem se tratava:
- Isabel! O que faz aqui?, quem é essa criança?
- Posso entrar Teodora?
- Entre. Porque seu rosto está assim?
- Você precisa me ajudar Teodora, estão atrás de mim, querem me prender.
- Te prender, mas porque?
- Descobriram tudo, a casa caiu.
- O que você aprontou dessa vez menina? Descobriram o quê?
- Descobriram que eu era uma farsante no lugar de Bárbara. Descobriram tudo.
- Mas como você fez isso?
- Com a ajuda do Matias, aquele que passou a ir na boate depois que eu voltei. Lembra quem é?
- Lembro, claro, aquele seu amigo.
- Então, nós armamos toda essa tramóia, mas descobriram, a Bárbara voltou, me deu essa maior surra. Em instantes, a polícia toda vai está atrás de mim, eu não posso ser presa, você tem que me ajudar.
- E essa criança, o que faz com você?
- É o filho daquela cretina, ela achou que era mais esperta do que eu, mas se deu mal. Otária.
- O que você pretende com isso? É um sequestro?
- É sim. É um sequestro sim.
- Você está louca Isabel ,é só uma criança, pelo visto que acabou de nascer.
- Não vou fazer nada com esse bebê chorão não. Só quero fazer com que a Bárbara sofra, sofra muito por cada tapa que ela me deu. E também quero negociar minha fuga, pedir um resgate.
- E você quer transformar a minha casa num cativeiro?
- Não, é só um lugar pra mim ficar, um lugar onde não possam me achar.
- Eu não posso compactuar com isso Isabel.
- Você tem que me ajudar Teodora, eu sei o que estou fazendo, amanhã mesmo vou entrar em contato com eles. Aqui tem telefone não tem? Eu te imploro.
- Tá bem Isabel não devia, mas vou te ajudar sim, sob as condições de que amanhã mesmo você devolva essa criança. Você me entendeu?
- Entendi.
- Eu posso ser piranha, vadia, exploradora, vagabunda, mulher da vida, sei lá mais o quê, mas sou incapaz de fazer mal à um bebê, um ser tão indefeso como esse.
- Já falei que não vou fazer nada de mal pra essa criança. Agora me faz um favor, vi aquele fusquinha azul seu ali na garagem,vai até a farmácia compra um pacote de fraldas, leite em pó, uma mamadeira, coisas desse tipo pra gente manter essa criança até amanhã. To sem dinheiro agora, mas depois vou te pagar, pode ter certeza disso.
- Vou mas pela criança que não para de chorar, deve tá morrendo de fome, tadinho.
- Valeu aí Teodora pela força.
- Vou e quando voltar quero que você me conte nos mínimos detalhes toda essa história de você se passando pela sua irmã.
Teodora pegou seu fusca e foi a compra dos mantimentos, ainda estava em dúvida se fazia a coisa certa, mas mesmo assim foi. Isabel ficou na casa com o neném, que sentia aquele ambiente dominado pela energia negativa da tia sequestradora. Só conseguia chorar. Descontrolada com o berreiro Isabel balançava fortemente o indefeso bebê, que cada vez se assustava mais com seus gritos que reproduziam os mais abomináveis xingamentos.
Um tempo depois Bárbara e Talita despertam. Talita se levanta primeiramente:
- Cadê aquela desgraçada?
Bárbara abre os olhos em seguida. Como estava desmaiada de frente para o quarto, logo vê tudo revirado, não enxerga o filho, rapidamente entende que a criança havia sido levada pela irmã. Se levanta desesperada:
- Meu filho, cadê meu filho? Meu filho não. Ela levou meu filho Talita.
- Não pode ser.
- Ela levou ele. E agora?
- A safada já estava preparada pra tudo. Já tinha tudo planejado para uma possível descoberta de quem ela realmente era.
- Ela foi muito rápida. Se tivesse chamado a polícia antes nada disso tivesse ocorrido. A culpa foi toda minha em querer fazer justiça com as próprias mãos.
- Não se culpe Bárbara, ela é a bandida da história.
- Se acontecer alguma coisa com o meu filho eu não vou me perdoar nunca.
- Agora não adianta a gente ficar aqui se lamentando, temos que acionar a polícia, a vida do Gabriel está em risco.
- Isso. Vamos fazer isso.
Acionaram a polícia, uma viatura foi até o apartamento, ao notarem que a situação era mais complicada do que parecia os policiais passaram o caso pra delegada, que pessoalmente se encarregou de solucionar a situação.
Talita e Bárbara que mais chorava do que falava comunicaram tudo a autoridade, desde o sequestro no dia do casamento até o sequestro de Gabriel.
Judite Alencar, a delegada ficou abismada com tudo que ouvira, tudo se encaixava num roteiro de filme. Com um semblante incrédulo, colocava dúvidas na mente de Bárbara:
- Você não tá acreditando no que estou dizendo né doutora.
- Não, não é isso Bárbara, pelo contrário acredito em tudo que você e sua amiga disse, nessa profissão já vi de tudo. É que a história é mesmo muito intrigante. A irmã gêmea que se alia a um obcecado pela irmã para a sequestrarem. A irmã ocupa o lugar da outra, se casa com o marido da outra, se deita com ele, inventa que perderam o filho e quando descoberta, sequestra o filho da irmã que voltou. É tudo muito surpreendente.
- Mais é tudo verdade.
- Nós da polícia de Parreiral vamos fazer o possível para localizarmos essa farsante e trazer o seu filho de volta. Com a investigação vamos descobrir qual a intenção dela com esse sequestro. Pode ser que ela exija um resgate, vamos esperar que ela entre em contato. Quanto ao Matias vamos entrar em contato com a polícia da capital. Agora aconselho vocês revelarem tudo a seu marido Bárbara. Raul não é esse o nome dele?
- Isso mesmo. Nem sei qual que pode ser a reação dele. Mas confesso que estou morrendo de saudades. Afinal foram 8 meses separados.
Talita fez uma ligação para Raul pedindo que fosse até seu apartamento, ele disse que não poderia, pois tinha alguns assuntos pendentes para resolver no colégio, então afirmou que era urgente, assim ele foi acreditando que era alguma coisa com a esposa, a falsa Bárbara, qual ele ainda acreditava ser a verdadeira Bárbara. Ao chegar no edifício se deparou com viaturas policiais, o que o deixou assustado:
- O que aconteceu Talita? O que esses policias fazem aqui? Cadê Bárbara?
- Calma Raul. Preciso que você se acalme, pois o que vamos te contar, é algo inesperado, que vai mudar sua vida para sempre.
- Você está me assustando, vamos me conte, o que está acontecendo?
Judite junto de Talita conta a Raul tudo, menos que Gabriel havia sido sequestrado por Isabel.
Enquanto isso Bárbara estava no quarto esperando o momento certo de entrar na conversa.
Era tudo novidade para Raul, inclusive o fato de Matias ser apaixonado por Bárbara. Estava em choque, ficando alguns longos minutos sem falar nada, sentado no sofá, incrédulo sem responder a nenhum estímulo. Por alguns instantes, pensava que aquilo era tudo mentira, mas depois se lembrava da transformação brusca no comportamento da esposa, tudo fazia sentido, aquela mulher com quem dividiu o lar por 8 meses era mesmo uma impostora.
Após retomar os sentidos, a ficha cair, chorando e com a voz gaga resolveu se pronunciar:
- Então aquela mulher era uma farsante, aquela mulher que me casei, que me deitei, que chorou nos meus braços a falsa morte de nosso filho era uma farsante.
Talita com os olhos possuído por lágrimas apenas confirmava com a cabeça que positivo.
Assim Raul continuou com seu desabafo:
- Essa mulher é uma desgraçada, acabou com a minha vida, ela tem que pagar, ela e Matias, vocês tem pegar esses canalhas. Eles tem que apodrecer na cadeia. Vermes, imundos. Tadinha da minha Bárbara, o que ela não deve ter sofrido nas mãos desses monstros. Cadê ela? Ela tá aqui? Eu preciso revê-la, conhecer o nosso filhinho. Tragam ela até mim.
Bárbara sai do quarto, reaparece na sala e aos prantos corre para os braços de Raul, o homem da sua vida. Ali protagonizam um intenso e emocionante reencontro. Ainda no calor do momento, o diretor se propõe a pedir perdão:
- Perdão meu amor, perdão por não ter conseguido te proteger, nem ao nosso filho.
- Que isso meu amor, você não sabia de nada, não podia fazer nada.
- Perdão também por ter me deitado com aquela farsante, eu acreditei que era você. Me perdoe.
- Você não tem que pedir perdão, fomos todos vítimas dessa sujeira.
- Você está mesmo bem? Matias não te fez nenhum mal, não te obrigou a nada?
- Não, nem tinha como devido a gravidez
- Cadê nosso filho? Só pode ser um milagre, o meu filho está vivo.
Lhe é revelado sobre o sequestro, Bárbara tenta se culpar, mas Raul a apoia dizendo que a culpa é toda de Isabel. O desesperado pai faz a delegada jurar que iria salvar seu filho, naquele momento um ódio mortal por Isabel e Matias o consumia.
Já era noite, a polícia seguia com seus trabalhos, Talita, Raul e Bárbara foram pra mansão do diretor, afinal tinham muita conversa para colocarem em dia. Dificilmente pregariam os olhos naquela madrugada à espera de qualquer informação, ou um contato da sequestradora. Vivenciavam um verdadeiro pesadelo, o qual não viam a hora de terminar.

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