Capitulo 2

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Porque você me deixou aqui para queimar?
Sou muito jovem para estar tão machucada.
Me sinto presa nos quartos de hotéis.
Olhando para a parede
Contando as feridas e estou tentando não sentir todas elas
-Camila Cabello - I have questions

Helena Blake

Hoje o tempo parece diferente. Não é o dia claro, cheio de vida, com pássaros cantando como sempre. Estava mais para um dia cinza, parado, com nuvens carregadas de água condensada pronta para cair. Ou talvez isso fosse só como meus olhos estavam vendo o dia de hoje, afinal hoje é dia primeiro de setembro de dois mil e vinte, dia do meu aniversário de vinte e um anos. Era para ser um dia cheio de felicidades, mas até agora nada de bom aconteceu. Veja bem, não fui trabalhar hoje, pois perdi meu emprego, meu pai logo cedo já apertou meus braços e agora eles estão meio roxos, meu aniversário só me lembra do abandono da minha mãe e, para piorar, meu peito está doendo por algum motivo desconhecido.

Mas, eu devia agradecer um pouco também. Meu pai não está aqui, já que ele saiu, e isso me deixa mais segura, pois assim ele não vai ficar bêbado dentro de casa e me bater alegando que está me "ensinando" como ele mesmo já disse. Porém, eu fico pensando: ensinando o quê? Ensinando a não demonstrar dor e medo quando ele vem me bater?! Ou, talvez, ensinando que eu não devo aceitar isso e dar o troco na mesma moeda?! Eu só quero saber o porquê disso tudo! Já estou cansada disso! Cansada de ter de sempre usar uma máscara. Cansada de deixar meu afeto por meu pai me prender aqui com ele. Cansada de "aprender" algo que não terá utilidade para mim. Cansada de ouvir meu pai balbuciando quando está bêbado que eu não devo deixar as pessoas saberem que elas estão me atingindo com o que dizem ou fazem. Cansada!

Eu acredito em destino, realmente acredito! Mas, se isso é um plano do destino, já está passando dos limites faz tempo. Cadê meu príncipe encantado que me resgata do meu inferno pessoal causado pela família malvada?! Não precisa nem ser um príncipe, na verdade poder ser um duque, um visconde, um conselheiro real, um burguês ou só um plebeu mesmo. Não me importo com quem seja ou sua classe social, eu só quero que alguém pegue em minha mão e me salve.

É pedir muito por uma salvação? Talvez seja... eu que deveria ter atitude para sair daqui, pegar todo meu dinheiro, que não é muito, e sumir de Seul para nunca mais aparecer. Mas, eu não tenho coragem. Só tenho meu pai, infelizmente ou felizmente, só ele que nunca me abandonou, mesmo sendo violento ele é tudo que tenho agora, o único que me faz ter uma pequena fé que as pessoas ainda se importam uma com as outras.

Lembro do meu primeiro namoro quando falo de ter fé nas pessoas. O garoto era até bonito, era gentil também, tudo de bom. Mas, aquilo era tudo uma fachada para sua verdadeira face possessivo, dominadora, opressora e cheia de malícia. Aos quinze anos eu descobri o quê era um namoro abusivo e não foi nada bom. Hoje eu não tenho mais sequelas disso, não depois de perceber que não foi culpa minha ele agir daquela forma. Talvez eu devesse ter sequelas, mas eu só usei aquilo para evoluir, igual eu uso as surras do meu pai para evoluir, para me tornar mais forte e finalmente ter coragem de sair de casa e deixar tudo para trás. Um dia ainda farei isso, um dia ainda irei viver uma vida sem receio de apanhar dentro de casa ou em qual...

Um barulho de porta batendo me faz parar meus pensamentos. Esse é meu pai bêbado chegando em casa, ele pensa que a casa é feita de aço para aguentar essas batidas com toda sua força. Estou vendo o dia que vou me mudar de casa, mas não vai ser para ir embora, mas sim para ir para outra porque meu pai quebrou essa de tanto bater essa merda de porta.

Saio do meu quarto e caminhei em direção a cozinha. Eu poderia ir direto para a sala, mas é melhor espiar da cozinha.

Dou uma olhada e percebo que seu corpo está jogado no sofá. Eu deveria fazer algo para comer já que é fim de tarde, e ele provavelmente não comeu nada, e muito menos eu.

Começo a pegar as verduras para fazer um ensopado, mas o barulho da campainha me interrompe do meu ato. Estranho a princípio. Não estou esperando ninguém, e meu pai não tem amigos que o visitem, na verdade nem amigos ele tem.

Apreensiva vou até à porta. Não temos olho mágico, então só me resta abrir a porta. Mas, antes que eu consiga abri-la, meu pai intervém.

- Volte para a cozinha, Helena. Agora!

- Não posso nem abrir a porta mais?! Isso aqui é minha moradia ou minha prisão?!

Sua mão se ergueu e logo se abaixou em minha bochecha esquerda.

- Agora, Helena!

Sua raiva estava descomunal hoje. Até sua voz estava diferente do usual. Mas antes que eu possa dizer qualquer coisa a porta é derrubada. Por ela entram três homens todos de preto, com máscaras, com luvas e... armas! O que tá rolando aqui?!

- O que vocês estão fazendo aqui? - lembro que meu pai está aqui só quando escuto sua voz alterada.

Os novos visitantes olham com desdém e algo como nojo para meu pai. Não os julgo, até mesmo eu olho assim para ele as vezes.

- Você sabe porquê estamos aqui... cadê o dinheiro?

Dinheiro? Qual dinheiro? Meu pai sabe o porquê deles estarem aqui? Será... dívidas! Certamente ele perdeu em algum carteado novamente.

- Eu não tenho todo o dinheiro ainda, mas se me derem mais um mês eu consigo tudo, eu prometo! - a voz antes alterada agora é só um fio de medo e desespero.

- O prazo acaba hoje. Se não tem o dinheiro sua filha vem conosco.

Sua filha... eu?! Não, não, não, por favor não!

- Por favor! Só mais um mês.

Eles chutam meu pai, logo vem em minha direção. Quando eu me afastei, eu não sei, mas eu estava perto da cozinha novamente.

- Por quê iriam me levar?

Minha voz era quase um sussurro, mas foi o suficiente para eles ouvirem.

- Sabe, Blake... a vida é como uma roleta-russa, tem horas que a bala está direcionada a você, tem horas que a bala está direcionada a outra pessoa, não tem como saber qual será o atingido da vez. Mas, dessa vez a atingida foi você... você poderia ter tido uma vida pacífica, com amigos durante a vida, um bom emprego, uma boa faculdade, um casamento bom e um final de vida maravilhoso e feliz. Porém, ah o grande porém que a vida sempre tem, seu querido pai te deixou como moeda de troca na dívida dele. Ele não conseguiu o dinheiro então temos de pegar algo em troca, não é? E você, cara Blake, é o nosso algo.

O ambiente ao redor parou, ficou tudo um branco. Meu pai, o homem que devia cuidar, zelar e amar minha pessoa, me vendeu... o único que nunca me abandonou, que cuidou de mim até hoje, mesmo me espancando às vezes, me vendeu...

- Deixe para sofrer depois. Vamos logo! - um dos caras puxou meu braço.

- Eu não vou a lugar nenhum com vocês! - isso Helena! Seu pai fez ao menos uma coisa que prestasse para você, então use disso, não demonstre fraqueza! Não para essas pessoas.

- Filha... deixe eles te levarem por bem, vai ser melhor. - aquele homem disse com lágrimas nos olhos.

- Não me chame de filha! Eu não sou mais nada sua, seu nojento! Eu espero que você se arrependa amargamente e definhe com os dias porque não vai ter mais nenhum imbecil para cuidar de você! Você é um dos piores tipos de pessoa, nem mesmo um mafioso que mata por dinheiro é pior que uma escória que vende a própria filha como você.

Nojo. Repúdio. Miséria. Abominação. Todas essas palavras circulam minha mente enquanto eu sou levada pelos caras de preto. Ser levada por eles é melhor do que ficar aqui. Eu provavelmente vou ser morta ou ser feita de prostituta, mas eu vou ter uma oportunidade de fugir ou de me matar e quando essa oportunidade aparecer, eu vou agarrá-la com a maior força que eu conseguir.

Eu estou sozinha agora e vou continuar assim. A vida é uma roleta-russa segundo o homem de antes, então o próximo que ficará na direção da bala será o "meu dono". Se preparem, pois nesse jogo se podem jogar dois.

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