Capítulo XXX - Ritual da Salvação

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    Beatrice

  A noite chegou com uma pressa incalculável. Faltam pouco mais de dez minutos para a meia-noite e encaminho-me até à floresta, juntamente com Kira e Anna, no carro da polícia. Paramos o veículo na borda da estrada, à entrada do grande conjunto de árvores, e cada uma de nós liga a sua lanterna para começarmos o nosso caminho até à clareira. Estou profundamente desconfortável em caminhar por aqui em plena noite tendo em conta a que Alina e todo o seu clã tão alucinado quanto ela estão algures perto de nós.

-Eu nunca imaginei que a tua mãe pudesse ser uma bruxa. – Kira diz, depois do que lhe contei antes de sairmos do carro com uma temperatura bem mais agradável do que aquela com que nos confrontamos.

-Nem eu. Foi a última bruxa da linhagem.

-E logo a seguir nascer uma visionária? Bem, é uma família e tanto...! – Anna comenta surpreendida.

-A quem o dizes... - Suspiro, não tão fascinada. Acho que ultimamente nada disto me pode fascinar. O mundo sobrenatural tem-se demonstrado muito mais do que eu poderia imaginar.

Há um som entre os troncos do nosso lado direito que fazem com que os três focos de luz rapidamente apontem nessa direção. Edwin e Clayton. Há audíveis suspirares de alívio.

-Que susto. – Kira murmura com a mão no peito que executa um movimento ofegante.

-Desculpem. – Edwin fala baixo, antes de criar uma grande aproximação dos meus olhos, ainda que o seu corpo se mantenha distante. Fixa-me na sua pessoa originando um peso no meu peito que dói, talvez por desejar que a nossa última conversa não tivesse sido tão dura como a que tivemos, tendo em conta que em breve acontecerá o que tanto tememos. Num segundo que não melhora em sentido nenhum o meu estado, vejo o espírito um passo atrás de Edwin que, depois de me sufocar com o olhar penetrante, o desvia para o chão coberto de folhas secas da estação do ano. Relembro toda a conversa que tivemos esta manhã, ainda tão presente em cada sentimento que me suscitou.

-Prontas? – Edwin pergunta-nos então - mais propriamente às duas pessoas a meu lado, desviando a tensão entre nós - ao que elas acenam um sim duvidoso, dão um encolher de ombros ou um simples sorriso triste. Clayton ergue o rosto pesado para a mera troca de palavras que ocorre entre nós, captando-me pelo canto do olho e permitindo depois que troquemos alguns olhares onde me questiono tanta coisa que nem sei formular.

-É melhor irmos andando. – Clareio a minha voz, desviando-me da tensão que eu própria crio para mim, com tantas dúvidas, e todos parecem concordar, ao que fugimos do cubículo em que me sentia inserida.

Ainda assim, Edwin apanha-me na parte de trás do grupo, travando a minha respiração.

-Estás bem? – Respiro fundo, acenando um sim. – Não me respondeste às mensagens ontem... - Molho o lábio inferior e não sou capaz de o olhar com a vergonha que sinto. Devia ter-lhe respondido, no mínimo dizendo que preferia falar noutra altura e de frente a ele. – Desculpa. Mais uma vez, desculpa por não te ter contado. – Não esperei que se fosse desculpar, o que me faz observá-lo surpreendida. E por mais que eu quisesse que ele não me escondesse coisas tão importantes, neste momento eu só posso abraçá-lo. É tudo o que preciso perante o meu corpo que treme de medo.

-Eu estou com medo. – Confesso em tom baixo contra o seu ombro.

-Não tenhas. Eu estou aqui.

-Mas eu tenho medo que deixes de estar... - O meu peito é um balão que se rebenta e liberta todo o peso dentro de si. Porém, tem agora um furo, mais um na verdade, que o destrói um pouco mais.

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