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Quarta, 21 de abril de 2021

" Olá mãe, ainda se lembra de mim??"- ri de leve, falando perto do jazigo da minha mãe-" Ah mãe, nem quero pensar no tempo que estive ausente, passei muitos dias sem a vir visitar, peço desculpa "- eu não sei se ela me ouve, mas continuava a falar como ela como se ela ouvisse-" A mãe tem perdido os meus melhores momento, não viu o Lourenço a crescer, mas sei que estava comigo na horas em que eu mais precisei, não fisicamente, mas sim espiritualmente"- senti as lágrimas a caírem pela cara a baixo-" Porque é que teve de partir??"- chorava mais-" Porque é que existe a morte?? Só nos faz sofrer "- continuava a chorar a olhar para a foto  da minha mãe ali presente-" Eu continuo a ser a sua "princesinha", aquela mesmo que a venerava, ainda sou aquela que antes de adormecer rezo para que esteja "num bom lugar no céu", eu ainda sou aquela que chora de saudade e de raiva ao mesmo tempo por não a ter mais aqui"- as lágrimas não secavam-" Mãe... Quantas vezes me protegeu de todos?? Quantas vezes me deu doces escondidos do pai?? Quantas vezes foi a melhor mãe?? Acho que não há vezes a realçar, foi sempre a melhor mãe "- Quantas vezes é que eu fiquei à espera de uma chamada sua?? Quantas vezes fico a pensar na maneira delicada que me pegava ao colo?? Ainda espero o telefonema e ainda penso todos os dias como era mágico estar nos seus braços"- sorri no meio das lágrimas porque vários flash passaram na minha cabeça-" Nenhum presente compensa o facto de não a ter cá "- suspirei tentando ter calma-" Eu não quero presentes, eu quero-a aqui ao meu lado, só isso e nada mais, só o seu amor e a sua atenção"- mexia nos meus dedos para tentar controlar as lágrimas que caiam velozmente-" Eu não merecia isto"- suspirei-" Não merecia que me deixa-se neste mundo sozinha, sem a ter para me aparar as quedas "- chorava a olhar para o retrato da minha mãe-" Quantas noites eu chorei por não te ter??"- olhei para o retrato à espada que me respondesse-" Quando toda agente me julgava e a mãe protegia-me?? Porque a mãe pensava que mesmo que eu erra-se seria sempre a minha mãe"- limpei o rosto com as mãos-"Mãe, eu cada vez temos mais saudades, estou com saudades do tempo é que ainda cá estava e saudades do tempos em que tudo era normal"- estava mais calma-" Precisava que estivesse cá à 3 anos atrás para me aconselhar, mas infelizmente não estava"- suspirei para não chorar outra vez-" Acha que estou a fazer um bom papel como mãe?? Tento ao máximo passar os mesmo valores que me passou a mim ao Lourenço "- sorri pensando no meu filho-" E como tem estado Lourenço?? Orgulhoso do seu sobrinho?? Aposto que sim, ele é como o menino era, muito energético"- olhei desta vez para o retrato do meu irmão-" Adorova tanto ter-vos aqui"- levantei-me, já sentia o rabo quadrado-"Tenho que ir andando, hoje tirei o dia de folga para ir tratar das nossas férias, vamos para Mykonos na Grécia, a mãe já me quis levar lá, mas o pai não queria porque já tinha estado lá"- sorri ajeitando as flores brancas que estavam na jarra-" Finalmente vou, mas gostava que estivesse cá para vir também, assim só vou eu, o Lourenço e o Afonso, mas pronto, acho que vai ser divertido na mesma"- sorri-" Tenho mesmo que ir e espero voltar para vos visitar o mais cedo possível "- olhei uma última vez para os retratos e sai

O cancro é uma experiência marcante na vida do doentes, dos familiares e dos amigos. O choque do diagnóstico, as limitações associadas aos tratamentos e a incerteza quanto ao futuro, contribuem para um sentimento de tristeza, solidão e angústia. A seguir à dor que a minha mãe e o meu irmão, neste caso o doente está a sentir, há a dor de quem o ama e de quem o trata, não é fácil que uma doença destas seja diagnosticada. O que mais doí é acompanhar por perto o desfalecer dia para dia das pessoas que amamos, se eu pudesse fazer alguma coisa por eles, tinha ido até ao fim do mundo só para o curar, mas eu não pude fazer nada apenas tive de ter fé em que tudo se podia ter resolvido e tive de estar forte para os apoiar. Se eu pudesse fazer algo por eles até desistia da minha vida se fosse preciso, mas não pude e bem agora estou sem eles. Queria tanto tê-los aqui para mim, ia ser tudo mais fácil e mais alegre.

Flashback on

Sai para ir ter com a Carlota, íamos passar o dia à praia de Matosinhos para pôr em dia o bronze.

" Bom dia, Carlota"- sorri sentando-me ao lado da Carlota que esta estendida ao sol

" És sempre a mesma atrasada"- gozou-me

Mais uma manha se passou a ler um livro, a rir com as piadas da Carlota e com alguns mergulhos pelo meio. A tarde passou a correr, cada uma foi para sua casa...  Mal entrei em casa, ouvi um choro, um choro de uma mulher... Só podia ser a minha mãe, entrei na sala e vi a minha mãe sentada no sofá em prantos agarrada ao meu pai, o meu instinto levou-me a colocar-me de joelhos à frente deles e ali permaneci em silêncio até que alguém decidisse algo. Tive que ser eu, a cortar aquele silêncio angustiante...

" O que se passa??"- estava quase a chorar, ver a minha mãe tão vulnerável é tão agoniante

" Filha, nem tudo tem solução e além disso nós já passamos tantas memorias juntas, temos de ser fortes"-  a minha mãe estava com um olhar entristecido, nunca o vi assim na minha vida

" E porquê isso agora??"- estava frustrada com aquilo tudo, esta conversa não nos ia levar a lado nenhum, de caminho sou eu a chorar

"Bem filha não vou estar com mais rodeios, hoje fui fazer uns exames de rotina e tenho um cancro"- fiquei em choque a olhar para a mulher que me trouxe ao mundo, eu queria mexer-me não conseguia, eu queria falar não conseguia- " E já está numa fase muito avançada, acho que os médicos já não tem nada para me fazer"- a minha mãe chorava a olhar para mim, eu acordei do meu transe e abracei-a já a chorar ainda mais que a minha mãe

" Não pode ser, não pode"- a minha voz estava completamente alterada e distorcida, bem a minha cara esta completamente vermelha, cheia de maquilhagem borrada e os meus cabelos completamente desorganizados

" Pensa que ainda posso me salvar, eu preciso que estejas bem ao meu lado e não que estejas assim"- a minha mãe  estava mais calma e tão conformada com a situação que me metia uns certos nervos, eu quero-a ter aqui para sempre, a dar-me aquele sorriso de "Bom dia" quando eu chego para tomar o pequeno almoço

Flashback off

I CAN'T-IIOnde histórias criam vida. Descubra agora